quinta-feira, maio 31, 2012

Andam a gozar com a nossa chipala!

Toca a exportar espiões e relvas


Depois do êxito daquela coisa a que chamam “Magalhães”, e de outras similares, creio que a solução para a crise de Portugal passa por exportar espiões e relvas.

Se até há países como Angola que compram limpa neves, creio que Portugal teria sucesso na venda dos Silvas Carvalhos e  Miguéis Relvas, nem que para isso fosse necessário pôr a Fátima Campos Ferreira a fazer um programa da RTP a partir de Luanda.

Recordo-me das parangonas lusas quando, ao abrigo de um acordo bilateral assinado em Lisboa no dia 6 de Maio de 2009, ficou estabelecido que Portugal ia exportar para o Peru alguns dos programas de modernização do sistema de Justiça adoptados nos últimos anos, como a Pulseira Electrónica, a Empresa na Hora ou Citius.

E se já nessa altura, então sob o pontificado de José Sócrates, a economia portuguesa começava a ser salva, creio que com a venda – com carácter definitivo e sem retorno – de espiões e relvas o país alcançaria o êxito total.

"São experiências inovadoras que correm bem e que nós gostamos de partilhar com os nossos amigos. E constantemente ouvimos referências a boas práticas e inovações de outros países, o que permite um intercâmbio de vantagens recíprocas asseguradas", afirmou na altura o ministro português da Justiça, Alberto Costa, após a cerimónia de assinatura do memorando de entendimento para cooperação com o Peru.

Pois. E se na altura os portugueses não tinham razões para duvidar do sumo pontífice do Governo, José Sócrates, certamente que agora menos teriam com a descoberta destes novos nichos de mercado, onde espiões e relvas são um mero exemplo. Mero mas de peso, acrescente-se.

Pela República do Peru, o acordo foi então firmado pela ministra Rosário Figueroa, que esteve em Lisboa para a reunião da Comissão Delegada da Conferência de Ministros da Justiça dos Países Ibero-americanos, a que Portugal presidiu entre 2008 e 2010.

O documento estabelecia a cooperação na constituição imediata de sociedades comerciais, em atendimento presencial único, semelhante ao projecto “Empresa na Hora”, e monitorização electrónica de condenados, como a “Vigilância Electrónica” usada em Portugal.

É claro que, no caso da venda de espiões e relvas, Portugal poderia incluir no pacote, como bónus, também umas pulseiras electrónicas, mesmo dessas que os chineses vendem por tuta-e-meia.

No acordo com o Peru era igualmente incluído o modelo "Citius", de ferramentas informáticas de trabalho para magistrados e funcionários judiciais e formulários processuais e documentos electrónicos, visando a desmaterialização de processos. Cá para mim seria também de incluir este modelo no pacote dos espiões e relvas.

Como os portugueses constatam, tudo o que fazia parte do pacote peruano são coisas que funcionam às mil maravilhas nas ocidentais praias lusitanas a norte, embora cada vez mais a sul, de Marrocos.

A UE não sabe o que diz e não diz o que sabe


A União Europeia decidiu hoje reforçar as sanções contra o comando militar da Guiné-Bissau, acrescentando 15 pessoas à lista de indivíduos proibidos de entrar no espaço comunitário e sujeitos ao congelamento de bens na Europa.

Numa nota divulgada em Bruxelas, o Conselho da UE indica que, face à gravidade da actual situação na Guiné-Bissau, decidiu incluir na lista de medidas restritivas mais 15 pessoas que considera estarem a ameaçar a paz, a segurança e a estabilidade no país, e cuja identidade será conhecida amanhã, quando a decisão hoje tomada for publicada no Jornal Oficial da UE.

Como habitualmente, a comunidade internacional (seja lá o que isso for) e sobretudo a CPLP (que todos sabemos ser um montanha que nem um rato consegue parir) vira o disco mas a música é sempre a mesma.

Tal como agora, a UE entendeu que perante a morte do então presidente da República, “Nino” Vieira, a Guiné-Bissau teria de voltar à estabilidade constitucional.

Seja qual for a crise, a resposta é sempre a mesma. Não se cura a enfermidade mas apenas se alivia a dor. Isto até que o doente pura e simplesmente... morra.

A tese é a de que os guineenses podem ser alimentados com votos, com a ordem constitucional, com o que a UE quer, que as crises se resolvem com votos e que os votos são um milagroso remédio que cura todos os males.

O Ocidente, e neste caso particular da Guiné-Bissau a Europa e sobretudo Portugal, sabe que África teve, tem e continuará a ter uma História de autoritarismo que, aliás, faz parte da sua própria cultura e que em nada preocupa os fazedores da macro-política que se passeiam nos areópagos dos luxuosos hotéis do mundo.

Apesar disso, teima-se em exportar a democracia “made in Ocidente”, sem ver que a realidade africana é bem diferente. Vai daí, pela força dos votos os ditadores chegam ao Poder, ficam eternamente no poder e em vez de servirem o povo, servem-se dele. Ma como, supostamente, foram eleitos...

Mas será isso democracia? Por que carga de chuva ninguém se lembra que, por exemplo, na Guiné-Bissau as escolhas não são feitas com o cérebro mas com a barriga, ainda por cima vazia?

Foi neste contexto que “Nino” Vieira (tal como, entre muitos outros, José Eduardo dos Santos e Robert Mugabe) chegou a presidente e, tal como o seu homólogo, mentor e amigo angolano, por lá queria continuar com o beneplácito da tal Comunidade de Países de Língua Portuguesa.

A estratégia de “Nino” Vieira falhou, mas outras aí estão no terreno com inegável pujança e com a histórica cobertura dos donos do poder em Portugal, na CPLP e no mundo.

Ninguém se lembrou, apesar de saberem (até por experiência própria) que “Nino” Vieira (tal como Eduardo dos Santos ou Robert Mugabe) era só por si uma enciclopédia de corrupção. Ninguém quis ver que “Nino” foi o único histórico do país que enriqueceu depois da independência, tornando-se o homem mais rico de um país miserável.

