“Angola é um
grande país com um futuro promissor”, diz Jorge Sampaio. Mentira. É um país
grande mas está longe, muito longe, de ser um grande país.
“Do ponto de
vista económico, sem dúvida que Angola é um país com grande futuro, porque as
taxas de crescimento assim o demonstram. O crescendo da economia angolana é
evidente”, disse em tempos Jorge Sampaio num programa de opinião da RTP que,
curiosamente, se chama Avenida de uma coisa que Angola não tem – Liberdade.
Seja como
for, o MPLA gosta de ver os seus amigos a elogiar o regime, até porque as
eleições estão à porta e do ponto de vista a imagem internacional, é sempre bom
registar a apologia de figuras gradas da ex-potência colonial.
O antigo
Presidente de Portugal referiu ainda que dadas as condições excepcionais que
foram criadas em Angola com a conquista da paz, “é preciso ter esperança” de
que vai ser um grande país, com um crescimento acima da média.
Então em que
é que ficamos? É um grande país ou “vai ser um grande país”? Adiante. Desde que o MPLA se perpetue no
poder será sempre grande…
Jorge
Sampaio defendeu que as relações de cooperação bilateral “devem assentar em
bases sólidas e no respeito mútuo”.
Respeito esse que, vê-se logo, blinda qualquer tipo de crítica ao facto
de Angola não ser uma democracia, não ser um estado de direito e ter, aliás, um
presidente não eleito há 33 anos no poder.
E se, não há
muito tempo, o ex-Presidente da República dizia-se "nada satisfeito com a
qualidade da democracia" no seu país, onde a sociedade civil é "pouco
actuante" e os poderes políticos são influenciados por "sectores
corporativos", como o da justiça, o que dizer de Angola?
E se, de
facto, na política “made in Portugal”, os seus actores (a grande maioria
medíocre) estão para se servir e não para servir, o que dizer de Angola?
"Não
estou nada satisfeito com a qualidade da democracia, temos que a requalificar,
revitalizar. A começar pela renovação das dinâmicas e das estruturas
partidárias. E há uma remobilização dos cidadãos que é necessária",
sustentou Jorge Sampaio, em entrevista à Antena 1 em 21 de Abril de 2010. Será que Sampaio já pensou o que, também
nesta matéria, se passa em Angola?
Em
consciência nenhum português deve estar satisfeito com a qualidade dessa coisa
que, em Portugal, se chama democracia. Por alguma razão há cada vez mais
portugueses de segunda e até de terceira. Apesar disso, os políticos jogam com
o que consideram ser uma certeza imutável: os portugueses são um povo de
brandos costumes. O mesmo se passa em Angola como, aliás, é do conhecimento de
Jorge Sampaio.
Questionado
sobre de quem é a culpa pelo estado da democracia em Portugal, Jorge Sampaio
respondeu: "Somos todos naturalmente responsáveis." Se em Portugal
são todos, porque razão em Angola se exclui os donos do regime?
Para Jorge
Sampaio, é (ou era) necessário que "os poderes políticos saibam resistir,
pela seriedade das suas propostas, àquilo que são as profundas influências de
sectores corporativos da sociedade portuguesa". E nomeava médicos, juízes,
magistrados do Ministério Público, enfermeiros e funcionários públicos. E
quanto a Angola?
Em função
desta realidade, mais negra a cada dia que passa, provavelmente os portugueses
deveriam estar nas ruas a manifestar a sua indignação (creio, embora não tenha
a certeza, que ainda têm esse direito) pelo aumento da pobreza, pelo custo de
vida, pelo desemprego, pela crise, pela forma como são tratados.
Já em
Angola, quando o tentam fazer levam porrada de criar bicho e nem com a
solidariedade de todos os Jorges Sampaios podem contar.
Tal como
fazia José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa em relação aos portugueses, também Jorge
Sampaio se junta a Cavaco Silva e a Passos Coelho nesse nobre e eloquente acto
de atirar poeira para a chipala dos angolanos e dos portugueses que gostam dos
angolanos.
Não saberá
Jorge Sampaio que:
- 68% da
população angolana é afectada pela pobreza, que a taxa de mortalidade infantil
é a terceira mais alta do mundo, com 250 mortes por cada 1.000 crianças?
- que apenas
38% da população angolana tem acesso a água potável e somente 44% dispõe de
saneamento básico?
- que apenas um quarto da população angolana
tem acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca
qualidade?
- que 12% dos hospitais, 11% dos centros de
saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao
nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos?
- que 45%
das crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada
quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos?
- que, em Angola, a dependência sócio-económica
a favores, privilégios e bens, ou seja, o cabritismo, é o método utilizado pelo
MPLA para amordaçar os angolanos?
- que 80% do
Produto Interno Bruto angolano é produzido por estrangeiros; que mais de 90% da
riqueza nacional privada é subtraída do erário público e está concentrada em
menos de 0,5% de uma população; que 70% das exportações angolanas de petróleo
tem origem na sua colónia de Cabinda?
- que, em
Angola, o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos
bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos
petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime
no poder?
Sabe. É claro
que sabe. Mas os amigos são para as ocasiões. E por muitos que sejam os defeitos
do regime angolano, nunca se esquecerá de agradecer por escrito a ajuda dos
amigos. E normalmente escreve em… dólares.
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