O que são meia dúzia de pescadores no contexto macroeconómico de um governo que quer instituir o esclavagismo e o direito a ser proprietário dos plebeus?
O presidente da associação Pró-Maior Segurança dos Homens do Mar disse hoje que as circunstâncias do naufrágio da embarcação portuguesa "Virgem do Sameiro", nomeadamente a falta de um sistema de comunicação de emergência, "não podem passar impunes".
Na ingenuidade própria de uma pessoa de bem, José Festas julga que Portugal é um Estado de Direito e que, por isso, existe punição tanto para os responsáveis materiais como para os morais.
Está enganado. Se o assunto avançar, o máximo que se conseguirá é provar que a responsabilidade é da mulher da limpeza que, a recibos verdes, trabalha no ministério que tem a tutela desse sector.
José Festas exige, com toda a razão mas sem nenhuma força reivindicativa, que os técnicos da Direcção-Geral das Pescas expliquem porque retiraram do programa "Segurança é Viver" os rádio-balizas de localização dos barcos em situações de emergência.
"Isto não pode passar impune: nem os pescadores vão permitir, nem eu enquanto presidente da associação", prometeu o mestre.
Prometeu e é sua vontade. Mas vai perder o ânimo dentro em breve. Não por vontade própria, não por menosprezo pelos pescadores, mas porque os tubarões - que nos areópagos da alta política portuguesa decidem tudo – vão obrigá-lo a estar calado.
Como em muitas outras variantes da vida portuguesa, o Governo vai avisar que os escravos não têm direitos e que, por isso, têm de comer e calar, pouco importando se são também seres humanos.
Em declarações aos jornalistas junto às urgências do Hospital de Leiria, onde se encontram a recuperar os seis tripulantes hoje resgatados, José Festas, a pedido dos pescadores, solicitou à Comunicação Social que respeitasse "estes homens que viveram uma angústia muito forte".
Entretanto, com ar combalido e certamente com algumas migalhas nos bolsos, o secretário de Estado do Mar, Manuel Pinto de Abreu, revelou hoje que o Governo está à procura de linhas de financiamento para dotar as embarcações de pesca com sistemas de localização para situações de emergência.
Cá para mim, a procura vai continuar na esperança que os acidentes não se repitam, até porque as operações de busca ficam muito caras e podem desestabilizar o Orçamento de Estado.
Reconheço, contudo, que não falta experiência vivencial e, quiçá, pragmática deste político nas questões reais dos problemas dos pescadores. É oceanógrafo e engenheiro hidrógrafo, com o doutoramento em oceanografia física, ainda por cima na Naval Postgraduate School de Monterey, na Califórnia, licenciou-se em Ciências Militares Navais na Escola Naval no Alfeite, foi oficial imediato do navio “Limpopo” e comandante do “Dom Jeremias”, o que lhe dá algumas facilidades para procurar linhas… de financiamento.
Manuel Pinto de Abreu disse que, em 2009, o programa "Segurança é Viver" previa inicialmente uma verba de oito milhões de euros para suprir essa insuficiência, que seria garantida pelo projecto "Pró Mar". O problema, acrescentou, é que só estavam asseguradas metade dessas verbas.
Pois é. Uma chatice. Mas apenas uma pequena chatice. Desde logo porque os pescadores são gente humilde, trabalhadora e honesta, o que lhes dá todas as qualificações para serem portugueses de segunda ou, em alternativa, escravos de primeira.
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