Activistas sul-africanos de defesa dos direitos dos seropositivos querem que o ex-presidente Thabo Mbeki e a sua então ministra da Saúde respondam na justiça pelas mortes desnecessárias de 330 mil pacientes entre 2000 e 2005. Os referidos activistas batem-se há longos anos pelo direito ao tratamento com anti-retrovirais dos doentes em instituições públicas.
Zachie Achmat, presidente da organização não-governamental Treatment Action Campaign (TAC), que recebeu vários prémios internacionais pela sua luta contra as políticas do ex-chefe do Estado e do governo sul-africano, disse ontem que “Mbeki tem as mãos manchadas de sangue” e deveria ser alvo de um processo perante uma comissão judicial independente.
Conhecido pelas suas posições pouco ortodoxas relativamente ao HIV/Sida, Mbeki passou os 9 anos dos seus dois mandatos como presidente a negar a ligação directa entre o HIV e a Sida, subscrevendo uma série de teses dos chamados “cientistas dissidentes” e resistindo à introdução no sistema público de saúde dos tratamentos com anti-retrovirais (ARV’s).
A sua ministra da Saúde, Manto Tshabalala-Msimang, subscreveu sempre as posições do ex-presidente, tendo classificado em várias ocasiões os ARV’s como “venenos” e defendido publicamente que os seropositivos deveriam ingerir doses diárias de batatas africana, alho, beterraba, azeite e outros produtos naturais, em vez de ARV’s para combater o vírus que os aflige.
Um estudo publicado em 20 de Outubro pela Escola de Saúde Pública de Harvard, e assinado pelo professor Pride Chigwedere, conclui que 330 mil seropositivos perderam a vida entre 2000 e 2005, em resultado da ausência de programas de tratamento com anti-retrovirais na África do Sul, decorrente da negação sistemática do presidente e da sua ministra da Saúde relativamente ao HIV/SIDA.
O estudo conclui também que naquele período 35 mil crianças nasceram infectadas pelo HIV porque o governo proibia o tratamento das mães com drogas destinadas especificamente a travar a infecção de mães para filhos, designadamente o Nevirapine, que é utilizado em praticamente todo o mundo.
Zachie Achmat e o TAC - que processaram judicialmente várias vezes os governos de Mbeki para que fossem forçados a disponibilizar ARV’s nos hospitais públicos - pediram ao actual governo do presidente Kgalema Motlanthe que convoque Mbeki e Tsbalala-Msimang para que sejam questionados sobre as suas políticas e os seus resultados.
Os activistas desejam que Mbeki se explique também perante a Comissão da Verdade e Reconciliação (TRC), defendendo que “é necessário fazer justiça àqueles que morreram em resultado das poíticas de Mbeki”.
“Esta é a razão pela qual o TAC defendia desde há muito a demissão do presidente Mbeki pelo seu partido, o ANC, por ele ter as mãos manchadas de sangue”, disse hoje Achmat.
“Este estudo da Harvard demonstra claramente aquilo que o TAC vem defendendo há muito: que há uma ligação directa entre muitos milhares de mortes e a negação do ex-presidente face à SIDA”, concluiu o presidente do TAC.
François Venter, que lidera a Unidade de Saúde Reprodutiva e de Pesquisa do HIV na Universidade de Witwatersrand, Joanesburgo, afirma que o estudo aponta para “uma vergonhosa falta de liderança” do antigo presidente, ao mesmo tempo que se regozija com o facto do novo governo ter nomeado Barbara Hogan, uma respeitada especialista que considera ser “uma líder inspiradora”, para a pasta da Saúde.
Quando Mbeki foi afastado da Presidência e da chefia do governo, em Setembro último, o ex-presidente americano Jimmy Carter declarou “não nutrir qualquer simpatia para com ele (Mbeki)”.
Carter revelou então que o ex-chefe do Estado sul-africano recusou há uns anos, na sua presença e de Bill Gates, generosos fundos da Fundação Carter para adquirir ARV’s para pacientes sul-africanos com o argumento de que “a SIDA foi uma invenção do Ocidente para exterminar africanos” e que “os ARV’s são uma forma de gerar lucros à custa dos africanos e dos países em desenvolvimento em geral”.
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