O presidente
da República portuguesa não deixa os seus créditos por ideias alheias. Mais uma
vez resolveu puxar dos galões (ou das meias-de-leite) para reforçar que nunca
tem dúvidas e que raramente se engana.
"E
porque não o Banco Central Europeu começar a aplicar já aos títulos da dívida
pública da Irlanda e de Portugal a orientação anunciada pelo seu
Presidente?", questiona Aníbal Cavaco Silva na sua página na rede social
Facebook.
O presidente
faz referência a uma conferência que produziu em Itália há dez meses onde
reclamava do BCE uma "intervenção ampla e previsível no mercado da dívida
soberana dos países solventes que enfrentam problemas de liquidez e a
disponibilidade para uma intervenção ilimitada no mercado secundário" e
ainda que uma intervenção da instituição e do Fundo Europeu de Estabilidade
Financeira no mercado da dívida soberana esteja necessariamente associada a
condicionalidades que garantam o cumprimento dos países às políticas
orçamentais e estruturais adequadas.
"Congratulo-me
com o facto de estes dois pontos estarem reflectidos nas recentes declarações
do Presidente do BCE. Faço votos para que não se continue a atrasar a passagem
à prática daquilo que há muito é óbvio, clarificando os mecanismos de apoio aos
países que enfrentam maiores dificuldades nos mercados e não dando mais espaço
àqueles que apostam no desmembramento da Zona Euro", escreve Cavaco Silva.
A colocação
dos pontos nos is do presidente segue-se às declarações de Mário Dragui, em que
dizia no fim da reunião do Conselho de Governadores do BCE que o euro "é
irreversível" e que "o conselho de governadores [do BCE] poderá
aplicar mais medidas não convencionais para restaurar a transmissão de política
monetária", algo a discutir nas próximas semanas, e que estas medidas
poderão incluir uma nova vaga de compra de dívida pública.
Embora seja
especialista em diagnósticos, Cavaco Silva não vai além disso. Para ele é
preferível perder por não tentar do que perder por fracassar. Ele continua a
dizer qual é a estrada da Beira mas fica impávido sereno sentado na beira de estrada.
Em Março de
2002, afirmou na Faculdade de Economia do Porto, numa conferência intitulada
"Política Orçamental: Passado, Presente e Futuro", que o mal da
economia portuguesa estava nas finanças públicas, mas que o "medo"
dos políticos dificultava a sua correcção, malgrado defender um quase poder de
veto para o ministro das Finanças e considerar que Portugal teria no máximo um
ano e meio para inverter a tendência de degradação da situação económica.
Então, o que
andou a fazer desde essa data? Andou, como anda, a gerir a gamela pública onde
ele e muitos outros se juntam para mamar à custa dos escravos.
"Parece-me
que as medidas que têm de ser tomadas para inverter a situação de marasmo e evitar
grandes preocupações quanto ao que acontecerá na proximidade do alargamento da
União Europeia e da redução dos apoios estruturais da Comunidade requerem um
apoio parlamentar maioritário", afirmou o ex-primeiro-ministro. "Se
não for assim, estou pessimista", acrescentou.
Para o
economista e professor universitário, seria, contudo, "muito
complicado" para o próximo Governo resolver (estávamos em 2002) "o
problema mais grave" que afecta a economia portuguesa: a crise nas
finanças públicas. "Os políticos, como pessoas normais que são, têm medo,
e será precisa muita coragem política para adoptar políticas necessárias, mas
cuja viabilidade política é duvidosa", afirmou, sublinhando: "Não
será nada fácil".
Lembrando
que o Ecofin "estava a olhar de forma muito particular para
Portugal", Cavaco Silva defendeu que a solução passava, necessariamente,
por "reforçar os poderes do ministro das Finanças", que devia contar
com o apoio incondicional do primeiro-ministro e dispor "de um poder quase
de veto sobre os restantes ministérios".
O objectivo
era, dizia há dez anos, assegurar a concretização de medidas que se antevêem
impopulares, como as reformas da saúde - apostando na gestão privada dos
hospitais públicos - e educação, a extinção de alguns serviços públicos, a
contenção nas transferências para as autarquias, o equilíbrio das contas
externas e o assegurar de "disciplina" nas empresas públicas.
Neste
particular, o ex-primeiro-ministro considerou ser necessário acompanhar
"quase à semana o endividamento de determinadas empresas públicas,
nomeadamente no sector dos transportes e do audiovisual.
