domingo, dezembro 10, 2006

Aborto? Não, Obrigado! (parte II)

«Confesso que para mim foi uma desilusão este seu post. Sempre me pareceu defensor das liberdades. E a comparação da interrupção da gravidez com o roubo de carros foi de cortar a respiração»; escreve num comentário (inserido no local próprio mas que agora repesco e comento) ao texto anterior, alguém que assina MN.

1 – Por ser defensor das liberdades é que assumo a defesa de quem não o pode fazer de modo próprio. Ou seja, o filho ou filha que começa a dar os primeiros sinais de vida dentro da Mãe. Por ser defensor das liberdades é que estou do lado dos que não têm voz.

2 – Ainda bem que o exemplo do roubo de carros foi de cortar a respiração. Talvez um dia se lembre dele quando for pai ou, talvez, avô.

«Numa sociedade livre não deveriam ser os pais, ou o casal progenitor, aqueles que gerem o orçamento familiar, que decide se naquela altura da vida de ambos têm ou não condições e estabilidade (económicas, psicológicas) para avançar com algo tão importante como gerar um ser?».

3 – Se o exemplo do roubo dos carros é de cortar a respiração, este de colocar no mesmo prato da balança do orçamento familiar, um filho e a compra de uma televisão (por exemplo) não deixa de ser curioso.

«Respeito a sua opinião mas discordo visceralmente. Sempre me pareceu que se batesse por valores de esquerda e liberais, afinal é tão defensor de uma Angola livre, onde os angolanos pudessem fazer as suas escolhas. Parece-me que neste caso defende uma lei bastante opressora, diria mesmo ditadora. Como se eu ou o Sr. Orlando Castro (de quem eu tenho em muita estima) tivéssemos o poder ou a competência para ditar leis de falsos moralismos que atiram casais para a criminalidade.»

4 – Essa coisa de se ter a ideia de que só a Esquerda defende valores da solidariedade e da dignidade não passa de um complexo. Veja-se que a Esquerda está de uma forma geral do lado dos mais fortes, dos que podem decidir. E quem defende os oprimidos, os que por circunstâncias diversas morrem à fome em Angola (enquanto a Esquerda governa) ou que morrem por causa de um aborto?

«Sabemos que existem métodos contraceptivos eficazes (99%) e também sabemos que existe muita informação, mas mesmo assim acontecem acidentes. Vejamos caso a seguir: Você tem 19 anos, vai para fora do seu pais estudar com grandes ambições e muitos planos, aluga um quarto perto da faculdade e divide a casa com uma rapariga que, mais tarde, se torna sua parceira. Um dia surge um frúnculo na axila da sua parceira, faz febre e tem dores, vai a uma urgência e é medicada com antibiótico, o médico que prescreve a receita não adverte que o antibiótico corta o efeito da pílula. Resultado??? Surge uma gravidez indesejada num casal que trabalha para pagar as propinas da faculdade e que vive com carências, numa casa alugada pelos pais que estão em Angola.»

5- Este exemplo é com certeza uma excepção e o que importa é a regra. Mas vamos ao exemplo. O médico que errou ao não alertar para os efeitos do antibiótico passa na história como se nada fosse. Ninguém o vai chatear. A gravidez dificulta a vida do casal que vive com carências. E porque a sociedade não tem, nem quer ter, responsabilidades de solidariedade para com o jovem casal, qual é a solução? Fazer a corda partir pela parte mais fraca. Como sempre. Ou seja, pela filho que, aliás, não tem direitos.

«Como este “acidente” não foi planeado, e como ambos não tinham a certeza de que a relação tinha futuro e porque não se trás um ser ao mundo por “acidente”, sem ter condições para oferecer um lar (pai, mãe, amor, um tecto e comida) decidem abortar, porque acham que eles têm esse direito. Procuram ajuda médica adequada em vários centros mas a resposta é sempre a mesma: É ILEGAL, DIRIJAM-SE A ESPANHA!!! Explicam como ocorreu a gravidez e a resposta é: TEMOS PENA, É ILEGAL DIRIJAM-SE A ESPANHA!!! Conclusão: Falta-se as aulas, fazem-se umas horas extras para ter dinheiro e ir a Espanha pagar 600,00€ por um aborto.»

