Aquele reino lusitano
continua a não ter chuva
é o suor de outros rostos
que rega as plantações;
deixou de ter café maduro
e aquele vermelho-cereja
são gotas de outro sangue
feitas seiva.
pisado, torturado
e cada vez mais pálido
como a cor dos escravos.
aos regatos de alegre serpentear
e ao vento forte do sertão:
Quem se levanta cedo?
Quem vai à miséria?
Quem traz pela estrada térrea
a sacola cheia de fome?
recebe desdém
fuba podre, peixe podre,
panos ruins, alguns euros
e porrada se refilares?
Quem faz o governo mamar
e os ricaços florescer?
- Quem?
Quem dá dinheiro para o patrão comprar
máquinas, carros, senhoras
e cabeças de outros escravos
para aumentar os lucros?
ter barriga grande,
ter dinheiro?
os regatos de alegre serpentear
e o vento forte do sertão
responderão:
subir às tascas da vida.
Deixem-me beber até cair
e esquecer diluído
nas minhas bebedeiras.
Nota: Poema original, aqui tão mal tratado, de António Jacinto. Monangambé (o contratado, o escravo) eram angolanos negros contratados para trabalhar nas roças dos brancos, na era colonial. Hoje são portugueses brancos contratados para trabalhar nas “roças” dos brancos donos do poder.
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