Cristiano Ronaldo, Madonna, Lady Gaga, Beyoncé e Elton John são algumas das celebridades que se associaram a uma campanha de luta contra a fome no Corno de África.
Quando, no dia 11 de Junho de 2009, o Real Madrid ofereceu ao Manchester United 93 milhões de euros pela transferência de Cristiano Ronaldo, ficou a saber-se que mais de 200 milhões de crianças continuavam a ser forçadas a trabalhar diariamente no Mundo.
Hoje, a ONU estima em mais de 12 milhões o número de pessoas no Corno de África ameaçadas e aponta a necessidade de uma ajuda de 1600 milhões de euros.
De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), "três em cada quatro desses 200 milhões de menores estão expostos às piores formas de exploração laboral".
No entanto o mundo parou porque, isso sim, estavam em cima da mesa (não sei se algum passou por baixo) os 93 milhões de euros que o Real Madrid oferecera ao Manchester United.
Isso é que era relevante. O facto de três em cada quatro crianças e adolescentes que trabalham estarem expostas às piores formas de exploração laboral infantil (tráfico humano, conflitos armados, escravatura, exploração sexual e trabalhos de risco, entre outros), ficou fora de jogo.
Segundo a OIT (que, obviamente, não analisa a transferência de Cristiano Ronaldo), era (como é e será) de salientar os desafios no combate ao trabalho infantil, sobretudo aquele tipo de trabalho que envolve raparigas, discutir o impacto que a crise económica mundial pode ter no agravamento deste flagelo, bem como enfatizar o papel fundamental da educação na solução do problema.
No entender da OIT, a "abolição efectiva" da exploração laboral das crianças - que "são privadas de direitos básicos, como educação, saúde, lazer e liberdades individuais" - é um "dos maiores e mais urgentes desafios do nosso tempo".
Nada disso. Urgente é debater o Campeonato do Mundo de Futebol ou algo semelhante.
A expansão do acesso ao ensino básico, com muitos países a eliminaram as propinas escolares, a implementação de programas de transferência social e uma maior participação dos Governos, que estão a ratificar as convenções da OIT sobre o trabalho infantil, são alguns dos progressos mundiais mencionados pela organização.
Entretanto nas ocidentais praias lusitanas, pela mesma altura, o Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, subscreveu afirmações das “gentes do mundo do futebol” de que se ultrapassaram os “limites razoáveis” na transferência de Cristiano Ronaldo para o Real Madrid mas desejou felicidades ao jogador.
Mero exercício de hipocrisia. Isto porque, como sabe Cavaco Silva e Pedro Passos Coelho, a população portuguesa (sobretudo os cidadãos de segunda classe, todos os que, como nos velhos tempos) alimenta-se de Fátima, do Fado e do Futebol.
“Acompanho aquilo que foi dito sobre esta matéria. Pagar quase 100 milhões de euros pela transferência de um jogador, nunca me passou pela cabeça”, afirmou na altura Cavaco Silva em Nápoles, Itália, à margem do encontro dos Chefes de Estado do Grupo de Arraiolos.
É pena que não passe pela cabeça dos responsáveis, seja de Portugal ou de qualquer outro país. Depois não nos venham dizer que é crime a plebe sair à rua e fazer justiça pelas suas próprias mãos.
“Gostaria que Portugal fosse mais conhecido pela inovação, pela modernização e pela sua competitividade”, acrescentou Cavaco Silva.
Pois é. Também os 800 mil desempregados que (sobre)vivem em Portugal gostariam. Mas como não é isso que acontece, um dias destes resolvem não mudar de país mas, isso sim, mudar de políticos... nem que para tal tenham de ressuscitar, ou apoiar, um qualquer António de Oliveira Salazar.
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