Está quase a fazer um ano que foi notícia uma iniciativa portuguesa que levava ajuda a crianças necessitadas de Marrocos. Calculo que pelo meu semblante, a família que então me rodeava percebeu a minha indignação, se calhar também pelo meu ensurdecedor silêncio.
Tenho alguma (para não dizer total) dificuldade em perceber como é que os portugueses ajudam Marrocos em vez da Guiné-Bissau, Timor-Leste, Angola, Moçambique, São Tomé, Cabo Verde, Brasil ou até mesmo Portugal.
Aliás, no reino de José Sócrates 20% (vinte por cento, vinte em cada cem, uma em cada cinco) de crianças estão expostas ao risco de pobreza...
Para mim é, ou deveria ser, um dado voluntariamente adquirido que os países lusófonos são prioritários, sem com isso questionar a necessidade de outros povos.
Tal como entendo que os franceses devem dar prioridade aos países francófonos, imaginava que os portugueses deveriam fazer o mesmo em relação aos lusófonos. Mas ainda bem que, mesmo que isso signifique (como significou) um monstruoso e dilacerante murro no estômago, há gente que por gostar tanto de mim me explica que os meus ideais são uma utopia.
Foi isso que me aconteceu. Explicaram-me que, tirando aqueles que descendem de gente com raízes africanas, são poucos os portugueses a quem a real África lusófona diz alguma coisa.
- E são poucos porquê?
Olhando-me como que a dizer: acorda!, explicaram-me que a juventude portuguesa o que sabe da África lusófona é o que mais ou menos vai aprendendo nas escolas, o que em síntese é quase nada, ou mesmo nada.
E se é isso que aprendem, se não lhes ensinam o que é a real Lusofonia, para eles é mais importante o que se passa em Kiev do que o que se passa em Luanda, é mais importante o que se passa em Bruxelas do que o que se passa na Cidade da Praia, é mais importante o que se passa em Rabat do que o que se passa em Díli.
E se calhar até têm razão. Portugal adoptou oficialmente a tese de que a Europa é que tem futuro. E quem sou eu para justificar que o presente pode ser a Europa, mas que o futuro, esse passa pela África lusófona? Sim quem sou eu?
Se, de facto, a dita Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) é uma treta, e a Lusofonia é uma miragem de meias dúzia de sonhadores, o melhor é mesmo encerrar para sempre a ideia de que a língua (entre outras coisas) nos pode ajudar a ter uma pátria comum espalhada pelos cantos do mundo.
E quando se tiver coragem (para mim será cobardia, mas quem sou eu?) para oficializar o fim do que se pensou poder ser uma comunidade lusófona, então já não custará tanto ajudar os filhos do vizinho com aquilo que deveríamos dar aos nossos próprios filhos.
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