“Nino” vendeu e comprou as melhores empresas do país (Armazéns de Povo, Socomin, Dicol, Titina Sila, Cumeré, Blufo, Bambi, Volvo, Oxigénio e Acetileno, etc., etc.), tornando-se sócio do então presidente Lassana Conté, da Guiné-Conakry, para melhor traficar, entre outras riquezas, os diamantes da Serra Leoa.

Que conclusões terá tirado a CPLP e Portugal quando Carlos Gomes Junior, primeiro-ministro exilado, disse que “era impossível coabitar com Nino Vieira que não passava de um bandido e de um mercenário que traiu o povo"?

Que conclusões terá tirado a CPLP e Portugal ao saber que, tal como se passou nas eleições angolanas, também “Nino” conseguiu em alguns círculos ter mais votos do que eleitores registados?

Pelos vistos à UE, à CPLP e a Portugal apenas interessa que se vote, nem que para isso se chamem os mortos, tal como vai de novo acontecer em Angola no dia 31 de Agosto.

Se os votos foram comprados, isso pouco interessa. Se os guineenses votam em função da barriga vazia e não de uma consciente opção política, isso pouco interessa.

Para quem vive bem, para quem tem pelo menos três refeições por dia, o importante foi e será que os guineenses votem. Não importa o que aconteceu antes, o que está a acontecer agora e que voltará a acontecer um dia destes.

Não será, aliás, difícil antever que o sangue do povo guineense voltará a correr. Mas o que é que isso importa? O que importa é terem votado...

Ter carácter para prestigiar os cargos públicos já é um artefacto de... museu


Por regra, o que me parece uma qualidade, Belmiro de Azevedo tem o coração ao pé da boca. Diz o que pensa, mesmo sabendo que essa é a melhor forma de arranjar inimigos. Mas também é para esse lado que ele dorme melhor.

Hoje o “tio” Belmiro considerou que Portugal perdeu uma geração "excelente" de representantes do Estado e membros da Assembleia da República que tinham uma vida "conhecida e apenas o desejo" de prestigiar os cargos.

E trocou por miúdos, mesmo sem desconto em cartão: "Hoje a maioria da Assembleia da República é outro tipo completamente diferente. As pessoas falam apenas para as plateias".

Na opinião de Belmiro de Azevedo, a primeira Assembleia da República "é irrepetível, pois era composta por pessoas que tinham uma vida muito conhecida e que não tinham outro desejo que não fosse o de prestigiar os cargos".

Dizem os jornalistas que o ouviram, que o presidente da Sonae escusou-se a definir os actuais representantes do Estado ou os membros da Assembleia da República. Nem era preciso. Para essa definição, mesmo sem ser por via do “jornalismo interpretativo”, basta levar em conta que os avoengos da espécie que hoje está no poder “não tinham outro desejo que não fosse o de prestigiar os cargos”.

Entre muitas outras coisas, recordo-me que Belmiro de Azevedo afirmou no dia 22 de Maio de 2009 que "estar empregado deve satisfazer praticamente toda a gente neste momento" e garantiu que "não há emprego para quem quer estar a passar os fins-de-semana com os pés na água".

Tinha e tem completa razão. Tal como tinha quando afirmou que "um subalterno tem o dever de questionar uma ordem do chefe e, se for o caso, dizer-lhe que não é suficientemente competente".

Falando no Porto à margem da cerimónia em que foi agraciado com o grau de doutor Honoris Causa pela Universidade do Porto, Belmiro de Azevedo admitiu que os trabalhadores não têm que "aceitar tudo", mas salientou que "também não podem manter reivindicações quando não há nada para reivindicar e ninguém para pagar".

"Se fechar a empresa o que é que vão fazer? Deve haver uma mudança no relacionamento entre sindicatos e empregadores. Há emprego onde for possível estar empregado, não há emprego para quem quer estar a passar os fins-de-semana com os pés na água", disse.

Segundo o "patrão" da Sonae, "nos países que têm uma relação com os trabalhadores muito mais transparente, agressiva e pró-desenvolvimento, as pessoas mexem-se mais depressa e a economia começa a trabalhar mais depressa".

Deve ser por isso que a velocidade em Portugal é devagar, parado ou em marcha atrás.

"Nos países como Portugal e os nórdicos, onde as pessoas têm um discurso muito concentrado nos direitos adquiridos, qualquer dia estão agarradas a um caco muito pequenino no meio do mar e vão ao fundo com o caco", alertou.

Para Belmiro, "o direito ao emprego deve existir, mas é preciso ser empregado e é preciso que o empregador exista também. Se o empregador desaparece o barco vai ao fundo".

No que diz respeito à Sonae, o empresário diz que não tem "praticamente" havido despedimentos porque o grupo "cresceu muito", mas admitiu que, "se acabar o crescimento ou reduzir a procura, o emprego tem que estar ajustado à actividade económica".

"Mas em Portugal ainda estamos a conseguir, mesmo quando há uma pequena empresa que deixa de ser competitiva, recolocar essas pessoas noutras áreas da Sonae ou até em nossos clientes", acrescentou.

Se calhar foi graças a essa tese de que “um subalterno tem o dever de questionar uma ordem do chefe e, se for o caso, dizer-lhe que não é suficientemente competente”, que Belmiro construiu o seu império.

Belmiro sabia que um chefe não é só o que manda - é sobretudo o que dá o exemplo. Sabia que a crítica não significa desobediência. Sabia que tinha de se rodear de massa crítica, pois para dizer sempre que “sim” bastava-lhe a própria sombra.

Ora, tal como a Assembleia da República, o Governo português está cheio de “sombras”. E está este como estão as associação empresariais, os sindicatos, o PS, o PSD, o CDS/PP e os organismos (sobretudo fundações, institutos e similares) criados para dar emprego a ex-políticos e candidatos a políticos.

“Sombras” que vivem religiosamente à custa das bênçãos, das cunhas, e dos padrinhos que, por regra, já chegaram a chefes do estado maior.

Com um país assim, onde são (quase) sempre os mesmos a ter acesso ao poder, sendo todos os outros relegados para fora de jogo, só há duas possibilidades: ter ideias e ser marginalizado ou, agora, ser sombra e filiar-se no PSD (excepcionalmente também no CSD/PP).

Mais dia menos dia o tacho irá sorrir.

