Se despedir
quando há lucros é vergonhoso, então comprem-se formas de ter prejuízos... É
nisto que o Governo de Portugal trabalha
com ajuda dos seus donos.
O número de
trabalhadores que ficaram sem emprego devido a processos de despedimento colectivo
concluídos entre Janeiro e Abril de 2012 foi de 2.667, um aumento de 70,7 %
face ao mesmo período de 2011.
O presidente
da CIP - Confederação Empresarial de Portugal, António Saraiva, defendeu no dia
13 de Janeiro de 2011, em declarações à Lusa, que o Código do Trabalho devia
sofrer alterações “enquanto a crise estiver instalada, nos próximos três anos”,
para facilitar o crescimento económico.
Provavelmente
tem razão. Penso que, por isso, deveria também incluir uma forma de suspender
aqueles empresários, e não são tão poucos assim, que conseguem pôr as empresas
em crise e as suas contas pessoais em manifesto crescimento.
“Não
defendemos a alteração de todo o Código, mas para um período definido, enquanto
a crise estiver instalada, nos próximos três anos, é preciso encontrar formas
de o melhorar e optimizar, por exemplo nos contratos a prazo, encontrando uma
limitação, um tecto para as indemnizações [em caso de despedimento] nos novos
contratos”, disse António Saraiva.
Este ano, só
no mês de Abril, e tendo em conta os processos concluídos, 70 empresas
recorreram ao despedimento colectivo e num universo de 9.211 trabalhadores
envolvidos, foram despedidos 777, um número que mais do que triplicou face ao
mesmo mês de 2011.
Recorde-se,
entretanto, que o anterior presidente da CIP considerou (28 de Maio de 2009)
que o aumento dos despedimentos colectivos era consequência directa da lei que
proíbe rescisões amigáveis .
Já nessa
altura, como hoje e certamente como amanhã, Francisco Van Zeller esqueceu-se de
dizer que muitos dos despedimentos, colectivos ou não, são consequência de
muitos empresários terem uma clara vocação para tudo, menos para serem
empresários.
Tal como com
Francisco Van Zeller, também agora com António Saraiva, ninguém lhes pergunta
porque razão há empresas a dar lucro e que optam por despedir ou, ainda, porque
razão muitas empresas alegam dificuldades para despedir e logo a seguir admitem
novos funcionários.
Será que a
CIP não vê que Portugal está inundado de empresas geridas pelos filhos dos
velhos patrões e que, devido ao facto de o dinheiro ter caído do céu, apenas
sabem pensar com a cabeça que não tem nenhum neurónio?
Numa análise
por regiões, o Norte do país e Lisboa e Vale do Tejo foram as zonas mais afectadas
pelos despedimentos nos primeiros quatro meses deste ano, tendo sido eliminados
1.180 e 1.136 postos de trabalho, respectivamente.
Em
declarações ao Jornal de Notícias em 17 de Fevereiro de 2009, Francisco Van
Zeller referiu que estava por provar que existissem empresas a aproveitarem-se
da actual conjuntura para encerrar.
À pergunta:
“Há empresas com lucros elevados no ano passado e que este ano já anunciaram
despedimentos por perspectivarem uma quebra dos resultados. Como comenta?”,
Francisco Van Zeller disse:
“É uma forma
de gestão que sempre se usou e que se baseia no princípio de que os ajustes se
devem fazer enquanto há dinheiro. Isso é a situação normal que sempre houve,
porque em condições normais essas pessoas despedidas conseguiriam encontrar
outro emprego. Na situação actual, parece-me um bocadinho mais vergonhoso. Mas
as empresas têm uma grande capacidade de previsão e sabem se os contratos para
daqui a seis meses já estão a falhar, podendo optar por começar já a dispensar
pessoal para acertar as despesas. Tem de ser visto caso a caso e não se pode
atirar pedras a empresas que estão muitas vezes a fazer o melhor que sabem e a
tentar proteger os trabalhadores.”
Ou seja,
segundo o então presidente da CIP, despedir quando há lucros é vergonhoso. Mas
como vergonha é coisa que não consta do léxico de muitos dos empresários
portugueses, vale tudo. E até, se necessário, é sempre possível contratar
especialistas para provarem que não ter vergonha é uma qualidade (vidé os
políticos).
Quando um
grupo mistura no mesmo saco empresas que dão lucro com outras que não dão,
certamente consegue um resultado favorável à tese do prejuízo, actual ou
futuro. É fácil, barato e até dá milhões.
Engraçado
foi ver nessa altura o presidente da CIP, no seu legítimo papel, dizer – e bem
– que “não se pode atirar pedras a empresas que estão muitas vezes a fazer o
melhor que sabem e a tentar proteger os trabalhadores”.
E é
engraçado porque Francisco Van Zeller sabia, melhor do que qualquer outro, que
essas não são a regra, nem esse é o princípio basilar de muitas empresas que
são geridas por quem só tem capacidade técnica, escolar, intelectual, para ser
arrumador de carros. E mesmo assim...
Dito de
outra forma, Francisco Van Zeller sabia que basta ter dinheiro (com a origem do
qual ninguém se preocupa) para ser empresário ou, pelo menos, para ser dono de
uma empresa.
Francisco Van
Zeller também sabia, como sabe António Saraiva, que muitas empresas vão à
falência embora, é claro, os seus donos continuem ainda mais ricos. Tal como
sabia, embora não diga, que se tivesse de escolher, muitos dos seus “colegas”
empresários não os queria nem mesmo para arrumar carros.
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