A Human
Rights Watch afirma que a possibilidade de violência pós-eleitoral em Angola é
este ano maior do que nas eleições de 2008.
Isto porque,
diz, são muito mais os casos de repressão e limitação da liberdade de
expressão. Alguma coisa não bate certo nesta explicação. Desde logo porque
todos sabem que o regime angolano não reprime e muito menos limita algo que não
existe – a liberdade de expressão.
"Com o
impedimento e violência, sobretudo nas manifestações, receamos que isso possa
desembocar em violência de maior escala do que conhecemos na última campanha
eleitoral", disse, em declarações à Lusa, Lisa Rimli, analista da ONG para
Angola.
Lisa Rimli,
que esteve em Angola nas legislativas de 2008 e estará também a acompanhar as
eleições gerais do próximo dia 31, afirma que hoje a situação é
"completamente diferente" e o ambiente é "muito menos propício a
eleições livres e justas".
Ora aí está.
De acordo com as leis democráticas do regime (tão saudadas pela comunidade internacional)
todos os angolanos (até mesmo os de segunda – os kwachas) são livres,
totalmente livres, de escolher entre o
MPLA, o MPLA e ainda o MPLA. Se assim fizerem, as eleições serão livres e
justas.
Tratando-se
há quatro anos das primeiras eleições desde o fim da guerra civil, em 2002,
havia uma grande missão de observadores da União Europeia, maior acompanhamento
mediático e um "grande esforço do governo para mitigar conflitos,
sobretudo no interior".
Esse
exército de observadores internacionais, nomeadamente da UE não serviu para
nada. De facto não era fácil observar os mortos a votar, constatar a
manipulação feita pelos órgãos de comunicação social do regime, verificar que
em alguns círculos eleitorais a votação no MPLA superou os 100%. Compreendo que
foi muito mais simples comer lagosta.
Enquanto em
2008 os casos de violência política se registavam em áreas remotas do interior,
envolvendo activistas dos dois principais partidos (UNITA e MPLA), agora há
"cada vez mais incidentes de violência nos centros urbanos", o que é
"bastante preocupante", afirma Lisa Rimli.
A responsável
da Human Rights Watch aponta em particular o caso de dois ex-combatentes de
guerra que desapareceram sem deixar rasto após uma manifestação em Luanda, o
que "criou um sentimento de terror", a "ameaça de que possam
acontecer raptos contra outros activistas".
Lisa Rimli
sabe que foram mais os que desapareceram, tendo alguns sido suicidados pelos
esbirros do regime. Tal como sabe que, desde sempre, a principal lei do regime
diz que “até prova em contrário todos são culpados”.
Tal como
sabe que a violência, o espectro da guerra, a movimentações de militares por
diversos pontos do país nada mais são do que uma estratégia do regime para
intimidar todos aqueles que pensem que são livres.
Para a
analista, o MPLA teme estes movimentos de protesto que saem à rua, mais até do
que partidos da oposição, pois têm tido "um efeito muito grande",
fazendo a população descontente "perder o medo" de manifestar-se. E o
resultado está à vista. O regime responde com a razão da força, alegando que os
manifestantes são arruaceiros, criminosos e agentes do terrorismo
internacional.
Diz Lisa Rimli
que, com pouco acesso aos media, os próprios partidos "estão a recorrer
cada vez mais a actividades de rua" para protestar contra a corrupção e
mobilizar o eleitorado.
"Há
muita tensão que está a amontoar-se", associada à menor componente de
observação, por parte da comunidade internacional, Igreja Católica e mesmo
sociedade civil, afirma Lisa Rimli que, e muito bem, nem sequer cita a Comunidade
de Países de Língua Portuguesa (CPLP) ou os países que a integram, como é o
caso dos bajuladores portugueses, assalariados pelo regime do MPLA.
O factor
decisivo para a ocorrência ou não de violência pós-eleitoral, afirma Lisa Rimli,
será a perceção de "credibilidade" da votação junto dos actores
políticos, alguns dos quais vêm já pondo em causa o processo.
