Fernando Nobre será o cabeça-de-lista do PSD por Lisboa e o candidato do partido a presidente da Assembleia da República. A aposta de Passos Coelho, sobretudo na perspectiva da multiplicação de votos, parece boa mas se calhar - e mais uma vez - o tiro vai sair pela culatra.
Não estando em causa a obra feita a nível humanitário e cívico por Fernando Nobre, importa ver que os 14% de votos nas eleições presidenciais tiveram um forte contributo de socialistas que, por não se reverem em Manuel Alegre e muitos menos em Cavaco Silva, apostaram no presidente da AMI.
E esses, obviamente não vão agora votar PSD. Além disso, o amplo e transversal descontentamento manifestado pelos portugueses através de Fernando Nobre não vai agora convergir para o PSD. Se calhar até vai funcionar ao contrário.
O líder do PSD expressou a sua "enorme satisfação", considerando que a candidatura de Fernando Nobre às eleições presidenciais "não se assumiu nunca contra os partidos políticos", tendo alcançado um resultado que é "bem demonstrativo de que existe um segmento expressivo de portugueses que acreditam na capacidade de regeneração da política".
Acreditam sim senhor. Mas acreditar nisso não significa comer tudo o que lhe dão, apesar de nesta fase serem cada vez mais os portugueses que estão a aprender a viver sem comer.
Os que são do PSD, tal como os que são do PS, comem qualquer coisa. Mas aqueles que são livres, que não são fanáticos, que (ainda) têm coluna vertebral e que pensam pela sua própria cabeça vão, com certeza, ponderar o oportunismo eleitoral manifestado por Pedro Passos Coelho.
Ao que se diz, Fernando Nobre já admitiu que aceitar o convite do PSD foi uma decisão muito difícil de tomar porque pode ser uma decisão incompreendida.
Fernando Nobre está enganado. Toda a gente compreende a sua decisão, tal como compreende a estratégia do líder do PSD.
Prova disso, por exemplo, é o facto de os portugueses a quem as questões africanas interessam, terem, com facilidade, compreendido as razões que levaram Fernando Nobre a esquecer o Povo de Cabinda e a alinhar com o regime angolano do MPLA.
"Foi uma decisão muito difícil. O país vive uma situação dramática, os tempos que nos aguardam são espinhosos e duros, estamos carecidos de rumo e é preciso encontrar plataformas de entendimento que nos permitam abrir os caminhos do futuro", diz Fernando Nobre na sua página da rede social.
Embora tudo isso seja verdade, não creio que os portugueses acreditem que a escolha de Fernando Nobre para ser a segunda figura da hierarquia política portuguesa seja uma boa aposta.
Os ditos caminhos de futuro não se abrem, julgo eu, com manifestos oportunismos eleitorais, como foi o caso.
A escolha de Passos Coelho mostra que, também ele, pensa que os portugueses continuam a ser – como dizia Guerra Junqueiro - “um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas”.
Mostra ainda que o líder do PSD pensa que os portuguees são “um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta”.
Afinal, como quer Passos Coelho, em Portugal vai continuar a exisitir “uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não discriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro”.
Tudo isto mostra ainda que Portugal continua à espera de quem acabe com “um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País. A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto defazer dela saca-rolhas”.
Por outras palavras, é urgente que Portugal acabe com os “partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar”.
Sem comentários:
Enviar um comentário