“Não acredito que quando começarem a morrer pessoas à fome, quando começar tudo numa barafunda, se continue a achar que vale a pena puxar a manta”.
É assim que o bispo das Forças Armadas se manifesta em relação às medidas tomadas pelo governo esclavagista de Portugal, explicando que “as medidas da troika são duras mas não me deixam surpreso, mas depois descubro que os nossos governantes vão além dos sacrifícios impostos pela troika e fico atónito”.
D. Januário Torgal Ferreira nota, como acontece com os quase um milhão de desempregados, 20 por cento de pobres e outros tantos que já nem pratos têm, “uma grande insensibilidade social, apesar de haver muita gente no governo com boas intenções”.
Se calhar até há gente em Portugal com boas intenções. Não creio, ao contrário do bispo, que estejam no Governo ou perto dele.
D. Januário Torgal Ferreira entende, ao contrário dos donos do reino, que “não são os trabalhadores por conta de outrem os assassinos do país”, acrescentando que esta ideia é “uma calúnia e um aproveitamento, porque na crise revelam-se oportunidades para explorar os explorados”.
Por outro lado, Pedro Passos Coelho – importa não o esquecer, importa recordá-lo – pergunta: “A quem serve este regime, que supostamente é extremamente avançado de direitos sociais? Que regime avançado é este que só gera desemprego, precariedade, recibos verdes ou contratos a termo? Temos medo das pressões, ou da contestação ou das greves que possam surgir?” e responde “eu não tenho!"
Isto foi dito, repare-se, na sessão evocativa em memória de Francisco Sá Carneiro, no Porto, o que só por si revela a lata e a falta de vergonha do primeiro-ministro e líder do PSD.
Os devaneios de um anão que se julga gigante, relembram-me mais algumas das afirmações de D. Januário Torgal Ferreira, para quem se Francisco Sá Carneiro fosse vivo caía para o lado. No entanto, como já morreu, deve estar – segundo o bispo das Forças Armadas - a dar voltas no túmulo já que, acrescenta, a austeridade (entre outros dislates deste governo) é uma espécie de "terrorismo".
Recordemos um pouco mais o que diz este bispo que teima em pôr os portugueses a pensar pela própria cabeça, e a rejeitar qualquer intervenção cirúrgica que vise a substituição da coluna vertebral.
"A mim, também me dava jeito um desvio colossal. Depois em Março alguém pagava", disse, desconfiado das razões que levaram à decisão pelas novas medidas de austeridade. "Nada é explicado. Fico com uma grave suspeita sobre a verdade de tudo isto", acrescentou D. Januário Torgal Ferreira, em declarações à RTP.
"A Igreja tem de respeitar a justiça e lutar pelos direitos humanos. Não pode acatar qualquer acto terrorista", disse o bispo das Forças Armadas, quando confrontado com uma pergunta sobre a posição da Igreja face às novas medidas de austeridade. "Há vários tipos de terrorismo, o intelectual, o do medo", disse o bispo.
"Agora é assim? Em Fevereiro os reformados não vão receber. E em Março são os funcionários que ficam sem receber?", questionou. Mas o primeiro-ministro disse que lamentava ter de aplicar estas medidas, argumentou a jornalista da RTP. A resposta foi lapidar: "Já vi muita gente a lamentar e depois ir assaltar um banco. Ou a abandonar a mulher e os filhos e a dizer: lamento".
“É preciso ter muito cuidado. Porque é nestas horas que se fazem grandes fortunas. E, sobretudo, é nestas horas em que os mais pobres ficam mais pobres e alguns ricos ficam muitíssimo mais ricos”, disse o mesmo prelado no Funchal, à margem da comemoração dos 58 anos da Força Aérea Portuguesa.
“Nós temos de lutar e dizer em voz alta, com respeito, respeitando a liberdade, respeitando as pessoas, mas respeitando antes de mais a verdade”, apontou D. Januário Torgal Ferreira.
É claro que ao bispo das Forças Armadas é mais fácil dizer estas verdades. Desde logo porque, ao que julgo, o actual (como o anterior) ministro da Defesa não o despediu ou – como fez o governo anterior e o fará o actual - deu cobertura a despedimentos colectivos nas Forças Armadas.
Passos Coelho esclareceu que, com a actual legislação, existem "cada vez menos trabalhadores, porque aqueles que podem oferecer emprego têm medo de o fazer, a não ser em regime de recibo verde". Sim. Deixam, contudo, de ter medo quando o trabalhador é militante do PSD.
Pois é. Tal como os sacos vazios não se aguentam de pé, também os portugueses, e pela mesma razão, estão de cócoras e de mão estendida.
A verdade é que sempre que o Governo de Passos Coelho abre a boca saem novos impostos, novos cortes, novas taxas, novas regras para que todos os escravos aprendam a viver sem comer.
A procissão ainda vai no adro, mas é já possível dizer que o primeiro-ministro transformou José Sócrates num ingénuo pilha-galinhas.
Como se já não bastasse entrar descarada e criminosamente nos bolsos, na saúde, na vida dos portugueses, o Governo resolve todos os dias pô-los de pernas para o ar, numa voraz sofreguidão para ver se não há nenhum cêntimo escondido nas dobras das calças rotas.
Se eles, Passos Coelho e companhia, entendem que devem roubar aos milhões que têm pouco, ou nada, para dar aos poucos que têm milhões, os portugueses têm de sair à rua e usar o seu legítimo direito à indignação, mesmo que para isso seja necessário pagar na mesma moeda do Governo: olho por olho, dente por dente.
Vão acabar cegos e desdentados? Talvez. Mas para quem só vê os outros a comer tudo e a não deixar nada, pouco diferença fará ter olhos e dentes…
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