De vez em quando, embora na presente altura prevaleça o benefício da dúvida, os responsáveis portugueses resolvem falar de corrupção. Quase sempre, neste como em outros assuntos, apenas mudam as moscas…
Os portugueses são, na generalidade e em teoria, contra a corrupção, mas no dia-a-dia "acabam por pactuar" com "cunhas" e situações de conflito de interesses.
Esta é, aliás a conclusão dos autores de um livro lançado no Porto no dia 21 de Dezembro de… 2008.
Apesar dessa conclusão, continuo sem saber como é que se pode ser contra algo que, em sentido lato, já é uma “instituição” secular?
E ainda eu tenho a lata de criticar a corrupção em Angola, quase esquecendo que os poderosos donos da minha terra aprenderem (e se calhar até já são melhores) com os mestres portugueses...
"No nível simbólico, abstracto, toda a gente condena a corrupção, tal como no resto da Europa, mas no nível estratégico, no quotidiano, as pessoas acabam por pactuar com a corrupção, até nos casos mais graves, de suborno", disse o politólogo Luís de Sousa, co-autor, com João Triães, do livro "Corrupção e os portugueses: Atitudes, práticas e valores".
Luís de Sousa dava como exemplo o primeiro lugar registado por Portugal no indicador de um estudo relativo aos contactos que as pessoas assumem ter "para conseguir benefícios ou serviços a que não têm direito".
Não sei o que se chamará ao facto de quando alguém se candidata a um emprego lhe perguntarem a filiação partidária. Será corrupção? E quando dizem que “se fosse filiada no partido teria mais possibilidades”? Ou quando se abrem concursos para cumprir a lei e já se sabe à partida quem vai ocupar o lugar?
O livro foi apresentado por Paulo Morais, ex-vice-presidente da Câmara do Porto, que afirmou que a obra confirma que "os portugueses são algo permissivos" relativamente à corrupção, o que considera ser uma herança da "lógica corporativa do tempo de Salazar".
Se o cidadão anónimo é permissivo por ter sido influenciado pela "lógica corporativa do tempo de Salazar", quem terá influenciado os políticos, os administradores, os banqueiros, os gestores, os patrões que gerem o país?
"A estrutura de poder actual é, basicamente, a estrutura de poder do doutor Oliveira Salazar. É uma estrutura que se mantém e nos asfixia", disse Paulo Morais, realçando que, enquanto perdurar esta lógica, "os grandes interesses ficam na mão do grande capital".
E quem tem força para contrariar o sistema sem, quando der por isso, estar enredado dos pés à cabeça, encostado à parede, com a vida (para já não falar do emprego) em perigo?
O livro, com prefácio de Maria José Morgado, está dividido em cinco capítulos, dos quais o primeiro apresenta uma sinopse dos principais resultados do projecto "Corrupção e Ética em Democracia: o Caso de Portugal", que visou "caracterizar o ambiente ético em que opera a democracia portuguesa".
Julgo, aliás, que nesta matéria as similitudes entre Portugal e Angola são mais do que muitas. Afirmar que os níveis de corrupção existentes em Angola superam tudo o que se passa em África, conforme relatórios de organizações internacionais e nacionais credíveis, é uma verdade que a comunidade internacional, Portugal incluído, reconhece mas sem a qual não sabe viver.
Aliás, basta ver como as grandes empresas, portuguesas e muitas outras, investem forte no clã Eduardo dos Santos como forma de fazerem chorudos negócios... até com limpa-neves.
Com este cenário, alguém se atreverá a dizer ao dono do poder angolano, José Eduardo dos Santos, que é preciso acabar com a corrupção? Alguém se atreverá a dizer a Cavaco Silva e Pedro Passos Coelho que ou Portugal acaba com a corrupção ou a corrupção acaba com Portugal?
Creio, contudo, que a corrupção pode ser uma boa saída para a crise portuguesa. Isto porque, como demonstraram os empresários portugueses e angolanos, é muito mais fácil negociar com regimes corruptos do que com regimes democráticos e sérios.
Nesta altura a diferença está no facto de Angola ser um país rico e Portugal ser um rico país em… lixo. Por alguma razão, sendo Angola o sexto maior fornecedor petrolífero dos Estados Unidos da América, ninguém verá Hillary Clinton olhar para os caixotes do lixo de Luanda dos quais se alimentam muitos e muitos angolanos.
Sendo que o caminho certo se define não em função da luta contra a corrupção mas, é claro, dos interesses económicos, Portugal só tem que continuar a estratégica luta encetada (honra lhe seja feita) por José Sócrates no sentido de fazer com que o país se torne o mais evoluído do norte de… África.
Quanto ao povo, Lisboa deve seguir mais uma vez o exemplo de Luanda. Ou seja, pôr os portugueses nas Novas Oportunidades a aprenderem a viver sem comer.
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