Se fosse só em Agosto... mas Portugal é invadido todo o ano, e todos os anos, pelos intelectualóides que regressam à ribalta montados nas suas fanfarronas bombas de pós-graduações do tipo farinha Maizena.
Sobre isto também tenho uma confissão a fazer: esta invasão sempre me incomodou, sobretudo pelo putrefacto cheiro a sarjeta paxoli, mal disfarçado pelo importado Calvin Klein ou Lancôme.
E não estou, registe-se, sozinho neste incómodo. Muitos portugueses (sejam de cá ou de lá, sejam brancos, pretos ou mulatos), sentem desconforto com a chegada dos peritos dos peritos que deitam faladura a partir da obra feita pelos outros.
Aquele Portugal do garrafão e do Graciano Saga incomoda ainda muita gente que, apesar da falta de uns tabefes em tempo útil, ainda vai a tempo de levar com o garrafão pelos ditos abaixo.
O transtorno era tanto que até comecei a pensar nisto: "mas porque raio me irrito com os “intelectualóides”?. Antes de responder tenho outra confissão a fazer: devo um pedido de desculpas aos intelectualóides. O incómodo que sinto diz mais respeito aos educadores do que propriamente aos que não foram educados.
Nós rejeitamos os intelectualóides porque eles nos fazem lembrar aquilo que queríamos esquecer: os donos da verdade, herdeiros pidescos da elite reinante de um Portugal de patas de barro.
Os modos “sofisticados” dos intelectualóides recordam-nos que as marcas da modernidade intelectual passaram em muitos casos ao lado de Portugal, embora existam alguns vestígios no reino lusitano a norte, embora cada vez mais a sul, de Marrocos.
Na Europa civilizada, o nascimento dos intelectuais deu-se no século XIX; em Portugal, a fuga para a civilização ocorreu nos anos 60 e 70.
Nas Inglaterras e nas Holandas, a escolarização da população iniciou-se no século XIX. Em Portugal, como agora se vê, continuam a existir toneladas de diplomados analfabetos, de doutores que têm de se descalçar para contarem até 12. Como agora se vê.
Mesmo com mestrados e doutoramentos, passados ou não por uma qualquer universidade independente, é o que se vê. Para serem burros só lhes falta as penas.
A história revela que a sociedade portuguesa interna deu um salto notável: netos de analfabetos alcançaram o topo, continuando analbatetos funcionais.
É por isso que os intelectualóides me incomodam. Ano após ano, eles ressuscitam o Portugal dos donos da verdade. Nos subúrbios de um qualquer Largo do Rato eles congelaram a humildade de quem trabalha e, não só em em Agosto, trazem esses complexos nanicos para as mesas de um qualquer Gambrinus.
Todos os anos, não só em Agosto, o Portugal mais recente, o da sofisticação académica e cultural, é forçado a reconhecer a existência dos intelectualóides. E isso dói. A presença dos intelectualóides mostra que a nossa sofisticação europeia ainda está longe de ser um recentíssimo enxerto de inteligência, mais parecendo um belo exemplar de um Stradivarius feito de latas de sardinha e comprado na Feira da Ladra.
1 comentário:
E o ORLANDO continua exímio!Só boa informação.
Parabéns pelo texto e pelo seu conteúdo tão rico! Está tudo dito.
Agora essa do Stradivarius, poucos saberão que tipo de violino é!
Lá está... um pouco mais de cultura e educação não fazia mal a ninguém, assim como humildade!
Isto dito por uma ignorante. :)
Abraço. :)
Enviar um comentário