O MPLA, com o seu brilhantismo habitual, diz que os angolanos são capazes de reconstruir o país, de criar condições para erradicar a pobreza e de promover o desenvolvimento e o bem-estar social.
Os angolanos são, sim senhor, capazes de tudo isso. Pena é que o regime não os ajude. Já lá vão nove anos de paz total e, feitas as contas, poucos continuam a ter cada vez mais milhões e, é claro, milhões continuam a ter cada vez menos.
A constatação propagandística do MPLA, partido no poder desde 11 de Novembro de 1975, insere-se naquilo a que se convencionou chamar o Dia da Paz e da Reconciliação Nacional e que hoje se assinala.
Este desafio, segundo o MPLA e de acordo com um texto publicado por um dos órgãos oficiais do regime (o Jornal de Angola), deve constituir a base para continuar a construir o futuro do país.
O MPLA exortou os seus militantes, simpatizantes e amigos e todo os angolanos a transformarem as comemorações do 4 de Abril numa "verdadeira jornada de reflexão e de júbilo".
Que o regime esteja em júbilo (assinala desde logo a rendição da UNITA) ainda vá que não vá. No entanto, aos angolanos resta eventualmente reflectir... de barriga vazia.
Apesar de tudo, o regime espera que as reflexões dos angolanos não sejam muito profundas.
Reflectir sobre o estado actual de Angola é lembrar que apenas um quarto da população tem acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade; que 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos.
Reflectir sobre o estado actual de Angola é lembrar que 45% das crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos.
Reflectir sobre o estado actual de Angola é lembrar que a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolano; que 80% do Produto Interno Bruto é produzido por estrangeiros; que mais de 90% da riqueza nacional privada é subtraída do erário público e está concentrada em menos de 0,5% de uma população; que 70% das exportações angolanas de petróleo tem origem na sua colónia de Cabinda.
Reflectir sobre o estado actual de Angola é lembrar que o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder.
O MPLA pede aos angolanos que fortifiquem os laços de união em prol da busca de consensos para o futuro do país, a consolidação da unidade nacional e o aprofundamento do processo democrático em curso.
Essa do aprofundamento do processo democrático em curso é mesmo brilhante. Aliás, nem sequer haveria necessidade de o aprofundar. Basta ver que, por exemplo, o presidente da República, José Eduardo dos Santos, está no poder há 32 anos sem nunca ter sido eleito...
Por alguma razão, o MPLA (dirigido por José Eduardo dos Santos) aproveita a ocasião para reiterar ao presidente da República (José Eduardo dos Santos) e ao Executivo (liderado por José Eduardo dos Santos) todo o seu apoio na direcção e realização das ingentes tarefas da reconstrução nacional, visando a melhoria das condições de vida do povo.
"A paz tem permitido ao nosso povo o usufruto do direito à segurança, à tranquilidade, à estabilidade e à livre circulação em todo o território nacional e tem facilitado o processo de reconstrução e de criação de infra-estruturas para o desenvolvimento, o que tem sido constatado, de forma entusiasta, por todos os de boa-fé, cientes de que a paz veio para ficar e de que o futuro será infinitamente melhor do que o passado", lê-se na declaração do regime.
Pois é. Tudo isso é visto, sentido, apoiado e reconhecido pelo menos por 70 por cento da população que, recorde-se, continua na miséria.
"O processo de reconciliação nacional, que continua a decorrer de forma sólida, não obstante as inúmeras tentativas de o dificultar, permite que os angolanos acreditem no futuro e tem constituído um factor importante para a consolidação da economia e o seu notado crescimento, viabilizando o processo de reconstrução nacional e a paulatina melhoria das condições de vida do nosso povo", sublinha a declaração do Secretáriado do Bureau Político do MPLA, sobre o Dia da Paz e da Reconciliação Nacional.
O MPLA, o regime, José Eduardo dos Santos (são tudo sinónimos) não diz mas, importa reconhecê-lo, as “inúmeras tentativas de dificultar” todo o processo fazem com que, no mínimo, o MPLA precise aí de mais uns 30 anos para tornar o país num Estado de Direito.
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