O texto que se segue foi-me solicitado por um jornal de Angola. Foi remetido a tempo e horas. Algumas alterações (que não constam deste artigo) foram acordadas. O trabalho não foi publicado. Explicações? Nenhuma.
Nem todos os jovens concordam que o dia 14 de Abril, que consagra o dia da juventude do MPLA, em memória de Hoji Ya Henda, o patrono da JMPLA, seja igualmente considerado o Dia da Juventude angolana.
Nem todos os jovens concordam que o dia 14 de Abril, que consagra o dia da juventude do MPLA, em memória de Hoji Ya Henda, o patrono da JMPLA, seja igualmente considerado o Dia da Juventude angolana.
Será, com certeza, difícil ou até mesmo inexequível encontar uma data que gere unanimidade. Em democracia o melhor que se consegue, quando se consegue, é um consenso. Encontrar, ou até mesmo criar de raiz, um dia que esteja equidistante das datas assinaladas pelos diferentes partidos seria, creio, a melhor solução para homenagear os jovens angolanos que, de facto, merecem ter um dia que assinale o seu contributo em prol do país.
Desde a independênncia que Angola tem comemorado - com um certo abuso de poder e unicidade só aceitável nos países de partido único - o 14 de Abril como o Dia da Juventude Angolana. Com a abertura ao multipartidarismo, urge que se pense e actue com a abertura de espírito necessária para solidificar um sistema político que alberga, ou deve albergar, a diversidade de opiniões como uma mais-valia de incalculável valor patriótico.
Não é sério, muito menos legítimo e democrático, que se continue a subjugar toda a juventude angolana a uma data que, embora partidariamente relevante, só representa uma parte dos jovens com ligações partidárias e, inclusive, esquece todos aqueles – e não são tão poucos quanto isso – que não se revêem nas estruturas juvenis dessas organizações políticas.
De facto, a comemoração com toda a pompa e mordomias inerentes do 14 de Abril era (e poderá continuar a ser) aceitável como marco interno do MPLA e não como algo que possa representar toda a juventude de um país que, também nesta matéria, pretende respeitar e enquadrar-se nas regras de um Estado de Direito internacional, passada que é (embora muitos ainda não tenham reprado nisso) a fase em que Angola era o MPLA e o MPLA era Angola.
Naquela altura, o MPLA era dono e senhor do país e, por isso, o país sujeitava-se às datas que lhe eram impostas, não tendo sequer hipótese de as discutir. E se a JMPLA era, oficialmente, a única estrutura juvenil do país, fazia sentido que os jovens comemorassem essa data.
Mas, embora nem todos tenham consciência disso, o país é hoje outro, amanhã será ainda um outro, pelo que não pode haver receitas unilaterais feitas à medida, e por medida, de um regime monopoartidário que já não existe.
Enterrado que foi o tempo do partido único, importa que o regime compreenda que em democracia, e em teoria, quem mais ordena é o Povo. E esse Povo não pode estar sujeito a regras, a leis, a datas que mais não foram (algumas ainda são) do que uma forma de perpetuar o culto a valores hoje ultrapassados na esmagadora maioria dos países.
Os angolanos estão, pelo menos uma grande parte deles, pretensamente representados no Parlamento, lugar onde é suposto, em democracia, discutir, analisar, debater tudo e mais alguma coisa que diga respeito à vida dos cidadãos.
Por isso, sobretudo os jovens apartidário mas não apolíticos, perguntam (nem sempre de forma clara e incisiva porque temem ofender os membros do partido que sustenta o Governo): “Acaso a instituição do 14 de Abril como Dia da Juventude Angolana foi, depois dos Acordos de Bicesse, alguma vez discutida no Parlamento?”
Assim sendo, esses jovens apartidário mas não apolíticos, sugerem que se faça um referendo (instrumento que só privilegia e solidifica os valores democráticos) para saber se os jovens das organizações partidárias, das organizações da sociedade civil, ou até mesmo dos não enquadráveis nestas variantes, espalhadas pelo País se revêem no 14 de Abril.
De facto, o governo angolano, no poder deste 1975, não tem tido vontade, embora tenha os meios, para resolver problemas como os de água, luz, lixo, saúde e educação da população em geral. No que tange à juventude, esta não tem casa, não tem educação, emprego e não tem futuro.
Por tudo isto, e não só, a juventude quer mais do que nunca ser ouvida e ter, para além de uma voz gritante e activa, possibilidade de dizer de sua justiça, de participar na vida do seu país. O regime ao obrigá-la a aceitar como seu um dia que lhe diz pouco, ou nada, está a atirar a juventude para as margens da sociedade. E, muitas vezes, demasiadas vezes, quando se está na margem escorrega-se para a marginalidade.
Recordo-me de que o membro (entre outras coisas) do Comité Central do MPLA, Kundi Paihama realçar, em Luanda, o contributo da juventude angolana na vida política nacional por ter permitido que hoje o país se possa orgulhar dos seus filhos, pelas grandes vitórias alcançadas ao longo da sua história.
Não fora a modéstia de Kundi Paihama, um angolano de primeira, e ele bem poderia dizer que esteve, e esteve mesmo, nas principais vitórias que fizerem com que o MPLA esteja no poder deste 1975.
