O governo do regime de sua majestade D. Eduardo dos Santos vai avançar com uma lei que visa tentar pôr na ordem (do MPLA) e em ordem (igualmente do MPLA) o que circula na Internet em Angola e que, é claro, desagrada aos donos do reino.
Sua majestade não gosta (e tem razões para isso) do que sobre o seu regime é dito nos meios de informação do ciberespaço e vai tentar que, pelo menos no seu reino, sejam censurados, tal como faz com muita da comunicação tradicional.
De acordo com a ONG Artigo 19, organização, com sede em Londres, de defesa e promoção da liberdade de expressão e da liberdade de informação em todo o mundo, os tópicos das dez principais ameaças à liberdade de expressão/liberdade de imprensa são:
«1. Aumento do controlo governamental sobre os media através de uma série de mecanismos, incluindo influência política sobre os média, registos punitivos e requerimento de licenças, propriedade política, e recurso a regras antiquadas.»
Não é, mas poderia ser, tirada a papel químico do que se passa em Angola, mesmo quando esse controlo não é feito formalmente mas, como mandam as regras de atirar a pedra e esconder a pata, através de mercenários e outras espécies de chefes de posto colocados em locais estratégicos (administrações, direcções, chefias).
«2. Leis cíveis e criminais sobre difamação, injúria e ofensa, as quais penalizam declarações factuais ou opiniões, ou as quais protegem a reputação de símbolos, instituições estatais ou religiosas, ou contam com duras penalidades.»
Isto é, fazendo fé no que se passa no reino de Eduardo dos Santos, a liberdade dos jornalistas termina (e bem) onde começa a dos donos do país, por exemplo. No entanto, a dos donos do país – por exemplo – nunca termina. O importante não é o interesse público mas, antes, o público que interessa aos interesses privados de quem manda.
«3. Violência contra jornalistas e fracasso na prevenção e investigação de tais ataques, e em levar perante a justiça os seus responsáveis.»
No recato dos areópagos do poder, os donos do país puxam da pistola sempre que ouvem falar em jornalistas (sobretudo dos que não são seus assalariados). Quando na praça pública, são defensores desde pequeninos da liberdade de Imprensa.
«4. A falha por parte de uma maioria de estados em adoptar leis que garantam o direito de acesso à informação, e a fraca concretização de tais leis em muitos estados.»
Neste caso, digo eu, Angola é diferente. Todos os jornalistas têm acesso livre à informação... oficial. É claro que, na maioria dos casos, esse material não é informação mas, isso sim, propaganda. Mas também é verdade que os donos do país não têm culpa de considerarem informação o que os jornalistas (alguns e cada vez menos) dizem ser propaganda...
«5. Discriminação contra os grupos historicamente desfavorecidos, os quais lutam pelo exercício do seu direito à liberdade de expressão.»
Nada disso. Em Angola não há grupos desfavorecidos. Os que existem são-no de livre vontade. Se todos quiserem ser do MPLA passam a ser cidadãos de primeira e dessa forma entram na classe dos favorecidos.
«6. Pressões comerciais, incluindo o acréscimo da concentração da propriedade dos média e o risco de que os emissores de rádio públicos percam posição no decurso do processo de conversão digital em muitos países.»
A concentração dos media é, apenas, a parte visível do controlo por parte do poder económico e político do regime. É muito mais fácil controlar, ou comprar, ou subordinar, meia dúzia de empresas do que dezenas de meios. Além disso, tem a clara vantagem de ser mais fácil transformar jornalistas em operários das linhas de enchimento de conteúdos “made in MPLA”.
«7. Desafios para a capitalização de fundos públicos que suportem o serviço público e comunitário de rádio.»
Não se aplica, julgo, ao reino de Eduardo dos Santos.
«8. Utilização dos interesses de segurança nacional para justificar limitações excessivas à liberdade de expressão.»
As limitações à liberdade de imprensa, de expressão e de todas as outras liberdades, têm por base exclusivamente a segurança dos interesses político-partidários de quem está no poder há 32 anos sem nuca ter sido eleito.
«9. Restrições governamentais à Internet, através da imposição de paredes de fogo e filtros, ou bloqueando websites e domínios web.»
Ora aí está. A rapaziada do regime está atenta e vai crivar tudo o que existe, deixando apenas passar para consumo interno o que interessar ao dono do país.
«10. Acesso limitado à Internet por parte de camadas da população vulneráveis, tais como pobres, populações rurais e envelhecidas.»
Pois é. No reino angolano, com 70 por cento de gente pobre, não admira que entre um saco de fuba e a Internet (que muitos nem sabem o que é) seja fácil a escolha.
O artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (que, obviamente, não se aplica a Angola) estabelece: «Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão.»
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