6 – Quem falou de acidente, mesmo que entre aspas, foi o leitor. Eu sei que é um drama. Mas, como em qualquer acidente, há sempre responsáveis. Se não há, devia haver. Mas como é mais simples, reconheço, atirar o lixo para debaixo do tapete, opta-se pela forma mais simples e mais cobarde. Castigar quem não tem direito de defesa. Se a nossa sociedade só fosse constituída por filhos “programados”, por filhos “feitos” à luz das condições essenciais de vida, certamente teríamos muito poucos habitantes.

«Entramos em colisão com o sistema e com os nossos valores morais porque, acredite, não se toma essa decisão de ânimo leve. Não se faz por prazer como os do “NÃO” querem fazer crer.»

7 – Eu também não digo que o façam por prazer. Digo que o fazem por cobardia da sociedade e das partes (onde me incluo) envolvidas. Da sociedade que apenas quer dar o peixe porque é mais simples e cómodo do que ensinar a pescar.

«Pergunto: Sou criminoso??? Deveria um de nós (ou ambos) interromper os estudos e todos os planos, todas as esperanças dos pais que estão em Angola e que investem as poupanças nos filhos para trazer ao mundo e sustentar essa criança??? Deveria trazer essa criança ao Mundo e entregar aos cuidados do estado que não permite o aborto??? Deveria trazer essa criança ao Mundo e entregar ao cuidado do médico que receitou o antibiótico? Talvez devesse trazer essa criança ao Mundo e entrega-la ao cuidado de todos aqueles que são a favor do NÃO a interrupção da gravidez.»

8 – Se é ou não criminoso, nesta matéria, é uma questão de consciência que muitas vezes ao olhar para o espelho saberá a resposta. Uma coisa importa reter, você e todos os outros que pensam da mesma maneira estão a usar um direito que negam a alguns. O direito à vida. Se mesmo assim, quando olha para os seus pais ou quando olha para dentro de si entende que fez bem, não há nada a fazer. Quem já nasceu tem esse privilégio.

«Que faria se a sua filha de 15 anos aparecesse grávida do namorado de 16? Você cometia o crime de hipotecar o futuro desses 3 seres, dois jovens na puberdade e um bebe fruto de uma paixão de quem está a conhecer e a explorar o corpo humano agora? Por favor deixem-se de falsos moralismos e votem SIM!!!».

9 - O que chama de falsos moralismo é para mim uma questão de honra. Honra de um Pai de três filhos e de um Avô de uma neta. Honra por ser a favor da vida, honra por não querer para os outros o que não quero para mim. Um filho, mesmo que não programado, mesmo que fruto de uma paixão de dois jovens na puberdade, nunca hipoteca o futuro. Pelo contrário. Essa é a diferença entre o “sim” e o “não”.

3 comentários:

Anónimo disse...

"5- Este exemplo é com certeza uma excepção e o que importa é a regra. Mas vamos ao exemplo. O médico que errou ao não alertar para os efeitos do antibiótico passa na história como se nada fosse. Ninguém o vai chatear. A gravidez dificulta a vida do casal que vive com carências. E porque a sociedade não tem, nem quer ter, responsabilidades de solidariedade para com o jovem casal, qual é a solução? Fazer a corda partir pela parte mais fraca. Como sempre. Ou seja, pela filho que, aliás, não tem direitos."

É uma excepção não comportada de uma lei cega, surda e muda que condena pessoas a penas de prisão. Conheço outras tantas, quando quiser posso conta-las aqui.

M.N

Anónimo disse...

Quando a necessidade é maior que a moral tomam-se medidas das quais a gente não se revê em circunstâncias normais.
Eu sou objecto da minha consciência e como tal, quem se vê obrigado a este tipo de intervenções não, como já disse, faz de ânimo leve.