Em declarações à Angop, à margem do VI Congresso do JMPLA que decorreu em Outubro de 2009, sob o lema “JMPLA – a certeza de um futuro melhor”, Kundi Paihama frisou que é de louvar a vontade dos jovens virada para o progresso e desenvolvimento do país.
Kundi Paihama destacou o desempenho dos jovens pela causa da nação, abrindo caminho para uma renovação maciça nos vários domínios da vida humana, principalmente no desenvolvimento intelectual, académico e científico, que são mais valias para o progresso de uma pátria.
“Estamos cientes do bom e grande trabalho da direcção do secretariado nacional da JMPLA, que futuramente vai cessar funções, e acreditamos que os futuros dirigentes farão o seu melhor, não só porque as condições serão outras, mas pelo compromisso assumido com o povo”, sublinhou Kundi Paihama.
Kundi Paihama asseverou igualmente que graças ao contributo dos jovens do partido, e não só, Angola conseguiu alcançar vários patamares nos círculos internacionais, nomeadamente político, económico, desportivo e cultural.
Embora seja tudo verdade, a juventude de hoje já consegue (em muitos casos de forma brilhante) pensar pela sua própria cabeça. Não admira, por isso, que muitos jovens ao ouvir estas plavras se recordem igualmente que foi o próprio Kundi Paihama que disse que em Angola existem dois tipos de pessoas, os angolanos e os kwachas, tal como aconselhou estes a comer farelo porque “os porcos também comem e não morrem”.
E tal como Kundi Paihama, também Eduardo dos Santos continua a dizer a todos, mas sobretudo à juventude, que é preciso “honrar e declarar o nosso amor por Angola”.
É verdade. Mas isso não basta. E se os mais velhos fazem do silêncio a sua melhor arma, os jovens falam cada vez mais e, um pouco por todo o pais, vão dizendo que as crianças que mendigam e morrem à fome nas ruas de Luanda também amam Angola. Amam-na e declararam esse amor.
Rui Mingas dizia que, “nos antigamente”, os angolanos apenas tinham “peixe podre, fuba podre, 30 angolares e porrada se refilares”. E hoje, depois da independência e com nove anos de paz absoluta, o que dizem os jovens?
Esses, que serão os líderes naturais de Angola, independentemente do 14 de Abril, continuam a dizer que levam porrada, mesmo sem refilar, e nem peixe ou fuba podre têm.
É, por isso, urgente que o regime olhe a sério para a juventude no seu todo, não apenas para a JMPLA, mesmo para aquela que está fora do país, procurando potenciar os seus conhecimentos e corresponder aos seus anseios.
Importa igualmente que o regime leve em conta que nas mais recentes convulsões sociais, como foram os casos a Tunísia, Egipto e Líbia, a juventude foi quem liderou um processo de mudança. Processo esse que, em qualquer parte do mundo, é irreversível.
Veja-se igualmente o que se passou recentemente em Portugal quando milhares e milhares de jovens, a tal geração à rasca, saíu à rua para – por enquanto pacificamente – dizer que não é fácil respeitar a democracia quando se está de barriga vazia.
Aliás, também em Portugal, como se já não bastasse uma geração à rasca, o governo dteima em que por uma questão de equidade todas as gerações têm de ficar também à rasca. A única excepção é a da geração socialista dos gestores, administradores, directores, assessores e amigos que aceitam ser tapetes do poder.
Todos sabemos que o Presidente Eduardo dos Santos disse no dia 6 de Outubro de 2008, que o Governo ia aplicar mais de cinco mil milhões de dólares num programa de habitação que inclui a construção de um milhão de casas, muitas delas para os jovens.
A construção de um milhão de casas para as classes menos favorecidas de Angola e jovens foi, aliás, uma das promessas da então campanha eleitoral mais enfatizadas pelo Presidente da República de Angola e do MPLA.
José Eduardo dos Santos admitia que "não seria um exercício fácil", tendo em conta que o preço médio destas casas, então calculado em cerca de 50 mil dólares.
O Presidente considerou que o executivo de Luanda estava em "sintonia" com as preocupações e a "visão" da organização das Nações Unidas, quando coloca como questão central, como necessidade básica do ser humano, fundamental para a construção de cidades e sociedades justas e democráticas, a questão da habitação.
Eduardo dos Santos frisou ainda que as "linhas de força" traçadas pelo Governo estão orientadas para uma "cooperação activa" entre a administração central e local do Estado, entre o sector público e o privado, com vista à execução de uma nova política que contribua para "a geração de empregos, para o desenvolvimento harmonioso dos centros urbanos, para a eliminação da pobreza e da insegurança, e para a eliminação também das zonas degradadas e suburbanas".
O Presidente anunciou igualmente na altura (2008) que será "cada vez mais acentuada" a preocupação com a urbanização das cidades angolanas e que serão "incentivadas políticas que diminuam a circulação automóvel nos centros dos grandes aglomerados urbanos.
Ao contrário do que eventualmente podem pensar os dirigentes angolanos, a juventude está atenta a tudo isto e é sobretudo isto que a preocupa. A questão do Dia Nacional da Juventude é apenas simbólico embora, na verdade, possa significar (o que não aconteceu até agora) uma forma de congregar e respeitar a diversidade dos jovens angolanos.
E essa forma não pode passar por dizer que toda a juventude se revê no dia 14 de Abril. Longe disso.
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