Legenda: Mais uma foto histórica (na idade). Uma entrevista a Belmiro de Azevedo publicada no extinto Jornal de Notícias (não confundir com a versão azul do Correio da Manhã).

quarta-feira, maio 30, 2012

Sindicato dos Jornalistas faz o que pode. Mas quem, de facto, manda são os donos do reino


O Sindicato dos Jornalistas (SJ) portugueses considera “repugnante” e “própria da PIDE-DGS” a espionagem ao jornalista Ricardo Costa e exige (julgando que está num Estado de Direito) aos poderes constitucionalmente constituídos o apuramento de responsabilidades e a tomada de medidas.

Em comunicado divulgado hoje, o SJ lembra os mais recentes casos relacionados com as 'secretas' – um alegado “relatório” sobre Francisco Balsemão, as alegadas ameaças de revelação de dados da vida privada da jornalista Maria José Oliveira (“Público”), e a espionagem às comunicações do jornalista Nuno Simas (então ao serviço do “Público”) –, que no seu entender mostram que os “jornalistas não podem estar tranquilos”.

É claro que os jornalistas podem e devem estar tranquilos. Então agora que, com o apoio da maçonaria, há cirurgias capazes de remover a coluna vertebral, só têm de comer e calar. Nada mais do que isso é pedido pelos donos dos jornalistas que, por sua vez, cumprem os pedidos dos seus donos.

O bispo de Viseu, D. Ilídio Leandro, sem que daí tenham resultado consequências ou reacções por parte do SJ (ou de qualquer outro organismo existente para fazer Portugal parecer uma democracia), afirmou em Maio de 2009, a propósito do Dia Mundial das Comunicações Sociais, que “há muitos jornalistas que estão ao serviço do director e não da verdade”.

O bispo deveria ter acrescentado que, por sua vez, os directores estão ao serviço dos patrões (políticos e ou económicos) e não da verdade. Embora a verdade seja o que menos importa no putrefacto reino lusitano.

As declarações do bispo de Viseu foram graves mas, como sempre, ficaram no silêncio inconsequente da própria santa paz de... Deus. O “jornalismo” em Portugal atingiu em alguns casos um tal estado de descrédito que já ninguém se preocupa. Num sistema de vale tudo, pouco importa se o jornalismo virou propaganda e apenas é mais uma linha de enchimento comercial, ditada do largo do Rato ou da Lapa.

Aliás, a situação descrita pelo bispo não era já nessa altura nova, embora se tenha agravado com o advento da “ditadura” democrática do governo socialista de José Sócrates e seguida por Pedro Miguel Passos Relvas Coelho. Em alguns círculos, nomeadamente em blogues de jornalistas, o assunto tem sido passado a pente fino, embora – reconheço – sem resultados práticos.

É portanto uma situação que não só vai continuar como vai agravar-se e até mesmo algumas vozes sonantes, como a do bispo de Viseu, tenderão a calar-se porque ninguém gosta de pregar no deserto. Além disso, mesmo dentro da classe dos jornalistas, a tendência é passar a pensar com a barriga, o que significa que para sobreviver o melhor é comer e calar.

Na maioria dos casos a liberdade de imprensa já foi à vida, dir-se-ia que – como no tempo de Salazar - a bem da Nação. E, ao que parece, ninguém repara que a própria democracia está inquinada e pode finar-se a qualquer momento.

Para além de terem de comer o que lhe querem dar e calar para manter o emprego, os jornalistas estão a ser transformados em meros autómatos produtores de textos de linha branca aos quais as empresas apenas colam o rótulo que mais conveniente for.

Tudo isto significa vender gato por qualquer coisa que dê dinheiro, seja lebre, canguru, preguiça ou até mesmo… coelho. É, aliás, uma forma de pôr os jornalistas ao serviço da “verdade” oficial ditada nas “offshores” da manipulação das massas.

Os órgãos de soberania não podem fazer nada? Poder, podiam... mas não era a mesma coisa. Nada fazem porque este é o modelo de “informação” que querem. É o modelo que em vez de dar voz a quem a não tem, amplia a voz dos que têm acesso a tudo. É o modelo que em vez de lutar pelos milhões que têm pouco ou nada, luta pelos poucos que têm milhões. É, portanto, um modelo feito à medida e por medida.

A  solução não passa por Portugal mudar de povo. Mas tenho a certeza de que passa por Portugal mudar de políticos. Assim os portugueses tenham, e não há garantias que tenham,  tomates para o fazer.

Mudar só os políticos? Não. Há também muitos empresários que deveriam ser apenas trolhas (sem ofensa para estes) e muitos supostos jornalistas que ocupam cargos de direcção e chefia que deveriam aprender a contar até 12 sem terem de se descalçar.

O Ocidente vende as armas, os africanos matam-se e o TPI condena os... africanos!


Enquanto existir carne negra para morrer e riquezas para roubar, os países ditos civilizados lá estarão prontos para vender arsenais em nome da… justiça.

O antigo Presidente da Libéria, Charles Taylor, foi hoje condenado a 50 anos de prisão pelo Tribunal especial das Nações Unidas para a Serra Leoa, pelos crimes cometidos na guerra civil de 1991-2002, descritos pelo juiz na leitura da sentença como “os mais abomináveis” na história da humanidade.

Taylor, que insiste estar inocente, fora dado como culpado no mês passado, numa decisão judicial histórica, em 11 acusações de uma série de crimes de guerra – de violações a assassínios ao uso de soldados crianças – devido ao apoio que deu aos rebeldes da Frente Revolucionária na Serra Leoa durante a guerra civil em que morreram dezenas de milhares de pessoas.

É o primeiro antigo chefe de Estado a ser condenado por crimes de guerra num tribunal internacional desde os julgamentos de Nuremberga, no pós II Guerra Mundial.

Os procuradores pediam uma sentença de 80 anos de prisão, que reflectisse “a gravidade dos crimes” cometidos e o “papel principal” que Taylor teve, argumentando ainda que a idade e débil estado de saúde do arguido não deveriam ser considerados como factores na tomada de decisão da sentença por parte dos juízes.

