Portugal espera que alguns contratos relacionados com a reconstrução da Líbia venham a beneficiar empresas portuguesas.
Nem mais. Por alguma razão e num curto espaço de tempo Portugal passou Muammar Kadafi de bestial a besta, de “líder carismático” a ditador da pior espécie.
Não admira, por isso, que Portugal queira retirar dividendos económicos do apoio político prestado ao movimento anti-Kadafi nos últimos meses.
Portugal, tal como a comunidade internacional, levou dezenas de anos a descobrir que Muammar Kadafi era um terrorista mau. Enquanto deu jeito, era terrorista... mas bom que direito até de montar a sua tenda na capital do reino, Lisboa. Seja como for, ao pôr – mais uma vez – a razão da força acima da força da razão, Portugal mostra que uns são filhos e outros enteados dos enteados. Tudo depende de estar ou não no poder.
O secretário-geral da Liga Árabe, Amr Moussa, disse no passado dia 21 de Março uma verdade que, por o ser, não agradou aos donos do mundo, no caso da Líbia os EUA e os seus aliados.
De facto, tanto quanto é público, a ONU concordou apenas com a criação de uma zona de exclusão aérea na Líbia e não, como está a acontecer, com o bombardeamento de civis (presume-se que maus) para proteger civis (bons).
Sabe-se que, segundo as regras internacionais, além de terroristas bons e maus, há também civis bons e civis maus. Será com certeza por isso que os EUA e os seus aliados europeus, com a França e a Grã-Bretanha à cabeça, consideram bons todos aqueles que estão contra aquele que, até há bem pouco tempo, era considerado por José Sócrates, então primeiro-ministro de Portugal, um “líder carismático”.
Com alguma visível dificuldade em sustentar a estratégia de ataque à Líbia, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, defendeu, no Cairo, que a comunidade internacional devia falar a uma só voz sobre a questão.
"É importante que a comunidade internacional fale a uma só voz para aplicar a segunda resolução do Conselho de Segurança da ONU”, disse Ban Ki-moon, numa referência ao texto que autorizava uma acção militar para impedir o que, afinal, está em parte a ser feito pelas forças internacionais.
O secretário-geral da ONU, que realiza uma visita à sede da Liga Árabe no Cairo, acrescentou que "medidas fortes e decisivas" só foram possíveis graças ao apoio da organização pan-árabe, a 12 de Março, à imposição de uma zona de exclusão aérea sobre a Líbia.
Ban Ki-moon não explica, nem pode explicar, como é que a imposição da tal zona exclusão aérea se enquadra numa visível actuação de guerra com o único objectivo de acabar com Muammar Kadafi.
É, contudo, estimulante ver como Portugal monitoriza as sanções contra Kadhafi, sabendo-se aliás da admiração (que em nada honrou o líder líbio) que até há bem pouco tempo o Governo português tinha pelo coronel que há dezenas de anos põe a razão da força acima da força da razão.
Seja como for, na sua constante procura de visibilidade, Portugal vai somando êxitos, mesmo quando (como acontece quase sempre) deixa a coluna vertebral ou no Largo do Rato ou na Rua de São Caetano e, de cócoras e mão estendida, vai pedindo ajuda por esse mundo, seja à Venezuela, à Tunísia, à Líbia ou a Angola.
Consta que, por deficiência de tradução, quando Muammar Kadhafi soube que Portugal iria presidir ao comité das sanções contra a Líbia até ficou satisfeito, devido à grande amizade que mantinha com o “líder carismático” do então governo português.
Muammar Kadhafi julgou que se tratava de um comité contras as sanções. Quando lhe explicaram que era ao contrário, o líder líbio ficou incrédulo e comentou baixinho: “esperava tudo menos isso do meu querido amigo José Sócrates”.
Diz-se, aliás, que uma lágrima socialista correu pela cara de Muammar Kadhafi enquanto olhava para uma foto onde os dois juravam amor eterno...
Recorde-se que os países do Norte de África, segundo o governo socialista, eram para Portugal uma prioridade política e económica. Quem o disse foi José Sócrates, num discurso na capital da Tunísia em 22 de Março de 2010. E agora?
José Sócrates, que nessa altura discursava na cerimónia de encerramento do Fórum Económico Luso-Tunisino, esforçou-se por fazer passar a ideia de que a política externa portuguesa e a diplomacia económica tinham na Tunísia, em Marrocos, na Líbia e na Argélia uma nova prioridade.
O primeiro-ministro da altura justificou: “que fique claro a toda a opinião pública portuguesa que Portugal atribui à relação com os países do Norte de África uma prioridade política indiscutível”.
“É altura para vos dizer que queremos transformar o Norte de África, e a Tunísia em particular, numa prioridade para a nossa economia”, disse há pouco mais de um ano o então primeiro-ministro, reiterando a confiança do Governo português “numa economia que tem ambição e que quer ser uma economia moderna e aberta”.
E agora? Agora mudaram as moscas mas o resto mantém-se. A tal ponto que Portugal começa a lamber as botas aos novos potenciais ditadores, mantendo igual procedimento junto dos que ainda continuam no poder.
Tudo, é claro, a bem de um reino que caminha a passos largos para ser o mais desenvolvido e pujante do norte… de África.
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