O primeiro-ministro de Portugal defendeu hoje a promoção de "relações cada vez mais estreitas" entre Portugal e Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa no âmbito da Defesa, dizendo querer construir uma "comunidade de interesses e propósitos para o futuro".
"São países com os quais queremos construir relações cada vez mais estreitas, partilhar preocupações comuns, explorar oportunidades de acção conjunta, identificar e estabelecer mecanismos práticos de cooperação, sinergética e complementar, e construir, passo a passo, uma comunidade de interesses e de propósitos para o futuro", afirmou Passos Coelho na abertura oficial do ano lectivo do Instituto de Estudos Superiores Militares (IESM).
Na sua intervenção, o chefe do Governo assinalou que actualmente "os problemas de segurança do mundo actual apelam a soluções que envolvem consensos internacionais", dedicando uma importante parte do discurso à Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e às relações de Portugal com os países que integram a organização.
Segundo Passos Coelho, de acordo com um texto do JN, "a visão universalista, cooperativa e integradora que fundou" a CPLP "poderá ter um papel importante no mundo globalizado".
Para o primeiro-ministro, esta "comunidade política, económica, social e cultural emergente" constitui, "em certa medida, um laboratório de excelência para o mundo global, gerando novos consensos e promovendo a paz, estabilidade e o desenvolvimento".
"A CPLP deve continuar a assumir, de forma progressiva, uma dimensão na área da defesa, assente num extenso e pioneiro trabalho de formação realizado a partir dos seus centros de excelência, na interoperabilidade, no reforço da capacidade de actuação em operações de paz internacionais e regionais. Enquanto novo actor internacional, deve também explorar, num processo incremental, o vasto potencial que nos oferecem os domínios das indústrias e economias conexas de defesa e da economia do mar", referiu.
Um dos princípios da CPLP diz que a organização pugna pelo “primado da paz, da democracia, do estado de direito, dos direitos humanos e da justiça social”.
Como se sabe (se calhar o governo de Lisboa não sabe) a Guiné Equatorial, que pretende entrar para a CPLP, é independente desde 12 de Outubro de 1968 e tem como presidente, desde 3 de Agosto de 1979, Teodoro Obiang Nguema.
Embora seja um dos mais infames ditadores mundiais, Obiang esteve quase a conseguir patrocinar um prémio atribuído pela UNESCO. Este é um caso, pelo menos até agora, que demonstra a existência de ditadores bons e maus, bestiais e bestas.
É, aliás, o que se passa em relação a Angola cujo presidente, não eleito, está no poder há 32 anos e que, além disso, o seu regime (no poder desde 1975) preside a CPLP.
Obiang, que a revista norte-americana “Forbes” já apresentou como o oitavo governante mais rico do mundo, e que depositou centenas de milhões de dólares no Riggs Bank, dos EUA, tem sido acusado (tal como o seu homólogo angolano) de manipular as eleições e de ser altamente corrupto, tal como o que se passa em Angola.
Obiang, que chegou ao poder em 1979, derrubando o tio, Francisco Macias, foi reeleito com 95 por cento dos votos oficialmente expressos (também contou, como em Angola, com os votos dos mortos), mantendo-se no poder graças a um forte aparelho repressivo, do qual fazem parte os seus guarda-costas marroquinos.
Gozando, como todos os ditadores que estejam no poder, de um estatuto acima da lei, Obiang riu-se à grande e à francesa quando um tribunal... francês rejeitou um processo que lhe fora intentado por recorrer a fundos públicos para adquirir residências de luxo em solo gaulês, com a justificação de que – lá como em qualquer parte do mundo - os chefes de Estado estrangeiros, sejam ou não ditadores, gozam de imunidade.
Os vastos proventos que a Guiné Equatorial recebe da exploração do petróleo e do gás natural poderiam dar uma vida melhor aos 600 mil habitantes dessa antiga colónia espanhola, mas a verdade é que a maior parte deles vive abaixo da linha de pobreza. Em Angola são 70% os pobres...
Para além de se saber que a força da Guiné Equatorial está no petróleo, se calhar sabe bem a alguns países lusófonos ser enganados por mentiras que tentam ser pela insistência uma verdade. Daí o gostarem de ver este país integrar a CPLP.
Quando questionado sobre se concordava com a adesão à CPLP de um país que é referenciado pelas organizações internacionais no que respeita à violação dos direitos humanos, o presidente moçambicano, Armando Guebuza, disse acreditar que a Guiné Equatorial vai "fazer tudo para se conformar com aquilo que são as normas na CPLP".
Normas de quê? De quem? Da CPLP? Mentir é uma coisa, gozar a inteligência dos outros é outra, por sinal bem diferente, concordem ou não José Eduardo dos Santos, Armando Guebuza ou Cavaco Silva.
Verdade é que ninguém se atreve a perguntar a Guebuza e a Cavaco Silva se acham que Angola respeita os direitos humanos ou se é possível que a presidência da CPLP seja ocupada por um país cujo presidente, José Eduardo dos Santos, no poder há 32 anos, não foi eleito.
Essa é, aliás, uma questão menor. Ou não fosse o MPLA dono de Angola, ou não fosse Angola a potência petrolífera que é, para além de ser o primeiro mercado importador de bens portugueses fora da Europa, tendo já passado os EUA.
A verdade, incómoda para os donos do poder, seja em Portugal, Moçambique ou Angola, é que a CPLP está a ser utilizada de forma descarada para fins comerciais e económicos, de modo a que empresas portuguesas, angolanas e brasileiras tenham caminho livre para entrar nos novos membros, caso da Guiné Equatorial.
Reconheça-se, contudo, que tomando como exemplo Angola, a Guiné Equatorial preenche todas as regras para entrar de pleno e total direito na CPLP. Não sabe o que é democracia mas, por outro lado, tem fartura de petróleo, o que é condição sine qua non para comprar o que bem entender.
Há quem defenda, certamente à revelia dos mais altos interesses petrolíferos, que o caso da Guiné Equatorial deveria ser alvo de uma reflexão mais profunda. Não se vê para quê.
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