A defesa argumentou por seu lado que aquele termo de prisão era “manifestamente desproporcionado e excessivo” e que o tribunal concluíra apenas na culpa do ex-Presidente num “papel indirecto”, o de ajudar os rebeldes e não na sua liderança.

Os observadores têm como muito provável que Taylor recorra desta sentença, dando azo a um processo que pode durar até seis meses. Caso a sentença emitida pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) em Haia seja confirmada, o ex-Presidente liberiano deverá cumprir a pena no Reino Unido – a condição posta pelo Governo holandês para que Taylor fosse julgado neste país e não na Serra Leoa, onde se temia que um tal julgamento desestabilizasse a região.

Segundo dados do Instituto de Pesquisas para a Paz de Estocolmo (Sipri), o comércio internacional de armas aumentou 24% nos últimos cinco anos. Pois é. O TPI julga (alguns) criminosos de guerra que, embora não sendo fabricantes de armas, lhe dão o uso para que elas foram feitas.

E se os maiores exportadores mundiais são os EUA, a Rússia, a Alemanha, a França e Grã-Bretanha, não deveriam estes países serem igualmente julgados pelo TPI?

De acordo com o levantamento, o comércio de armas aumentou 24% entre 2007 e 2011, sobretudo devido à crescente militarização dos países asiáticos.

A Índia tornou-se o maior importador de armas do mundo (representa 10% do comércio mundial), seguida de Coreia do Sul, Paquistão, China e Singapura.

Segundo os autores do estudo, a Índia ultrapassou a China como maior comprador graças em grande parte ao facto de a indústria bélica chinesa ter crescido muito nos últimos cinco anos.

Um outro estudo divulgado por um centro de estudos de Londres indicava que os gastos militares asiáticos superarão os europeus pela primeira vez em 2012.

Stephanie Blencker, da Sipri, afirmou que a China está prestes a integrar o grupo dos cinco maiores vendedores de armas do mundo, sobretudo devido às suas vendas ao Paquistão.

Por outro lado, o coronel Theoneste Bagosora, acusado de ser o "cérebro" do genocídio ruandês de 1994, que causou mais de 800.000 mortos, foi condenado no dia 18 de Dezembro de 2008 a prisão perpétua pelo TPI para o Ruanda.

Acho muito bem, apesar de a justiça teimar (quando teima, e teima poucas vezes) em actuar à posteriori e não como meio profiláctico. É que, digo eu, para os milhares de mortos já nada adianta a prisão de Theoneste Bagosora ou de Charles Taylor.

Nenhum destes (e de muitos outros) criminosos fabrica armas. Elas vão lá parar, a troco de petróleo ou de diamantes, enviadas pelo Ocidente que é onde elas se fabricam. Aliás, se Omar al-Bashir ou Thomas Lubanga, por exemplo, não existissem teriam de ser fabricados para que a indústria de armamento, que não é africana, pudesse continuar a ter lucros fabulosos.

O TPI considerou que Theoneste Bagosora foi o principal instigador do genocídio ruandês que, em 100 dias, vitimou mais de 800.000 pessoas. E, enquanto o TPI se entretém a fazer esta justiça (sem dúvida importante), outros genocídios continuam a acontecer, sem que se tomem medidas profilácticas.

Por cada genocídio que acabe, outro tem necessariamente de nascer. É disso, ou também disso, que vivem os países mais ricos do mundo. Com a diferença que os criminosos dão a cara, enquanto os instigadores e municiadores se acobardam nos areópagos da alta política ocidental.

Outros dois oficiais do exército ruandês foram condenados à mesma pena, igualmente por genocídio, crimes de guerra e contra a humanidade. "O tribunal condena Bagosora, Aloys Ntabakuze, Anatole Nsengiyumva a prisão perpétua", afirmou na altura o presidente norueguês do tribunal, Erik Mose.

E então os outros? Os europeus, os norte-americanos e os russos não deveriam também ser condenados?

Foi feita justiça? Foi, com certeza. E, portanto, todos podem dormir descansados até aos próximos julgamentos. É que, com tanta hipocrisia internacional, não vão faltar casos para julgar e – é claro – milhões de vítimas para somar ao rol dos que não contam para nada. Veja-se, por exemplo, o caso da Síria.

De acordo com a acusação, Bogosora anunciou em 1993, ao fechar a porta a negociações com os rebeldes tutsis da Frente Patriótica ruandesa, que ia regressar ao país para "preparar o apocalipse", ou seja, o genocídio.

Hoje todos sabem que há outros generais a "preparar o apocalipse" mas, apesar disso, estão caladinhos. Lá vão vendendo as armas, trazendo petróleo e diamantes e depois reclamam justiça e decretam umas prisões perpétuas.

Enquanto existir carne negra para morrer e riquezas para roubar, os países ditos civilizados lá estarão prontos para vender arsenais em nome da… justiça.

terça-feira, maio 29, 2012

Porra! De novo a mulher da limpeza?


O director do Expresso, Ricardo Costa, disse hoje  que quer saber quem ordenou um relatório sobre a sua vida profissional e pessoal e espera que essa resposta seja dada "ao mais alto nível".

Vai esperar sentado, como é óbvio. Aliás, ele sabe que é mesmo assim. O máximo que se conseguirá saber é que a culpa volta a ser da dona Maria – a mulher da limpeza.

O Expresso 'online' noticiou hoje que o antigo director do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) e ex-administrador do grupo Ongoing, Jorge Silva Carvalho, tinha um relatório detalhado sobre a vida do director do semanário.

Trabalhando em série, como parece ser a vocação dos mais recentes espiões made in Portugal, é provável que Jorge Silva Carvalho, este ou outro qualquer do mesmo jaez, para lá tenha informações sobre muitos outros jornalistas da praça.

E como espião prevenido vale mais algumas coisa, os directores e similares que iam ao beija-mão do anterior sumo pontífice socialista, José Sócrates, que se cuidem. Enquanto jornalistas venderam a alma e, por isso, sujeitam-se a que a história tenha novos capítulos.

"O documento, a que o Expresso teve acesso, tem 16 páginas e contém informação pormenorizada sobre aspectos pessoais e profissionais de Ricardo Costa, incluindo relações afectivas, nomes, idades e escolas frequentadas pelos filhos menores, uma análise do seu perfil e dos seus aliados e adversários, bem como um historial desde os seus tempos do liceu", refere o semanário.

