“De que fala
Passos Coelho quando diz que a quarta avaliação da troika ao cumprimento do
programa de assistência económica e financeira a Portugal decorreu "com
bastante sucesso". Mas sucesso para quem? Se tudo afinal corre tão bem,
porque é que os portugueses estão tão mal?”
Esta
questão, levantada pelo meu amigo (e que amigo!) Hernâni Von Doellinger com a sua habitual e crónica perspicácia, picou-me
a memória.
Segundo o líder
do CDS-PP, Paulo Portas, grande parte das medidas de austeridade foram, são, e
continuarão a ser, impostas pelo memorando assinado com a troika e não são uma
opção do Governo português.
Ora, o
problema não é exactamente esse. Ou seja, a troika diz-me que para eu resolver
a minha crise financeira só posso ter uma refeição, embora exígua, por
dia. No entanto, o Governo de Passos
Coelho e Paulo Portas foi mais além e obriga-me (para ficar com o problema rápida
e completamente resolvido) a estar seis meses sem comer.
E tem razão.
Daqui a seis meses, cumprindo o memorando, eu estaria por cá, embora bem mais
magro. Se calhar não teria resolvido o meu problema. Cumprindo o memorando
imposto pelo Governo, daqui a seis meses não terei qualquer problema. Já há
muito terei morrido.
"É
preciso ter a noção que grande parte das medidas que são discutidas não
constituem uma opção do Governo, nem sequer uma alternativa à disposição do
país. Constituem uma obrigação do Estado português que assinou um contrato com
aqueles a quem pediu dinheiro emprestado", afirma Paulo Portas, certamente
no intervalo de várias e boas refeições.
O líder do
CDS-PP lembra ainda que foi o anterior Governo PS, liderado por José Sócrates,
que negociou este memorando. É verdade. Negociou um ano com uma refeição por
dia e não, como impõe o Governo actual, meio ano sem nenhuma refeição.
Paulo Portas
também deixa de quando em vez um aviso aos socialistas: "Não vale a pena
tentar fazer política com matérias do IRS, ou do IRC, ou do IVA, da
electricidade e do gás, quando o partido que tenta fazer essa política foi
precisamente o partido que nos conduziu à situação em que nos
encontramos".
Também é
verdade. Mas não deixa de ser igualmente verdade que entre viver de pão e água,
como era a estratégia do PS, e viver pura e simplesmente sem comer vai, sei por
experiência própria, uma abissal distância.
Se calhar
devido ao local da sessão em que o líder do CDS/PP fez estas declarações (Museu
do Vinho, Anadia, 17 de Setembro de 2011 ), Portas deixou-se inebriar pelos
etílicos e voluptuosos aromas da demagogia ou, talvez também pela sua cada vez
mais íntima relação com o “líder carismático” de Angola, pela tentação de
julgar que os portugueses são pura e simplesmente matumbos.
"Quando
um País chega à situação a que Portugal chegou por causa da sua despesa e por
causa da sua dívida, obviamente, se assina um contrato e um compromisso com as
instituições internacionais não é para hesitar, nem para duvidar, nem para fazer
de conta", sustentou Portas.
E, em
matéria de sustentação, o líder do CDS e ministro de Passos Coelho sabe do que
fala. Desde logo porque está pouco preocupado em saber se o doente morre da
doença ou da cura. Isto porque o doente nem sequer é da sua família.
"Há
três meses era habitual nas instituições internacionais e na imprensa mundial
ver Portugal referido imediatamente a seguir à Grécia como se fossem um
conjunto. Agora é mais frequente ver que o caso Português é diferente dos
outros", referiu Paulo Portas, certamente convicto de que – por exemplo –
a Madeira não faz parte do reino lusitano.
O líder do
CDS-PP adiantou ainda que o que distingue Portugal da Grécia é "essa
atitude de querer cumprir, de saber que temos de fazer reformas e não hesitar e
não querer enganar as instituições internacionais".
Nesta
particular, Portas tem toda a razão. Os dirigentes de Portugal não querem
enganar as instituições internacionais. Para eles é suficiente enganar os
portugueses.
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