Após meses de negociações, o Parlamento angolano aprovou por unanimidade a lei orgânica sobre as eleições gerais. Segundo o presidente da Assembleia Nacional, Paulo Kassoma, este resultado vem “derrubar o espectro da fraude” nas eleições previstas para o próximo ano.
Neste caso, como em muitos outros, “derrubar” significa acabar ou, apenas, ganhar tempo até que ele volte a levantar-se?
A nova legislação, aprovada pela esmagadora maioria do regime que governa Angola desde 1975, põe fim – ou derruba? - a um longo braço de ferro entre o MPLA e a oposição que julga estar no Estado de Direito.
Falta ainda aprovar os projectos de lei sobre o registo eleitoral e a monitorização das eleições, que completam este pacote legislativo, o que deverá acontecer em Janeiro… se assim entender o presidente não eleito e há 32 anos no poder.
Paulo Kassoma considerou que o resultado alcançado no Parlamento “transmite à comunidade nacional e internacional uma mensagem de plena confiança na realização de todo o processo” relativo às eleições de 2012.
Kassoma tem razão. A comunidade internacional (a nacional está mais preocupada em encontrar um prato de fuba) tem, como sempre teve e como espera continuar a ter, plena confiança num regime que continua a ser o mais corrupto da Lusofonia e um dos mais corruptos do mundo.
A lei estabelece que a Comissão Nacional Eleitoral (CNE), composta por 17 membros, é “um órgão independente que organiza, executa, coordena e conduz os processos eleitorais”, sublinhou a agência noticiosa do regime, a Angop.
Só faltava essa de alguém esperar que a lei dissesse que a CNE não era um órgão independente. Embora os conceitos de independência variem muito em Angola, a unia bitola válida é a determinada pelo regime. E se o MPLA diz que é independente… é porque é. Quem discordar estará a cometer um crime contra a segurança do Estado… ou do reino.
A UNITA tem acusado o MPLA de procurar controlar e limitar a independência da CNE, e o próprio líder, Isaías Samakuva, acusou o MPLA de ter falsificado os resultados das eleições de 1992 e 2008 e de estar a planear fazer o mesmo no ano que vem, sublinhou a Reuters.
Como todos os que procuram, dentro e fora de Angola, encontrar a verdade sabem, a máquina (política e militar) do regime bem se esforça para calar o povo. De facto e cada vez mais, o MPLA tornou-se abertamente adversário do povo, ou melhor, opressor do povo.
Basta ir para a Angola real. Os sobas, nas aldeias estão (tal como noutros tempos) acorrentados ao medo de perder o subsídio, de serem chicoteados ou presos.
Todas as condições objectivas, no sentido do controlo de recursos, estão a favor do governo – exército, imprensa, maioria no parlamento, polícia, serviço de informações, implantação dos Sinfo nas aldeias, apoio da comunidade internacional, recursos financeiros.
Para ser alguém, para viver com dignidade, o angolano tem de pertencer ao MPLA (tal como os portugueses ao PS…D). O regime é dono dos angolanos. A escravatura moderna é imposta pelos que se julgam, e até agora têm sido, os senhores feudais.
É claro que o Povo não tem força, ou não a tem tido, para derrubar o sistema. A força da sua razão é neutralizada pela razão da força de um regime que tem tudo ao seu dispor.
O regime diz agora que é nas eleições que o Povo tem de decidir. Seria um bom princípio se a democracia fosse, em Angola, democracia. Mas não é. O MPLA, avesso a surpresas, está a preparar minuciosamente o processo para esmagar qualquer adversário.
Quando a máquina estiver pronta, testada e com o certificado de qualidade exarado pela conivente comunidade internacional, então os angolanos serão chamados a votar. E, como no passado, tanto faz que votem no MPLA ou não. E tanto faz porque será sempre o MPLA a ganhar.
Embora com a certeza de que a sua máquina, construída com peças luso-brasileiras e tendo assistência do PS…D, será suficiente para reduzir a pó qualquer adversário, o MPLA joga sempre pelo seguro, mesmo que tenha de ter mais votos do que votantes recenseados.
Para o MPLA o importante é vencer, é esmagar, pouco importando se é ele que ganha ou se são os adversários que perdem.
Acresce que, mais uma vez, por falta de alternativas serão os angolanos a perder. E faltam alternativas porque os mais capazes não estão para se envolver num jogo em que as regras são ditadas pelo MPLA, em que o árbitro é o MPLA, em que a CNE é o MPLA, em que tudo é o MPLA.
É certo que, formalmente, não vão faltar candidatos. Para além de algumas pessoas ingénuas e bem intencionadas há sempre alguns que, a troco de alguma coisa, se prestam a ser figurantes numa farsa que pretende mostrar como uma ditadura é uma democracia.
Tal como nas legislativas anteriores, já se sabe quem vai ganhar, quem vai legitimar a vitória, e quem vai perder. Falta apenas saber quem serão, a nível internacional, os figurantes que no terreno vão dizer que tudo se processou com democraticidade, civismo e transparência.
Recordam-se que, no anterior simulacro eleitoral, além da falta de transparência, a informação prestada pela CNE revelou-se também incompleta e insuficiente, não explicando de onde vieram as 50.195 actas escrutinadas, quando só havia aprovado o escrutínio de 37.995? Como também não explicou a proveniência dos 10.375.000 votos, quando apenas tinham encomendado à “Valleysoft” 10.350.000 boletins de voto?
E se nessa farsa foram os Serviços de Informação (Sinfo) e a Casa Militar da Presidência angolana a controlar o processo eleitoral, aos invés da Comissão Nacional Eleitoral, no futuro será igual.
Interessante foi ver que, mesmo obrigados a comer e a calar, os observadores europeus não deixarem de verificar que, por exemplo, uma província “apresentou uma participação eleitoral de 108%” e que “não foram utilizados os cadernos eleitorais para a verificação dos eleitores no dia das eleições e como tal, não houve mais salvaguarda contra os votos múltiplos além da tinta indelével, e nenhum meio para confirmar as inesperadamente elevadas taxas de participação eleitoral”.
A Missão de Observação da União Europeia disse ainda que “houve falta de transparência no apuramento dos resultados eleitorais”, “que não foi autorizada a presença de representantes dos partidos políticos nem de observadores para testemunhar a introdução dos resultados no sistema informático nacional e não foi realizado um apuramento manual em separado”, para além de “não terem sido publicados os resultados desagregados por mesa de voto e como tal não foi possível a verificação dos resultados”.
Interessante também é recordar aos donos da verdade em Angola, que no Kwanza Norte, durante o censo eleitoral foram registados 156.666 eleitores e que, por incrível que pareça, todos os eleitores inscritos (156.666) votaram. Nem mais 1, nem menos 1. Os inscritos ao longo de aproximadamente 2 anos, estavam todos vivos, permaneceram na mesma província ou para lá se deslocaram para votar...
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