Convenhamos que estes supostos discípulos de Silva Pais parecem, de facto, querer honrar as técnicas e estratégias da PIDE/DGS. Tal como Rosa Casaco, estes novos espiões não olham a meios para atingir os seus fins, os fins de uma ambição desmedida onde vale tudo… até mesmo tirar olhos.

"Não sei se o secretário-geral dos Serviços de Informação da República tem a noção de que estas coisas são feitas sobre os jornalistas", comentou o director do Expresso.

Para eles, se calhar bem mais do que a PIDE, os jornalistas nada significam, a liberdade nada significa, a democracia menos ainda. Eles, com a necessária ajuda (mesmo que passiva) dos políticos, apenas querem ser co-proprietários do reino.

Aliás, numa altura em que se conhecem mais ou menos quem são os donos dos jornalistas mas, pelo contrário, se desconhece quem são os donos dos donos, importa dizer que por via maçónica, partidária, homossexual ou outra, muitos desses supostos jornalistas chegaram a cargos de topo sem saberem ler nem escrever. Portanto…

Em segundo lugar, acrescenta Ricardo Costa, "não faz sentido que os jornalistas sintam que, de alguma forma, estão eventualmente a ser espiados por autoridades públicas, ainda muito menos quando depois esses serviços têm relações com interesses privados mais ou menos obscuros".

De uma coisa todos podem estar certos. Não são muitos os jornalistas espiados. E não são porque esse tipo de espionagem só é necessária quando os jornalistas têm coluna vertebral e tomates. E como o Ricardo Costa sabe, são cada vez menos os que se podem gabar disso.

Se os jornalistas portugueses se limitasses, a bem da nação, a fazer o que o poder político e seus lacaios querem, ou seja a reproduzir as ordens, dando  tudo (muitos já nem usam vaselina, tal é a prática)  o que têm para agradar ao chefe, evitassem  contar até 12… para não terem de se descalçar, nenhum espião estaria interessado neles.

Mas como muitos deles, mais do que serem jornalistas, querem é ser directores, lá andam com uma mão à frente e outra atrás, com frascos de vaselina no bolso, a mendigar de joelhos, de cócoras ou na horizontal. E quando lá chegam, mesmo quando muda o chefe do posto, não podem ter ambições que vão além de sipaio.

segunda-feira, maio 28, 2012

Não é por ser 28 de Maio…


O Conselho Deontológico (CD) do Sindicato dos Jornalistas portugueses está preocupado com a sucessão de casos que “indiciam o recurso a pressões sobre jornalistas, tendentes a condicionar o exercício da liberdade de expressão e a autonomia e independência dos profissionais da comunicação social”.

Tanto quanto sei, seja isto “jornalismo interpretativo” ou outra coisa qualquer, a situação não é nova e atravessa toda a democracia(?) portuguesa, embora mais visível nos últimos anos.

Em comunicado divulgado hoje, 28 de Maio (nem de propósito!), o CD reporta-se – certamente por uma questão de actualidade e não por falta de memória - à denúncia feita pelo Conselho de Redacção do jornal “Público” de “alegadas pressões exercidas pelo ministro Miguel Relvas”, bem como a apresentada pelo Conselho de Redacção da RTP-Açores contra a “atitude intempestiva do secretário Regional, José Contente, que interferiu no trabalho da jornalista que fazia a cobertura noticiosa dos estragos causados pelo mau tempo na zona da Bretanha, ilha de São Miguel”.

É o seguinte o texto, na íntegra, do comunicado do Conselho Deontológico: 

“O Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas manifesta preocupação pela sucessão de casos que indiciam o recurso a pressões sobre jornalistas, tendentes a condicionar o exercício da liberdade de expressão e a autonomia e independência dos profissionais da comunicação social. 

Declarações e comentários produzidos a propósito dos casos mais recentes permitem supor que algumas dessas práticas constituem instrumentos de condicionamento continuado e utilizado de forma generalizada pelo poder político e económico. Muitas dessas atitudes podem configurar situações de assédio moral. 

O Conselho Deontológico manifesta igual preocupação pelas acusações que atentam contra a dignidade profissional dos jornalistas. Traduzem-se na criação da percepção de que as relações dos jornalistas com as fontes de informação são pautadas por conveniências políticas ou outras e, por troca de favores, em clara violação de princípios éticos e deontológicos e da derrogação do seu primado e aspiração à prestação de um serviço público. 

O Conselho de Redacção do jornal Público denunciou alegadas pressões exercidas pelo ministro Miguel Relvas, que se traduzem numa grosseira ameaça aos direitos constitucionais dos jornalistas. A actuação denunciada pelo Conselho de Redacção e confirmada pela direcção do jornal evidencia um comportamento arrogante e uma falta de cultura democrática da maior gravidade. O ministro não se limitou a enunciar pressões sobre o jornal, como ameaçou divulgar dados da vida privada da jornalista que o interpelou. 

Também o Conselho de Redacção da RTP-Açores denunciou a atitude intempestiva do secretário Regional José Contente que interferiu no trabalho da jornalista que fazia a cobertura noticiosa dos estragos causados pelo mau tempo na zona da Bretanha, ilha de São Miguel. Permitiu-se coercitivamente agarrar a jornalista pelo braço que segurava o microfone para impor as declarações que não lhe foram solicitadas. 

A exposição pública destes factos suscitou reacções díspares e contraditórias. Em qualquer dos casos, os governantes cuja actuação foi denunciada pelos Conselhos de Redacção negaram as práticas imputadas. A posição de Miguel Relvas assumiu já diferentes cambiantes. A justificação mais mistificadora consiste na sua assumpção do papel de vítima, ao ser, como o alega, pressionado pela jornalista para responder a uma pergunta no prazo de 32 minutos. Além da inconsistência argumentativa, confunde o ciclo da organização do trabalho com uma pressão.

O Conselho Deontológico reprova as pressões e ameaças do ministro Miguel Relvas, exercidas contra a jornalista do Público e o jornal, bem como a atitude do secretário José Contente tomada contra a jornalista da RTP-Açores. Estas atitudes são atentatórias da liberdade de expressão e de imprensa. 

