(…) Em 19 de
Dezembro de 2007, António Maria Costa afirmava, em Lisboa, que “a Guiné-Bissau
está à beira do colapso, com o Estado incapaz de assegurar a soberania do
território face ao narcotráfico e ao crime organizado”.
Dando mais
um relevante exemplo de perspicácia, mesmo que eventualmente sustentado por
informações dos serviços (pouco) secretos de Portugal, o ministro de Estado e
dos Negócios Estrangeiros português, Paulo Portas, disse que a questão do
narcotráfico também é a chave do golpe de Estado de 12 de Abril na Guiné
Bissau.
É brilhante.
Aliás, quase desde que se tornou independente que todo o mundo (talvez com a
excepção de Portugal) sabe que o narcotráfico é uma forma de vida de muitos militares e políticos guineenses.
Paulo Portas
afirmou que “todas as informações” de que Portugal dispõe relacionam o golpe de
Estado de 12 de Abril na Guiné-Bissau com o narcotráfico e que este assunto em
concreto vai ter de ser analisado pelas Nações Unidas, Comunidade dos Países de
Língua Portuguesa, Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental, União
Europeia e União Africana.
Creio que as
informações que Paulo Portas recebeu quentinhas são, afinal, requentadas e não
passam de uma cópia fiel do que se tem passado desde que, por exemplo, Nino
Vieira chegou ao poder, também através de um golpe de Estado. Os relatórios são
sempre os mesmos, apenas mudando a data e o nome dos protagonistas.
É pena que
ninguém tenha dito a Paulo Portas que, já no dia 24 de Junho de 2009, um relatório do director executivo do
Escritório das Nações Unidas sobre a Droga e o Crime (UNODC), António Maria
Costa, dizia com todas as letras que o narcotráfico era uma das causas da
violência e da instabilidade políticas na Guiné-Bissau.
Já antes, em
19 de Dezembro de 2007, António Maria Costa afirmava, em Lisboa, que “a Guiné-Bissau
está à beira do colapso, com o Estado incapaz de assegurar a soberania do
território face ao narcotráfico e ao crime organizado”.
Apesar de
tudo, há coisas em que Paulo Portas tem razão. Ou seja, tal como o poder
político, entre outros, em Portugal é permeável à corrupção, o poder militar na
Guiné-Bissau “é permeável ao narcotráfico”.
O grau de
permeabilidade depende, obviamente, de se saber se os golpistas são ou não
amigos do governo português. No tempo de Nino Vieira a situação era a mesma mas
o então presidente era, digamos, visita de casa dos donos de Portugal. Por isso
tinha carta branca para negociar a branquinha. Os de agora não agradam a Lisboa
e, por isso, são os maus da fita.
“Eu não
tenho nenhuma dúvida. Todas as informações de que Portugal dispõe apontam para
que, claramente, na origem deste golpe de Estado também está o narcotráfico e,
ou a Guiné-Bissau tem condições para ser um Estado de Direito, ou a
Guiné-Bissau fica sequestrada a um certo poder militar que é permeável ao
narcotráfico”, disse Paulo Portas.
O chefe da
diplomacia portuguesa falou com os jornalistas durante uma conferência de
imprensa em que participou também o primeiro-ministro guineense deposto, Carlos
Gomes Júnior, após uma reunião no Ministério dos Negócios Estrangeiros.
“As Nações
Unidas sempre se preocuparam que a Guiné não servisse como interposto de droga”,
disse Carlos Gomes Júnior que recordou que a ONU e a Interpol têm escritórios
em Bissau para a investigação e combate ao tráfico de droga.
Pois é. Mas
será que nenhum dos frequentadores dos areópagos da política do reino lusitano
se lembra que Nino Vieira esteve metido até ao pescoço em crimes de sangue e de
corrupção mais do que activa? Que Nino Vieira usou todo o género de truques, de
golpes, para se perpetuar no poder, afastando política ou fisicamente quem lhe
fez sombra, seja ele Kumba Ialá ou Carlos Gomes Júnior, líder do PAIGC e agora
primeiro-ministro que em tempos disse que Nino teria sido o mentor do
assassinato do Comodoro Lamine Sanha?
Mas há mais.
Recorde-se que o presidente do Partido Africano da Independência da Guiné e
Cabo Verde (PAIGC), principal força política da Guiné-Bissau, Carlos Gomes
Júnior, afirmou no dia 25 de Outubro de 2008 que "há dinheiro do
narcotráfico na campanha eleitoral" para as legislativas de 16 de Novembro”.
"Só não
vê quem não quer. Há dinheiro do narcotráfico nesta campanha eleitoral",
acusou Carlos Gomes Júnior, no seu discurso de abertura da campanha do PAIGC em
Bissau, dizendo que "nós não somos tolos, sabemos que há dinheiro da droga
na campanha eleitoral. Se formos governo, vamos acabar com o banditismo e o
crime organizado neste país, podem ter a certeza disso".
Carlos Gomes
Júnior dizia nesse dia que se fosse eleito primeiro-ministro no dia 16 de
Novembro, com foi, iria promover uma ampla reforma no país, dotando as forças
de defesa e segurança de meios para combater "todos os crimes" na
Guiné-Bissau.
Viu-se.
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