quinta-feira, setembro 29, 2011

Se Angola fosse um Estado de Direito…

Diz o órgão oficial do regime angolano, o Jornal de Angola (JA), que “Angola já foi um país ocupado por forças estrangeiras”. Tem razão. Os cubanos e soviéticos eram uma força de ocupação estrangeira.

“Mas se por hipótese hoje Angola fosse a Líbia, o país estava novamente a atravessar um período de grande instabilidade e perturbação. Mas como o tempo não recua, Luanda é uma cidade livre e Tripoli está a ser palco de confrontos fratricidas entre líbios”, diz o órgão oficial do MPLA.

Tem, mais uma vez, toda a razão. Como Angola não é a Líbia, embora José Eduardo dos Santos seja uma cópia de Muammar Kadafi, de quem aliás era íntimo amigo, ainda falta algum tempo até que o Povo derrote o ditador.

“Se Angola fosse a Líbia, estava a ser cercada militarmente e bombardeada por uma aliança militar e submetida a todos os outros membros dessa organização bélica, que tinham escolhido para presidente de um qualquer CNT um “rapper” com nome de oxigénio, devidamente ajudado por outro com apelido de marechal”, diz o JA do alto da sua cátedra de correia de transmissão de um regime que colocou o país no topo do mais corruptos do mundo.

Mas é bom registar as afirmações do JA. Desde logo porque, como sempre acontece nas ditaduras, ainda vamos ver os mesmos protagonistas embandeirar em arco quando Eduardo dos Santos passar de bestial a besta.

“Se Angola fosse a Líbia, continua o JA, a esta hora as grandes petrolíferas estrangeiras estavam a roubar milhões de barris de petróleo por dia de Angola, antes que a resistência dos angolanos os impedisse de continuar o roubo. E os aviões da aliança, com a carta branca da Organização das Nações Unidas, estavam a despejar bombas sobre as nossas cidades, para proteger os civis do CNT”.

O pasquim, dirigido por José Eduardo dos Santos através dos autómatos José Ribeiro e Filomeno Manaças, esquece-se que Angola rouba milhões de barris de petróleo por dia ao povo da sua colónia de Cabinda. Mas lá chegará a altura em que os angolanos os vão ver fora do pedestal.

“Se Angola fosse a Líbia não havia partidos políticos nem liberdade de imprensa e muito menos eleições democráticas. A bela Constituição da República de Angola era rasgada na Praça da Independência, donde já tinham tirado o monumento a Agostinho Neto, aos gritos e com raiva para as câmaras de televisão mundiais repetirem de hora a hora de maneira interminável”, escreve o órgão do MPLA na senda do seu irmão Pravda, que foi o principal jornal da União Soviética e um órgão oficial do Comité Central do Partido Comunista da União Soviética entre 1918 e 1991.

Falar de democracia e de liberdade de imprensa num país que têm um presidente da República há 32 anos no poder, sem nunca ter sido eleito, que têm 68 por cento de gente a viver na miséria, e que trata os jornalistas não afectos ao regime como inimigos, é o mesmo que dizer que os rios nascem no mar.

“Se Angola fosse a Líbia este jornal não circulava e os seus jornalistas não se atreveriam a escrever estas verdades porque eram logo massacrados como estão a massacrar os negros em Tripoli e outras cidades líbias “libertadas” pela aliança militar”, considera o Pravda de Luanda.

Importa dizer, desde logo porque nem todas fomos  (pelo menos por enquanto) comprados pelo regime, que o JA não tem jornalistas ao seu serviço. Tem, apenas isso, funcionários do partido que escrevem o que lhes mandam e que, em muitos casos, não assinam os textos porque ficaria mal em vez do nome colocar a impressão digital.
  
“Se Angola fosse a Líbia, estávamos de novo a sofrer as investidas militares de regimes estrangeiros aliados a uma frente de oportunistas e intriguistas que procuram ignorar quem combateu e deu tudo pela concórdia e harmonia entre os angolanos”, afirma o órgão de propaganda do regime.

 Por regra, o JA sente um orgasmo especial em atacar os poucos jornalistas portugueses que ainda não foram comprados pelo regime angolano.

Tem, obviamente, todo o direito de o fazer. Para o pasquim do MPLA, “os órgãos de comunicação social portugueses, salvo raras excepções, em vez de reflectirem a realidade portuguesa e europeia, andam entretidos a intrometer-se na política angolana”.

