domingo, março 25, 2007

Os abutres e a carne putrefacta
A carne putrefacta e os abutres

Os abutres são aves de rapina que se alimentam quase exclusivamente da carne putrefacta dos animais mortos. Ora, para que eles proliferem na sociedade portuguesa é preciso que exista a tal carne putrefacta. Se esta não existir, os abutres também não existem. Ou seja, estas aves dependem da existência de animais mortos… ou em vias disso.

Os abutres são normalmente vistos como aves que se alimentam de cadáveres em decomposição (aves necrófagas). De entre os abutres que ocorrem entre nós, o Grifo (Gyps fulvus) e o Abutre negro (Aegypius monachus) são verdadeiros especialistas na necrofagia, enquanto o Abutre do Egipto (Neophron percnopterus) explora principalmente os restos disponíveis.

Ou seja, estas aves dependem da existência de animais mortos… ou em vias disso.

Segundo Nuno Leitão, a exploração dos cadáveres com o consumo da carne putrefacta por parte destas aves, acompanhado da sua fisionomia e do seu grande porte, faz com que os humanos as sintam como verdadeiros símbolos da morte. Principalmente, quando nos deparamos com o Grifo e com o Abutre negro, aves impressionantes, com envergaduras superiores a 2,5 metros e com as suas cabeças e seus compridos pescoços, desprovidos de penas para melhor explorarem as carcaças dos animais mortos.

Ou seja, estas aves dependem da existência de animais mortos… ou em vias disso.

O Grifo alimenta-se da carne de cadáveres de médios e grandes mamíferos e, em certos casos, da carne das aves maiores e dos peixes mortos. O Abutre negro tem uma dieta praticamente constituída por carne de animais mortos, mas prefere cadáveres de animais mais pequenos e, à falta destes, pode mesmo caçar pequenos animais, como coelhos com mixomatose e pequenos cordeiros.

O Abutre do Egipto apresenta uma dieta mais diversificada, mas alimenta-se frequentemente de cadáveres de pequenos animais, como ratos, cobras e coelhos. Quanto à exploração da carne dos animais de maior porte, devido ao seu bico menos forte, apenas explora certas partes do cadáver, como sejam os olhos, a língua e as vísceras (após abertura da carcaça por outros necrófagos).

Ou seja, estas aves dependem da existência de animais mortos… ou em vias disso.

Passe a tétrica constatação, tal como fazem com outros despojos, os abutres podem incluir naturalmente na sua dieta os cadáveres humanos. Na verdade, a biomassa média do Homem, do ponto de vista nutritivo, é relativamente vantajosa para os abutres.

Desde a antiguidade, que este facto, tornou as relações do Homem com os abutres pouco amistosas, tendo sido os abutres alvos de perseguição pelo Homem ao longo dos tempos. Os locais mais frequentes de interacção do Homem com os abutres eram os campos de batalha, onde chegava a haver grupos de homens para afastar os abutres, de forma a impedir danos nos soldados feridos. Mesmo hoje em dia, estas situações de aproveitamento dos cadáveres humanos por parte dos abutres sucedem quando ocorrem catástrofes naturais.

Ou seja, estas aves dependem da existência de animais mortos… ou em vias disso.

Esta relação Homem/Abutre deu azo também a inúmeras práticas culturais onde estas aves desempenham o papel principal. Determinadas culturas aplicavam sentenças de morte, onde os homens condenados eram amarrados e deixados para morrer, ficando à mercê dos abutres. Há também práticas funerárias, que subsistem até hoje, e que levam a que os cadáveres sejam expostos aos abutres. Os Parsis de Bombaim depositam os corpos dos defuntos nas chamadas "Torres do Silêncio", quase como que em oferta aos abutres, e alguns monges tibetanos oferecem aos abutres, pedaços dos corpos dos falecidos.

Ou seja, estas aves dependem da existência de animais mortos… ou em vias disso.

Hoje em dia, pelo menos na civilização ocidental, os abutres têm outro valor para o Homem ao funcionarem como indicador da saúde de alguns ecossistemas. Os abutres são um dos símbolos mais importantes da Natureza. Desta forma, estas aves, a par de outras grandes aves de rapina, são alvo de admiração, com a vantagem de serem facilmente observadas comparativamente a outros animais. A constatação do declínio generalizado das espécies de abutres, nos finais dos anos sessenta, deu origem a acções de grupos conservacionistas e a numerosos trabalhos de investigação, o que contribuiu grandemente para o conhecimento e valorização destas aves.

Ou seja, estas aves dependem da existência de animais mortos… ou em vias disso.

1 comentário:

ELCAlmeida disse...

Tal como chapéus, abutres hão-os muitos.
Uns assumem-se, outros acusam terceiros (é-lhes mais fácil do que se verem ao espelho) e outros vão esvoaçando, sibilinamente mas sem que os vejam e atacam quando mesnos esperam.
Pois, tal como chapéus, abutres com ou sem penas, hão-os muitos.
Kandandu
EA