O Conselho Deontológico regozija-se pela decisão dos Conselhos de Redacção de denunciarem as ofensas aos seus direitos, tal como estabelece o número 3 do Código Deontológico do Jornalista. E reitera a necessidade de os jornalistas reforçarem a sua organização nas redacções. Os Conselhos de Redacção constituem um mecanismo fundamental para assegurar a qualidade do jornalismo e para garantir o juízo ético-deontológico nas redacções.”

Só de vez em quando o narcotráfico parece preocupar os donos da ONU, da UE e da CPLP


Pelos vistos as autoridades portuguesas, bem como a Europa, só agora descobriram que o narcotráfico está a ameaçar a existência de alguns países africanos, nomeadamente lusófonos.

Das duas uma. Ou andam a dormir na forma, o que não seria novidade, ou beneficiam dessa situação. Só assim se compreende o silêncio, a inépcia e a constante cobardia de que fazem uso.

A instabilidade sócio-política nos países da África Ocidental está a deixá-los à mercê de narcotraficantes e de "extremismos", incluindo o terrorismo islâmico, tornando-se uma ameaça sobretudo para Europa, o  que exige a intervenção da comunidade internacional.

Esta tese foi defendida pelos investigadores Victor Ângelo e Rui Flores, então técnicos da ONU, num estudo publicado pelo Instituto Português de Relações Internacionais da Universidade Nova de Lisboa em Agosto de… 2007.

No estudo "A Mistura Explosiva da Expansão Demográfica, Desemprego e Narcotráfico na África Ocidental", os dois investigadores salientam que a actual explosão demográfica - a população da região deverá aumentar 100 milhões de pessoas ao ano até 2020 - não está a ser acompanhado pelo crescimento económico e criação de emprego, "levando a que os jovens não tenham perspectivas de futuro" e vivam na pobreza.

"Esta quadro demográfico, social e económico é propício ao desenvolvimento de extremismos, sejam do tipo terrorista, como a Al-Qaida, ou de outros, que têm na juventude um exército de reserva radical à espera de um líder", referem os investigadores.

"Pressionados pelo desemprego e pela fome, pessimistas em relação às perspectivas de futuro, [os jovens] vêem na adesão a um grupo paramilitar ou integrista ou numa viagem sem fim a sua única saída - e por isso desaguam todas as semanas centenas de imigrantes ilegais nas costas das Canárias ou no Sul de Espanha, em Malta ou na `bota´ italiana", adiantam.

Entre os 15 países da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) estão dois Estados lusófonos: Cabo Verde e a Guiné-Bissau.

Do grupo fazem ainda parte Benim, Burkina Faso, Costa do Marfim, Gâmbia, Gana, Guiné, Libéria, Mali, Níger, Nigéria, Senegal, Serra Leoa e Togo. Destes países, apenas Cabo Verde, Gana e Senegal não sofreram golpes de Estado nas últimas décadas, e 12 deles estão no grupo dos 31 Estados mais pobres do mundo, no índice de desenvolvimento das Nações Unidas.

Victor Ângelo e Rui Flores salientam ainda a ineficiência da generalidade dos Estados, que se encontram minados pelo "vírus da corrupção", visível no "funcionário público que recebe dinheiro por baixo da mesa" ao "alto governante, que garante para si uma percentagem de um qualquer contrato estabelecido pelo Estado, e uma companhia que também se apropria de recursos provenientes da cooperação internacional".

A causa, defendem, está na legislação "opaca, de difícil compreensão e aplicação", muitas vezes copiada "sem qualquer consideração pelos contextos histórico-sociais de cada país", mas também por o Estado "pagar pouco e a más horas", de que é exemplo a Guiné-Bissau.

Tudo isto, afirmam os dois investigadores, torna estes países particularmente vulneráveis à criminalidade organizada e, em particular, ao narcotráfico, que faz de países como a Guiné-Bissau plataformas giratórias nas rotas internacionais da droga, entre a América do Sul e a Europa.

"Há uma mistura explosiva que pode fazer da África Ocidental uma espécie de `cocktail molotov´ de dimensão regional, cujos danos afectarão sobremaneira a União Europeia. Os seus efeitos, aliás, já começaram a fazer-se sentir".

"Este aumento exponencial no tráfico de droga na região deve-se não só à fragilidade dos Estados, mas ao facto de o negócio dos estupefacientes ser extremamente lucrativo, em particular o tráfico de cocaína e heroína", referem Victor Ângelo e Rui Flores.

A título de exemplo, referiam nesse estudo de 2007 que na Guiné-Bissau a apreensão de 635 quilos de cocaína em Abril valeria a 8,5 milhões de euros no mercado da região; vendida em Espanha, a droga geraria um lucro de 11 milhões de euros, valor que equivale a 20 por cento do total da ajuda internacional da Guiné-Bissau, 14 por cento de todas as exportações do país e quase quatro vezes o total do investimento internacional directo no país.

"A disponibilidade crescente de cocaína na região levou ao estabelecimento de armazéns por toda a costa, o que veio facilitar o aumento do tráfico feito por locais e a existência de redes estruturadas, capazes de adquirir e redistribuir centenas de quilos", adiantam.

Os dois investigadores salientam ainda que o problema "não é apenas a ausência de meios", mas também "uma certa relutância crónica do poder político tomar medidas que combatam eficazmente o tráfico".

"É neste cenário que surgem os narco-estados. Afinal, há quem veja a associação aos grupos de crime organizado apenas como uma tentativa de assegurar um modo de sustentar a sua família", dizem.

Para atacar este problema, "que tem todas as condições para pôr em risco a estabilidade internacional", os investigadores sugerem a assistência da comunidade internacional, visando mais cooperação policial e o fortalecimento das instituições nacionais, com a reforma da segurança a merecer especial atenção, sobretudo quando se adensam suspeitas sobre o envolvimento de militares e de agentes da segurança no narcotráfico".

O problema, adiantam, exige ainda medidas para diminuir o impacto da explosão demográfica e do desemprego, e a revisão das políticas da União Europeia, de imigração e inclusivamente aduaneiras , "deixando cair medidas proteccionistas, para permitir que outras regiões se desenvolvam e consigam entrar com os seus produtos, em moldes competitivos, na Europa".