Ainda bem que o JA esclarece o âmbito em que devem actuar os media portugueses. Ficam assim a saber que podem falar de Angela Merkel mas que, pelo contrário, não devem ousar escrever sobre o mais lídimo e sublime representante de Deus na terra, de seu nome José Eduardo dos Santos.

Diz o JA, reflectindo aliás a velha cartilha dos tempos (mesmo hoje a diferença é pouca) do partido único, que “os mentores desses exercícios de colonialismo retardado têm a mesma origem de sempre mas deixam de fora o rabo de quem lhes paga os disparates sem sentido.”

Neste aspecto, reconheço, o JA tem toda a razão. Não fala do colonialismo angolano praticado em Cabinda porque, presumo, considera que Cabinda não pertence a Angola. Quanto ao rabo, é verdade que no caso do Jornal de Angola tal não se aplica… embora ainda se notem as marcas.

Diz o JA que o  “Diário de Notícias” é hoje “um boletim ao serviço de quem dá mais”, revoltando-se contra o facto de o DN “dizer que o presidente José Eduardo dos Santos está no poder há 32 anos, sendo altura de sair”.

Acrescenta o órgão oficial do MPLA: “Se um jornal angolano escrevesse um editorial a sugerir que o presidente Cavaco Silva não se candidatasse ao segundo mandato porque foi dez anos Primeiro-Ministro e fez mais cinco na Presidência, o alarido em Lisboa era tal que até a Ponte 25 de Abril vinha abaixo, como já caiu fragorosamente a revolução dos capitães”.

Brilhante. Esquece-se o JA que, ao contrário do reino do seu mentor, Cavaco Silva - seja como primeiro-ministro ou presidente – sempre foi eleito. Eu sei que a democracia “made in MPLA” não implica, antes pelo contrário, que seja necessário haver eleições. Aliás, não faria sentido eleger quem é o divino representante de Deus…

“Se em Angola algum órgão de informação ousasse escrever que Alberto João Jardim não deve concorrer a um novo mandato de presidente do Governo Regional da Madeira, o alarido em Lisboa era tal que o edifício da Caixa Geral de Depósitos ruía, como está em ruínas o sistema financeiro europeu e a Zona Euro ameaça derrocada”, diz e muito bem o boletim oficial do regime.

Esquece-se, mais uma vez, que também Alberto João Jardim foi eleito, ao contrário do sumo pontífice do MPLA,  que está no poder há 32 anos sem nunca ter sido eleito.

“O Presidente José Eduardo dos Santos não governa há 32 anos. Ele é o líder de um povo que teve de enfrentar de armas na mão a invasão de exércitos estrangeiros e os seus aliados internos”, escreve o JA, repescando as regras dos áureos tempos em que se impunha que o povo é o MPLA, o MPLA é o povo.

“José Eduardo dos Santos foi o líder militar que derrubou o regime de “apartheid”, o mesmo que tinha Nelson Mandela aprisionado. José Eduardo dos Santos só aceitou depor as armas quando a Namíbia e a África do Sul foram livres e os seus líderes puderam construir regimes livres e democráticos”, recorda com a sua habitual perspicácia o JA.

Penso que, neste aspecto, bem poderia ser menos modesto. É que foi graças a José Eduardo dos Santos que Portugal adoptou a democracia, que a escravatura foi abolida, que D. Afonso Henriques escorraçou os mouros, que Barack Obama foi eleito e que os rios passaram a correr para o mar…

“Os media portugueses pelo menos deviam reconhecer o que José Eduardo dos Santos tem feito para que os portugueses não vão ao fundo com a crise. Eles mais do que ninguém deviam propor o seu nome para Prémio Nobel da Paz”, salienta com raro sentido de oportunidade o Jornal de Angola.

Tem, mais uma vez, razão. A Oferta Pública de Aquisição lançada pelo regime angolano (que é o mesmo que dizer MPLA ou José Eduardo dos Santos) sobre Portugal está a ter êxito, calculando-se por isso que o reino lusitano não tarde a ser mais uma das províncias de Angola.

Também concordo que Eduardo dos Santos merece o Prémio Nobel da Paz. E, já agora, o Jornal de Angola merece – no mínimo – o Prémio Pulitzer.

Fotos: Uma empresa da França e outra do Mónaco juntaram as mãos para construir este iate com 58 metros de comprimento e 38 metros de largura para Isabel dos Santos, filha do Presidente Eduardo dos Santos.

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