Passados alguns anos ainda carrego a angustia do que fiz dentro de mim. Mas “Only God can judge me”. Não precisamos de ser obrigatoriamente criminosos! Não precisamos de mais culpa do que aquela que já sentimos, não precisamos de mais estigma do que aquele que auto infligimo-nos.

Também eu sou defensor da vida, (VIDA no sentido real porque há muita gente viva sem vida) e como exemplo, se calhar vai achar um antagonismo, não sou a favor da pena de morte em circunstância nenhuma mas sou a favor da eutanásia (entrando momentaneamente noutro campo) porque a vida é poder usufruir dela, se não nada vale.

“Se o exemplo do roubo dos carros é de cortar a respiração, este de colocar no mesmo prato da balança do orçamento familiar, um filho e a compra de uma televisão (por exemplo) não deixa de ser curioso”

Não estará a dramatizar em demasia? O Sr. escreve bem, tem o Dom da palavra como bom jornalista que é! Tendenciosamente utiliza-a de forma a dar vida a um drama para o seu lado. Deturpa o que eu disse, inconscientemente ou não, quando traduz orçamento no simples acto da compra de uma televisão.

Para si que tem a barriga cheia (não entenda como ofensa ou como hostilidade essa expressão) e tem onde morar, tem um rendimento mensal que pôde, minimamente ou não, educar e dar um lar digno aos seus 3 filhos (fico feliz por si), é fácil de falar!
Lembrasse da sua mocidade?
O nosso tempo é bem diferente Sr. Castro. E não foi por uma televisão que ambos tomamos a decisão de interromper. Foi por um motivo bem maior! O bem-estar de uma futura criança. Porque a responsabilidade de lhe dar um lar, boa educação, comida, assistência médica e tudo a que a criança tem direito está directamente relacionada com o ORÇAMENTO e não com a compra de uma TV Sr. Castro.
Poderia tomar isso como um insulto mas não o vou fazer porque, como disse anteriormente, tenho-o em muito boa estima e consideração, poderá ter sido interpretado dessa forma inconscientemente.
(O discurso de Isaías Samakuva teve duas interpretações diferentes, ao Kwata Kanawa e ao MPLA soube melhor, e foi conveniente, uma delas.)

Reconheço que é vil falar de interrupção de gravidez por causa de um orçamento mas para alguns faz a diferença.

Por causa de orçamentos encerram-se maternidades! Por causa de orçamentos encerram-se escolas!

Eu digo SIM ao aborto, não como medida contraceptiva mas pelo bem-estar do futuro ser e dos pais.
Que sejam eles a decidir quando e como vão criar os seus e não a uma lei. Esse ser interrompido, foi a união de 2 células, uma masculina e outra feminina (espermatozóide e óvulo) e cabe aos donos dessas células decidir se interrompem o processo ou não. Não cabe ao “Sr, moralista A” ou ao “Sr. moralista B” decidir se me é permitido ou não interromper. Quando eu o fiz, nem o “Sr. A” nem o “Sr. B” estavam lá!
Trazer crianças ao Mundo e não as poder dar conforto e qualidade de vida é que é um crime!

Na sua casa manda o Sr! Na minha mando eu!!!

Os que defendem o SIM e os que defendem o NÃO, têm duas formas diferentes da interpretação de proteger a vida.

Uns são crentes: Venha a criança e seja o que Deus quiser! Outros são mais realistas: Não venha a criança e que Deus nos perdoe na sua infinita misericórdia!

Respeito a sua escolha e a de todos os outros como também espero que respeitem as minhas escolhas e os meus motivos.

Atentamente

M.N

Orlando Castro disse...

Caro M.N,

É óbvio que respeito e compreendo a sua posição. Aliás, a minha liberdade termina onde começa a sua. Espero que consiga ser feliz.

Kandandu do

Orlando Castro