Quanto à
evasão e fraude fiscais, apontou como única solução viável "um claro
levantamento do sigilo bancário" sustentando que, mesmo face ao risco de
fuga de capitais, "em situação de crise" esta medida se impõe.
Imperativo é, ou era, também
"restituir a credibilidade à política orçamental" portuguesa, cuja
"imagem de facilitismo e laxismo influenciou negativamente a actuação das
empresas e agentes económicos e acabou também por estimular o adiamento de
certas reformas estruturais".
"A
nossa política orçamental continua a ser a grande fonte de ineficiência
económica" em Portugal e é a "primeira razão do mau comportamento da
produtividade", considerou, defendendo a realização de orçamentos
plurianuais.
Hoje, como
quase sempre, Cavaco Silva sacode a água do capote e continua (como se, para
além de presidente da República, não andasse há um monte de anos na política
portuguesa) a esquecer-se de que quem não vive para servir não serve para
viver.
Aliás,
ninguém sabe para o que é que ele serve, mesmo considerando que foi
primeiro-ministro de 6 de Novembro de 1985 a 28 de Outubro de 1995, que venceu
as eleições presidenciais de 22 de Janeiro de 2006 e foi reeleito a 23 de
Janeiro de 2011.
Há bem pouco
tempo, em entrevista a um jornal holandês, Cavco Silva disse estar se “muito
preocupado” com os efeitos da crise na coesão social e defendeu "uma nova
atitude da Europa".
Cavaco Silva
disse que os portugueses foram “demasiado negligentes” e estão hoje a sofrer as
consequências de “uma vida fácil”. E ele
é o quê? Alemão? Onde andou ele durante as últimas décadas?
Na
entrevista, Cavaco Silva disse acreditar que Portugal vai ultrapassar a actual
crise financeira, mas mostrou-se “muito preocupado” quanto aos efeitos da
austeridade na coesão social.
"A
crise requererá muito tempo. Devemos romper o círculo vicioso. Temos uma
recessão e o desemprego aumenta rapidamente. Ando muito preocupado com a coesão
social, com o desemprego entre os jovens, com o perigo da exclusão social dos
pobres. A nossa resistência vai ser muito posta à prova em 2012", defendeu
o chefe de Estado numa entrevista ao diário "Financieele Dagblad".
Foi pena que
Cavaco Silva não tenha citado o seu próprio exemplo. Ou seja, que em termos
vitalícios só tem direito a 4.152 euros do Banco de Portugal, a 2.328 euros da
Universidade Nova de Lisboa e a 2.876 euros de primeiro-ministro.
Cavaco Silva
considera que os portugueses tiveram “uma vida fácil” quando o país entrou na
Zona Euro e que houve excessivo investimento em bens não transaccionáveis.
Lamenta ainda a maneira como o país negou as consequências da impossibilidade
de ter uma política de taxas de câmbio. "Fomos, portanto, demasiado
negligentes."
O Presidente
refere, por outro lado, que, apesar das duras medidas de austeridade que o
Governo “pretende realmente implementar”, os portugueses têm demonstrado
"grande responsabilidade patriótica".
Têm sim,
senhor! Até já sabem, ou quase, viver sem comer e conseguem morrer sem ir ao
médico. E tudo, como é óbvio, se que se possa apontar o dedo a Cavaco Silva
primeiro-ministro durante dez anos, ou a Cavaco Silva presidente da República
há seis anos.
Cavaco Silva
continua a dizer sempre as mesmas coisas e a fazer sempre o mesmo, ou seja:
nada. Vejamos, por exemplo, o que disse no dia 17 de Março, em Mirandela. Disse
que a “confiança é palavra chave” no momento actual do país para “mobilizar os
cidadãos e vencer as dificuldades”.
Como
verdadeiro homem do leme, que nunca se engana e raramente tem dúvidas, continua
a ser gratificante ver como Cavaco Silva comanda a nau catrineta que navega nas
tumultuosas águas da banheira do Palácio de Belém.
“A confiança
é a palavra verdadeiramente chave neste momento. Sem confiança os empresários
não investem, os empresários não contratam mais pessoas, sem confiança é difícil
atrair o investimento estrangeiro, sem confiança os capitais procuram outras
paragens, sem confiança é difícil mobilizar os cidadãos para vencer as
dificuldades”, afirmou.