Outro dado
novo nas eleições deste ano, e que tem vindo a marcar mesmo os protestos de rua
do último ano, é um recurso cada vez maior dos activistas às redes sociais para
se organizarem, divulgarem as suas acções e até publicarem vídeos e fotos em
que as autoridades acariciam os manifestantes com cães, bastões, metralhadoras e
outro material democrático.
E, como
sempre, o regime angolano (apoiado pelos seus sipaios da CPLP) não está
preocupado com as opiniões da Human Rights Watch.
No início de
Julho, por exemplo, o procurador-geral da República desvalorizou as denúncias de
detenções e sequestros de opositores do Governo feitas pela organização Human
Rights Watch.
Aliás, João
Maria Moreira de Sousa tem um argumento imbatível para derrubar os argumentos,
os factos, apresentados por esta organização internacional ainda não comprada
pelo regime. Ou seja, o que acontece em Angola (e ainda falta saber se de facto
acontece alguma coisa) “acontece em quase todo o mundo”.
Ora aí está!
E tanto faz que aconteça num Estado de Direito – que Angola não é -, ou num
reino ditatorial como é o caso. É, aliás, a mesmíssima coisa. E tanto faz que
seja num país onde o presidente é eleito ou num – como o angolano – em que o
dono está no poder há 33 anos sem nunca ter sido eleito.
Na altura, questionado
pela Lusa, à margem de uma visita à Procuradoria-Geral da República portuguesa,
sobre os casos denunciados pela organização internacional de defesa dos
direitos humanos, João Maria Moreira de Sousa admitiu haver casos que, “pela
sua natureza, pela forma como são apresentados, têm sido objecto de
investigação”.
Mas, sublinhou com a precisão milimétrica de quem
tem de pensar no que diz e nunca dizer o que pensa, que “o que acontece em
Angola, acontece em quase todo o mundo. Em Portugal, nos EUA, em Inglaterra”.
A única
diferença, como muito bem sabe João Maria Moreira de Sousa, é que – ao
contrário de Angola – Portugal, EUA, Inglaterra são democracias. A diferença
pode não ser relevante… mas existe.
Pegando nas
verdades oficiais, muitas das quais já datam do tempo de partido único, o
procurador-geral esclareceu (como se isso fosse alguma novidade) que são casos
de “manifestações desordeiras, com algum carácter de violência, que têm de ser
efectivamente controlados pelas forças da ordem e às vezes acontecem alguns
excessos”.
E só por
modéstia João Maria Moreira de Sousa não explicou que os excessos não são das
força da ordem mas, é claro, dos manifestantes que teimam em atazanar a
paciência dos pacíficos membros da Polícia.
Mas, afinal,
quem a Human Rights Watch julga que é para contestar o regime? Não terá lido o manual de boas maneiras do
MPLA na versão angolana e de Passos Coelho na versão (mais ou menos)
portuguesa?
Recorde-se
que a Human Rights Watch referiu em nota divulgada em 15 de Setembro de 2008,
ter identificado irregularidades que incluíam a obstrução, por parte da CNE
(Comissão Nacional Eleitoral), do credenciamento dos observadores nacionais, a
falta de resposta da comissão à parcialidade dos órgãos de informação, e a
demora do governo em conceder os financiamentos devidos aos partidos.
Também
afirmava ter provas, sobre estas três irregularidades, que "sugerem que o
pleito eleitoral não respeitou, em áreas fundamentais, os Princípios e
Directrizes Reguladores de Eleições Democráticas da Comunidade de
Desenvolvimento da África Austral (SADC)".
Na altura,
de acordo com a directora para África da HRW, Georgette Gagnon, foi escrito que
Angola precisava de reformar a CNE, "de modo a que esta não seja dominada
pelo partido no poder e esteja efectivamente em condições de responder aos
problemas eleitorais”.
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