Com uma lata bem maior do que o seu país, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal condenou hoje, como se nada tivesse a ver com a questão, o ataque ao autocarro da selecção do Togo em Cabinda que provocou dois mortos, classificando-o como um "acto terrorista".
"Nós condenamos o acto terrorista que se verificou em Cabinda e solidarizamo-nos, naturalmente, com o governo angolano no sentido de o apoiar num momento em que tanta expectativa está criada sobre o sucesso deste campeonato", afirmou à Agência Lusa Luís Amado, salientando que a escolha do país para a realização da prova "celebra" a Paz que Angola conseguiu.
Para o governante, que se calhar há alguns anos também considerava que Portugal começava no Minho e acabava em Timor-Leste, é "neste momento particularmente importante sublinhar o profundo apoio do Governo português ao governo angolano" e condenar "o acto terrorista que se verificou em Cabinda".
De facto, por ignorância factual ou por menoridade intelectual, o problema de Cabinda é mesmo um tabu para Portugal – para os seus governos, para as suas elites, para a sua juventude.
Os cabindas andam há dezenas de anos a dizer que é necessário que a questão seja suscitada, discutida calma e serenamente e as responsabilidades apuradas e assumidas sem preconceitos nem caça às bruxas, acusações ou insultos.
Como a força da razão não tem sido suficiente para que sejam ouvidos nos areópagos da política internacional, lá vão de vez em quando utilizando a razão da força. E quando o fazem... são terroristas.
Terroristas como os da FRETILIN que de armas na mão combateram a ocupação indonésia de Timor-Leste? Terroristas como os do PAIGC que combateram a ocupação portuguesa da Guiné-Bissau? Terroristas como os do MPLA, FNLA e UNITA que combateram o ocupação portuguesa de Angola?
A pretensão de Cabinda resulta apenas da elementar exigência do “honeste vivere, nemine laedere, suum cuique tribuere”: a mais suméria, simples e indispensável racionalidade do direito.
Há bem poucos anos o governo belga apresentou ao Povo da República Democrática do Congo desculpas formais e oficiais pelo seu envolvimento no assassinato de Petrice Lumumba, herói da independência daquele país africano e chefe do seu primeiro governo.
Para Cabinda, não é necessário que Portugal chegue a tanto: A este bastará apenas que proclame a verdade, dê o seu testemunho e ajude a comunidade internacional a encarar essa verdade, aplicando o direito que as regula (tanto a comunidade como a própria verdade ou situação que caracteriza e identifica o problema).
Cabinda não exige desculpas, nem as espera. Apenas exige a assunção da verdade e a realização da justiça, para o bem de todas as partes: De Cabinda, é verdade; mas também de Angola, de Portugal e da própria comunidade internacional, apostada em promover e garantir a democracia, favorecer o desenvolvimento e preservar a paz e a segurança internacionais, assegurando a igualdade de todos os povo, grandes e pequenos, fazendo respeitar os seus direitos e permitindo a realização das suas justas aspirações.
Cabinda é o único povo do planeta a quem é negado, sistemática e terminantemente, a compreensão, a amizade e a solidariedade. O único povo cujos direitos são calcados aos pés pela comunidade internacional. O único que, contra o direito e a lógica, é empurrado para soluções extremas, paradoxalmente, aquelas que são unanimemente condenadas e combatidas.
Será que se quer um pretexto para eliminar os cabindas da face da terra?
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