O líder do MPLA (partido que governa Angola desde 1975), presidente da República de Angola (não eleito e há 32 anos no cargo) e chefe do Governo, José Eduardo dos Santos, de há muito que não brinca em serviço.
Não brinca em serviço mas, isso sim, adora brincar com os angolanos e com todos aqueles que vai comprando por esse mundo fora.
Quando no dia 7 de Dezembro de 2009 exortou os suas súbditos a "não pactuar com a corrupção e com a apropriação de meios do erário público ou do partido", mostrou como é fácil e barato enganar meio mundo.
O tempo vai passando e tudo continua na mesma, e até os mais optimistas e ingénuos começam a pensar que nem as moscas mudam. E se os mais cépticos perguntam o que é que andaram a fazer durante 36 anos, os mais realistas continuam a fazer contas com o dinheiro que passa por baixo da mesa.
Recordo que nesse dia, numa intervenção sistematicamente interrompida pelos aplausos dos mais de 3.000 delegados ao VI Congresso, num visível e marxista culto da personalidade do chefe, José Eduardo dos Santos deixou um lote recheado de recados para o MPLA, para o país e para o mundo ver.
Recorde-se, contudo, que o chefe do partido para o qual manda recados é ele próprio há dezenas de anos, tal como o é do país. Mais uma vez, a política é a de sempre: olhai para o que eu digo e não para o que eu (e os meus amigos) faço.
Tiveram, aliás, bons mestres. E se tiverem dúvidas, não quanto à corrupção mas à forma de a camuflar, basta pedirem umas lições aos velhos ou novos professores portugueses.
"Hoje é voz corrente equiparar a pessoa investida em funções políticas a um homem sem palavra, desonesto e sem escrúpulos. É necessidade absoluta assumir atitudes positivas que desfaçam essa imagem pálida e inconveniente de forma a dar credibilidade, valorizar e repor a nobreza da função dos dirigentes políticos".
Não, não foi José Sócrates, Passos Coelho, Paulo Portas, Francisco Louçã, Jerónimo de Sousa ou até Cavaco Silva quem fez esta afirmação, embora ela retrate o que se passa no reino lusitano.
Quem o disse foi o soba de um outro reino, no caso Eduardo dos Santos.
José Eduardo dos Santos sublinha que o partido "tem dito isto por outras palavras" e adverte que "as nossas palavras e promessas devem corresponder aos actos que praticamos".
Uma treta semelhante ao que se passa em Portugal. Treta para enganar os cerca de 70% de angolanos que vivem na pobreza, 36 anos depois da independência e nove após a paz ter regressado ao país, tal como em Portugal é usada para enganar os para já 800 mil desempregados, os 20% que vivem (isto é...) na miséria e os outros 20% que a têm à porta de casa.
Eduardo dos Santos pede o "fim da intriga, dos boatos e a manipulação de factos na comunicação social para prejudicar os outros".
Bem me parecia que em Angola, como em Portugal, a comunicação social é a fonte de todos os males. Foi ela, a comunicação social independente, que forçou o MPLA a reconhecer a corrupção e outras grandes enfermidades, e é exactamente por isso que é a culpada de tudo.
"Devemos aperfeiçoar o modo de encarar a política, um modo pró-activo e rigoroso de mostrar o nosso empenho e dedicação que sirva para mobilizar milhões para a nossa causa", diz Eduardo dos Santos, certamente depois de ter tido num só dia o que milhões de angolanos não têm durante muitos dias: refeições.
O presidente da República e do MPLA disse também que "em cada 100 angolanos, 60 são muito pobres, não conseguem comer normalmente todos os dias, não têm acesso fácil a água potável, acesso aos cuidados de saúde nem casa normal para se abrigar".
É preciso ter lata. O MPLA está no poder há 36 anos, Angola está em paz há nove anos, e mesmo assim o dono do país não assume que é ele o principal, em muitos casos o único, responsável por este descalabro.
O "desemprego, o analfabetismo e a pobreza são três problemas muito graves e difíceis de resolver, que atingem especialmente as mulheres, as famílias e as crianças", disse Eduardo dos Santos (o mesmo poderia, aliás, ser dito pelo seu amigo Paulo Portas) em mais uma manifesta enciclopédia de hipocrisia que, contudo, foi aplaudida pelos súbditos de sua majestade.
Certamente anestesiado pelas ovações dos seus vassalos, José Eduardo dos Santos disse também que o MPLA pugna desde 1975 “pela defesa das liberdades direitos e garantias dos cidadãos, e considera o direito à associação como fundamental". Foi mais um atestado de menoridade passado aos angolanos. Mas como foi dito pelo chefe... foi aplaudido.
Para os problemas que persistem no país, como a pobreza, José Eduardo dos Santos, retomou a evocação da "pesada herança do colonialismo" que foi "agravada pelo período de guerra que o país viveu" até 2002.
Nisto tem razão. Se tantos anos depois da conquista da democracia os portugueses continuam também a desculpar-se com a pesada herança do salazarismo, é legítimo que o MPLA acuse o colonialismo, um bode expiatório que aguenta ainda ser utilizado aí por mais uns trinta anos.
1 comentário:
A dignidade do MPLA parte fundamentalmente do respeito pela sua
historia,pelo seu povo,pelas elites que dão escopo a nação,pelos simbolos
vivos e todos aqueles que ajudaram a erguer este patrimonio.
Naõ esquecendo e tendo que preocupar-se com os descendentes dos fundadores dos partidos mais importantes.
Deveria existir a semelhança das estruturas criadas para certas entidades também deveriam preocupar-se com os familiares daqueles que são e foram a base e o suporte da grandiosidade e margem de liberdade que uns usufruem.
É vergonhoso que numa Angola tão grande os filhos daqueles que contribuiram para o nacionalismo Angolano e africano tenham que depender do subsidios de sobrevivência e todo tipo de humilhações caucionados intencionalmente por pelas entidades desses paises.
É altura de se saber a verdade sobre algumas pessoas responsaveis que participaram directamente no estrangulamento e no prejuizo da dignidade e no equilibrio de algumas familias dos fundadores dos partidos mais importantes.
Enviar um comentário