Como se não bastasse Passos Coelho julgar-se dono da
verdade, ainda gosta (terá tido, com certeza, bons professores) de fazer dos
plebeus uns asnos.
E está de tal maneira imbuído dessa douta suposição,
que vem agora, depois de dizer estar disposto a fazer "alguma
modelação" na aplicação das medidas de austeridade com "impacto
social mais pesado", elogiar “extrema paciência” do povo português.
Lá que os portugueses aceitem ser, passivamente,
escravos ao serviço de um governo que tem um primeiro-ministro que mente, ainda
vá que não vá. Mas daí a acreditar que Passos Coelho abandonou a prática do
“quero, posso e mando” vai, creio eu, uma grande distância.
“É uma grande admiração que sinto pelos portugueses,
quer tenham votado em nós ou não, pela forma como estão a encarar o futuro”,
diz o delegado da Alemanha e
de Angola em Portugal, passando uma esponja sobre o facto de o Governo já há
muito ter abandonado a tese de que os portugueses iriam morrer da cura ou da
doença. Isto é, fez as contas e achou por bem que morram apenas da doença,
desde logo porque dessa forma não há necessidade de gastar dinheiro (que, por
exemplo, faz falta no BPN) na tentativa de cura.
É claro que Passos Coelho sabe que a sua política
atira o país para uma terrível recessão económica, eventualmente irreversível.
Mas isso não o preocupa. Quando acabar ele dá à sola e quem vier atrás que
feche a porta e pendure a placa da falência.
Quando se vê que alguns políticos sofrem mesmo de
nanismo, genético ou adquirido, não sobra margem de manobra para a esperança.
Pelos vistos os portugueses sentem-se felizes quando o soba substitui um prato
cheio de farelo por dois… meio vazios.
Este cenário faz lembrar a história da família de um
militar morto durante a guerra colonial. Quando o Exército foi comunicar aos
pais que o filho tinha morrido, disse: Ele foi atingido por sete tiros, mas
felizmente só um foi fatal.
O Governo está convencido, e até agora não tem razões
práticas para alterar a estratégia, que os escravos contentam-se com migalhas,
farelo ou pão e água.
Da mesma opinião são também os ilustres membros da
casta superior do reino lusitano, casos de Joaquim Pina Moura, Jorge Coelho,
Armando Vara, Manuel Dias Loureiro, Fernando Faria de Oliveira, Fernando Gomes,
António Vitorino, Luís Parreirão, José Penedos, Luís Mira Amaral, António
Mexia, António Castro Guerra, Joaquim Ferreira do Amaral, Filipe Baptista,
Ascenso Simões, Eduardo Catroga.
Ou, igualmente, Cavaco Silva que, em termos
vitalícios, só tem direito a 4.152 euros do Banco de Portugal, a 2.328 euros da
Universidade Nova de Lisboa e a 2.876 euros de primeiro-ministro.
Mas, reconheça-se, Portugal é um país (se é que é) muito
original. Ao mesmo tempo que tem (pelo menos) um milhão e duzentos mil
desempregados, 20% de miseráveis e outros 20% de semi-miseráveis, tem uma
Presidência da República que apenas representa uma pequena factura de 16
milhões de euros por ano e, sobretudo, um primeiro-ministro que elogia a
“extrema paciência” dos seus escravos.
É claro que, no meio da plebe, aparecem sempre as
vozes críticas que contestam a necessária e vital opulência de um organismo que
dirige o destino de um país que recentemente readoptou o esclavagismo.
Dizem esses seres inferiores, e é por isso que são
escravos, que os 16 milhões de euros anuais são um valor 163 vezes superior à
presidência de Ramalho Eanes, gastando o chefe de Estado português o dobro do rei de Espanha (8 milhões).
Esquecem, no entanto, de dizer que a casta superior
fica, mesmo assim, longe dos 112 milhões de euros de Nicolas Sarkozy, ou dos
46,6 milhões da rainha de Inglaterra, Isabel II.
Importa também relevar a importância e
imprescindibilidade do séquito que acompanha sua majestade D. Cavaco Silva.
Ou seja, 12
assessores e 24 consultores, além dos restantes especialistas que põem em
funcionamento a máquina pessoal do presidente e toda a sua estrutura física.
Ao que parece, Cavaco Silva faz-se rodear de um regimento de quase
500 pessoas, fazendo com que os 300 elementos a trabalhar no Palácio de
Buckingham, e os 200 que servem o rei Juan Carlos de Espanha pareçam
insignificantes.
Mas ainda bem que assim acontece. Em alguma coisa
Portugal haveria de ser grande. Também o é noutras coisas, como seja o bacanal
político, as orgias político-económicas e as festas da abundância em que as
sobras alimentam os escravos.
Portugal não dá, aliás, a perceber que o seu povo
passa fome. Como não tira os sapatos ninguém percebe que tem a meias rotas.
Veja-se, por exemplo, que na 21ª Cimeira Ibero-Americana, realizada no
Paraguai, o reino lusitano mostrou toda a sua pujança.
Mostrando mais uma vez a sua coerência e depois de ter
dito que “ninguém está imune aos sacrifícios”, Aníbal Cavaco Silva levou ao Paraguai
uma comitiva de 23 super-especialistas, com destaque para o seu médico pessoal
e, é claro, para o seu mordomo.
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