A concluir, apontam a necessidade da comunidade internacional e as Nações Unidas definirem o narcotráfico como crime contra a Humanidade, entendimento que, assumem, "poderá não ser fácil de conseguir".

domingo, maio 27, 2012

“A bufaria” de (quase) todos!


O bastonário da Ordem dos Advogados de Portugal considera que a alegada investigação da vida privada de Francisco Pinto Balsemão, presidente da Impresa, por Jorge Silva Carvalho é “um atentado gravíssimo” à democracia, que deve ser “investigado até às últimas consequências”.

A despropósito, ou talvez não, deixem-me tomar como análise o texto de opinião (“A bufaria”) que Marinho e Pinto publicou em Fevereiro de 2010 no JN.

“O caso Mário Crespo não é um problema de liberdade de informação, mas (mais) um sintoma da degradação a que chegou a comunicação social”.

Ao contrário do que afirma Marinho e Pinto, o caso Mário Crespo (um dos muitos da praça portuguesa) é mesmo um exemplo de falta de liberdade de opinião, embora o autor lhe chame de informação em abono da tese que pretende levar a cabo.

E essa tese é a da degradação da comunicação social que, reconheça-se, existe. É claro que quando a degradação serve para as causas de alguns advogados, chama-se informação. E é pena que as coisas mudem de nome consoante os interesses em jogo.

“Uma conversa privada do primeiro-ministro, num restaurante, sobre um jornalista que há anos o critica publicamente, é prontamente denunciada ao visado que logo tenta criar um escândalo político.”

Essa de as figuras públicas terem em locais públicos conversas privadas só lembraria ao advogado Marinho e Pinto, embora não lembrassem ao jornalista (que foi) Marinho e Pinto.

É mais ou menos como os políticos que se deslocam pelo país com a mordomias da função mas que, quando apanhados em alguma situação menos regular, se apressam a dizer que ali estão como cidadãos e não como políticos.

“Sublinhe-se que ambos são figuras públicas com direito a terem, uma da outra, as opiniões que entenderem. Apenas com um senão: nem José Sócrates poderá usar os seus poderes de primeiro-ministro para perseguir o jornalista Mário Crespo, nem este deverá usar os meios de que dispõe como jornalista para perseguir o primeiro-ministro.”

Ao contrário do que agora defende Marinho e Pinto, qualquer primeiro-ministro tem compromissos diferentes dos jornalistas. A estes o mais sagrado dos seus compromissos é com o que pensam ser a verdade, sobretudo (mas não só) quando em questão estão figuras públicas que devem ser paradigmas de honorabilidade.

Eu sei que quando um jornalista revela algo que desagrada ao poder isso é perseguição. Quando é o poder que revela algo contra o jornalista, isso é moralização da vida pública. Mas mesmo assim…

“Porém, os jornalistas, em geral, julgam-se no direito de publicar as opiniões que quiserem (por mais ofensivas que sejam) sobre os governantes (mesmo violando as regras éticas do jornalismo), porque entendem que isso é direito de informar. Mas se os visados emitirem a mais leve opinião sobre esses jornalistas isso é um ataque à liberdade de informação.”

Tirando a linguagem panfletária de Marinho e Pinto (é o seu estilo e, por isso, respeitável), importa dizer que as opiniões, sejam do bastonário da Ordem dos Advogados, do jornalista ou do arrumador de carros, não se regem por regras éticas inerentes a cada uma das profissões. São opiniões pessoais e ponto final.

“O jornalismo português tem vindo a degradar-se por falta de referências éticas. Hoje, tudo vale para obter informações, incluindo o recurso a “bufos”. Nos tempos do Estado Novo usava-se esse termo para designar as pessoas que davam informações à polícia política sem que ninguém desconfiasse delas. Geralmente eram até da confiança das vítimas. Faziam delação às escondidas, por dinheiro ou simplesmente para tramar os visados. Agora continua-se a denunciar pessoas a quem as possa tramar. Os “bufos” são os informadores privilegiados dessa nova polícia de costumes em que se transformaram certos órgãos de informação de Lisboa.”

Aqui fiquei mais descansado. Ao que parece, segundo Marinho e Pinto, os “bufos” (mesmo que entre aspas) só trabalham com certos órgãos de informação de Lisboa. Presumo que todos os outros estejam fora desse saco.

É verdade que ao jornalismo faltam referências éticas. Mas se os jornalistas (neste caso não só os de Lisboa) vivem e trabalham numa sociedade sem referências éticas, sejam políticas, empresariais, judiciais ou outras, não é justo que se lhes exija o que não encontram noutras profissões.

“Há alguns anos, um político e professor universitário (Sousa Franco), por sinal meio surdo, conversava tranquilamente num restaurante. Numa mesa ao lado, uma jornalista (talvez disfarçada de costeleta de borrego) tomava notas da conversa, sem que os visados se apercebessem. Dias depois o teor da conversa era manchete num semanário de Lisboa”.

Marinho e Pinto esquece-se (desde logo porque é matéria de facto capaz de abalar as suas teses) que se um jornalista (seja num restaurante, num jardim, num prostíbulo) não procura saber o que se passa é um imbecil. Tal como se esquece que se esse jornalista consegue saber o que se passa (seja num restaurante, num jardim, num prostíbulo) e se cala passa a ser um criminoso.

“Também há alguns anos, um professor do ensino secundário (Fernando Charrua), conversando com um colega no gabinete deste, emitiu sobre o primeiro-ministro uma daquelas opiniões que só se expressam em conversas privadas. Pois, logo o colega o foi denunciar aos superiores hierárquicos.”

Afinal, ao que parece, não são só os jornalistas que não têm referências éticas…

“O mesmo aconteceu com um juiz conselheiro, que, numa conversa a dois com um colega, emitira o mesmo tipo de opinião sobre o Conselho Superior da Magistratura. Logo o colega o foi denunciar ao CSM. Mais recentemente, um magistrado do Ministério Público que, durante um almoço com dois colegas, opinara sobre um processo de que estes eram titulares foi de imediato denunciado por os ter “pressionado”.