Bem dito,
embora tenha esquecido (como é habitual) a outra parte. Ou seja, sem confiança
os portugueses não aprendem a viver sem comer, sem confiança não aprendem a
morrer sem ir ao hospital, sem confiança não aprendem a não ter vergonha de
andar com uma mão à frente e outra atrás, sem confiança não olham com orgulho
paras os bolsos vazios, sem confiança
não se sentem felizes por António Mexia ter tido uma remuneração 1,04
milhões de euros no ano passado.
Nos tempos
difíceis que o país atravessa, o “desafio mais sério” para o presidente da
República “é o combate ao desemprego” e
“a confiança é uma chave que pode abrir a janela de esperança no futuro para os
nosso jovens”.
Cavaco
Silva, que certamente tem a máquina de calcular avariada, lembrou um milhão e duzentos mil portugueses
desempregados e os cerca de 150 mil jovens que não têm emprego. Não falou, mas
esteve quase, das suas parcas reformas que não vão chegar para pagar as
despesas.
“É preciso
mobilizar toda a comunidade portuguesa para conseguir inverter a tendência para
a queda da produção económica e a queda do emprego”, referiu Cavaco Silva,
defendendo que “o futuro do nosso país vai depender muito da capacidade, como
comunidade, para criar um ambiente favorável ao investimento empresarial, à
produção de bens que concorrem com a produção estrangeira, que podem ser
exportados ou substituir produtos que neste momento são importados”.
Ou seja, o
presidente da República limitou-se a dizer o óbvio e continuar a caminhar como
se nada tivesse a ver com o assunto. O que vai dizendo assemelha-se à verdade
que um dia destes vai dizer sobre os portugueses: antes de morrerem estavam
vivos.
Cavaco Silva
ressalvou, no entanto, que “ao mesmo tempo” é preciso manter “a coesão social”
e, para isso, considera necessário “mobilizar todas as forças, todas as
iniciativas, todas as regiões do país”, com destaque para o papel das
autarquias.
Coesão
social? Sim, com certeza. Tirando aquela parte da sociedade – também coesa –
onde mamam os mexias do reino, a outra parte está igualmente coesa, cimentada
na fome, na miséria, no ultraje, na escravidão.
“As
autarquias são hoje verdadeiros agentes do desenvolvimento económico e social
do nosso país, elas mobilizam as sinergias locais, impulsionam o
empreendedorismo local, difundem uma cultura de inovação, apoiam as pequenas
empresas, dão visibilidade aos produtos locais, apostam na sua valorização”,
considerou.
Bom. Então é
isso. O Ovo de Colombo está nas autarquias mesmo que três em cada quatro
estejam sem dinheiro para pagar dívidas, mesmo que um quinto dos municípios
estejam em falência técnica.
“E temos que
ser capazes de reconhecer publicamente os talentos e os méritos daqueles que
são os melhores”, acrescentou Cavaco Silva, para sublinhar que “não há país que
atinja um elevado nível de rendimento, de bem estar dos seus cidadãos, se não
for capaz de reconhecer o talento e o mérito daqueles que são os melhores
sociedade”.
Se calhar
será por isso que o número de licenciados desempregados que anulou a inscrição
nos centros de emprego para emigrar subiu 49,5% entre 2009 e 2011.
Cavaco Silva
insiste que o país não pode permitir que os seus jovens “vão para fora, só
porque pensam que na sua terra a sua vontade de subir na vida, a sua vontade de
ganhar mais, a sua vontade de servir melhor o país, não é reconhecida”.
Conheço
pessoas de alto nível cultural e de um enorme talento que são motoristas de
táxi, repositores de produtos em supermercado, fazedores de embrulhos em lojas
e, é claro, desempregados. Também conheço políticos e similares (ministros,
deputados, autarcas, assessores, administradores de empresas públicas,
institutos etc.) que deveriam ser motoristas de táxi, repositores de produtos
em supermercado, fazedores de embrulhos em lojas e, é claro, desempregados.
A diferença
entre eles não está na origem do “dr.” (mesmo que comprado na Lusófona) mas nas
ligações partidárias que, a par ou não da competência, são muito mais do que
meio caminho andado para se ter um bom tacho.
“Ninguém
pode ser deixado para trás, ninguém pode ser deixado de lado”, principalmente
os mais fracos, os mais frágeis, apontando “os idosos, os doentes, os
deficientes”, disse Cavaco Silva.
Embora saiba
que o Governo é cada vez mais forte… com os que são cada vez mais fracos,
Cavaco Silva continua a fazer dos portugueses uns matumbos a quem basta peixe
podre e fuba podre.
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