Afinal, ao que parece, não são só os jornalistas que não têm referências éticas…

“Hoje não se pode estar à vontade num restaurante, porque ao lado pode estar um “bufo” a ouvir a conversa para a ir relatar ao seu tablóide preferido. Até a factura da refeição pode ser útil para o mesmo fim. A privacidade deixou de ter qualquer respeito ou protecção”.

Marinho e Pinto sabe que por muito que uma mentira seja dita nunca chega a ser verdade. Mesmo assim vai tentando. Quem sabe se não pega. É pena. A privacidade de figuras públicas não tem lugar em lugares públicos. Se calhar é por isso que o Conselho de Ministro não é feito num restaurante.

“Os meus rendimentos, constantes da minha declaração de IRS, foram obtidos ilicitamente nas finanças e andaram a ser oferecidos a alguns jornais de Lisboa até que um deles os publicou. Tudo para tentar desqualificar-me como advogado, mostrando que, supostamente, eu ganhava mais como jornalista.”

Obtidos ilicitamente por quem? Afinal, ao que parece, não são só os jornalistas que não têm referências éticas…

“A sordidez desse tipo de jornalismo traz-me à memória um episódio ocorrido há cerca de 20 anos em que se chegou ao ponto de tentar fazer uma notícia sobre uma consulta de ginecologia de uma dirigente política, que na altura desempenhava funções governamentais”.

É sórdido. É sim senhor. Mas como os jornalistas, segundo Marinho e Pinto, carecem de referências éticas, não seria de revelar quem foram os protagonistas (com excepção da dirigente política) desse caso? Quem foram os jornalistas envolvidos? O que é feito deles?

“Tudo isso só é possível porque o jornalismo está em roda livre, sem qualquer regulação e a própria justiça, em vez de corrigir esses desvarios, coonesta-os e acaba por também recorrer a eles.”

Ora aí está. Afinal, ao que parece, não são só os jornalistas que não têm referências éticas…

“Por mim tomei já vários cuidados. Evito conversas em restaurantes, já não falo ao telefone e mesmo no meu escritório já tomei as devidas precauções. Perdi toda a confiança nas comunicações em Portugal porque a deriva fundamentalista e justiceira de muitos dos nossos magistrados mostra que qualquer pessoa pode estar sob escuta, incluindo as mais altas figuras do Estado.”

Ou seja… Afinal, ao que parece, não são só os jornalistas que não têm referências éticas…

“Por isso, não falar ao telefone é hoje um gesto tão prudente como o era no tempo da ditadura. E mesmo como advogado, já retirei do meu escritório quaisquer elementos que possam ser usados contra alguns dos meus clientes, pois é normal em Portugal fazerem-se buscas a escritórios de advogados, com mandados em branco, ou seja, com ordem para apreender tudo o que possa ajudar a incriminar os seus constituintes.”

Bem vistas as coisas, o próprio Marinho e Pinto reconhece que no pódio dos maus da fita os jornalistas nem sequer têm lugar.

Nem as crianças (mortas) acordam a NATO


As Nações Unidas, de acordo com os donos do mundo, debatem o massacre de Houla, na Síria, em que 34 das 90 pessoas que morreram eram crianças. Resultado prático? Nenhum, obviamente.

O massacre, apenas mais um, tem sido condenado de forma veemente pela comunidade internacional. A tradição desta condenação é a de que continuam a existir terroristas bons e terroristas maus, sendo que a catalogação continua a ser feita pelos tais donos do mundo.

O Reino Unido quer que a Rússia, o único grande aliado do regime sírio, aumente a pressão sobre Bashar al-Assad para que pare a matança de civis. O líder sírio ri-se a NATO continua com o rabinho entre as patas.

Provavelmente a NATO e a ONU irão dizer que até prova em contrário Bashar al-Assad é inocente, desde logo porque este afirma não ter qualquer responsabilidade no massacre, atribuindo a responsabilidade a "terroristas".

Desde Março de 2011 que milhares de pessoas (não sei se Bashar al-Assad  considera pessoas os que pensam de forma diferente) foram mortas na Síria.

Todo o mundo sabe há muito, muito tempo, que Bashar al-Assad não era flor que se cheire. Mas o cheiro, o mesmo cheiro, já tem décadas e isso nunca incomodou os donos do mundo, tal como não os incomoda que o presidente de Angola, há 33 anos no poder sem ter sido eleito, tenha 70 por cento da população na pobreza.

No caso da Síria, como no da Líbia, é de facto uma chatice. Bem que Kadhafi e Bashar al-Assad poderiam ter resolvido a questão de outra forma, fazendo o mesmo que os seus homólogos do Egipto e da Tunísia.

Não deixa, contudo, de ser curioso que embora consideram agora Bashar al-Assad um  exemplo de todos os males, não se atrevam a fazer na Síria o que tão lestamente fizeram na Líbia.

A NATO continua a ser fortes contra os fracos  e fraca contra os fortes. Depois de ter deposto Muammar Kadafi e de o ter ajudado a matar, recolheu a penates e esqueceu a Síria.

Por alguma razão Bashar al-Assad não está com meias medidas e pergunta: “Querem outro Afeganistão, ou dezenas de Afeganistões?”

“Qualquer problema na Síria vai afectar toda a região”, avisa  Assad. “A Síria é neste momento a linha de fractura do Médio Oriente. Qualquer intervenção ocidental causará um terramoto”, acrescenta o presidente sírio em Novembro de 2011 numa entrevista ao jornal britânico Daily Telegraph.

Embora o povo sírio continue a ser morto pela gigantesca máquina de guerra da ditadura de Assad, a NATO tem outras preocupações. Enquanto se viram agora para a divisão dos despojos líbios, os países ocidentais não estão dispostos a levar porrada com uma intervenção similar na Síria.

E enquanto os sírios morrem como tordos, o presidente dos EUA, Barack Obama, e o primeiro-ministro britânico, David Cameron, pedem (que grande coragem!) o "fim imediato do banho de sangue" na Síria.

Recorde-se que Kadhafi acabou por, mesmo na morte, ser um aliado dos donos do mundo. Assim ninguém saberá o que ele poderia dizer sobre os seus anteriores amigos, alguns dos quais, como José Sócrates, o consideravam um “líder carismático”.