O Sindicato
dos Jornalistas (SJ) de Portugal considerou hoje “demagógicos e perigosos” os
esclarecimentos do ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares, Miguel
Relvas, prestados ontem na Assembleia da República sobre novos cortes nas
dotações estatais da RTP e da Agência Lusa.
Em comunicado,
a Direcção do SJ salienta que o Estado deve assegurar serviços públicos de
rádio e televisão com a actual arquitectura de canais da RTP, bem como
financiar a agência noticiosa nacional, tendo reiterado a sua oposição à
privatização de um canal de televisão.
O comunicado
divulgado hoje é do seguinte teor:
“1. A
Direcção do Sindicato dos Jornalistas tomou conhecimento, com profunda
preocupação, dos “esclarecimentos” demagógicos e perigosos prestados ontem, na Comissão
Parlamentar para a Ética, a Sociedade e a Comunicação da Assembleia da
República, pelo ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, acerca do
desmantelamento dos serviços públicos de comunicação social prestados pela RTP
e pela Agência Lusa.
2. Na pressa
de desmantelar aqueles serviços, e especialmente de privatizar um canal da RTP,
o ministro anunciou para a próxima semana a decisão sobre a escolha dos
conselheiros “jurídico” e “estratégico” para o processo de privatização da RTP,
a ser conduzido pelo antigo quadro do banco norte-americano de negócios Goldman
Sachs, especializado em fusões e privatizações, António Borges, actual
conselheiro do Governo para as privatizações.
3. Como é
sobejamente sabido, o Sindicato dos Jornalistas bate-se e bater-se-á contra o
desmantelamento e a privatização – mesmo parcial – da RTP, pelo que repudia o
processo anunciado. Mas não pode deixar de chamar a atenção para o desvario a
que a pressa do ministro em consumar rapidamente a sua missão está a levar, com
desperdício de fundos públicos e em desrespeito pela Assembleia da República.
4. De facto,
o Governo e o ministro clamam a patriótica necessidade de conter os gastos do
Estado e das empresas do sector empresarial do Estado, mas decide recorrer a
“conselheiros” externos, seguramente bem pagos, quando tem certamente juristas
e outros técnicos nos seus quadros com capacidade para assessorar o processo.
5. Por outro
lado, ao precipitar este processo sem submeter à Assembleia da República uma
proposta de revisão da Lei da Televisão, o ministro pretende começar a consumar
a privatização de um canal da RTP antes mesmo de o Parlamento alterar em Lei da
República a arquitectura do serviço público de televisão, em claro e profundo
desrespeito pelo Parlamento e pela legislação em vigor.
6. Nos
esclarecimentos que apresentou na referida comissão parlamentar, o ministro não
hesitou em recorrer à demagogia de efeito fácil e garantido junto da opinião
pública, ao comparar o “esforço do Estado” com a RTP, este ano na ordem dos 508
milhões de euros (incluindo a liquidação da dívida de médio e longo prazo), com
os esforços com os hospitais de Santa Maria (Lisboa) e de S. João (Porto).
7. A verdade
é que o saneamento antecipado da dívida – aliás devida a estratégias de gestão
a que os governos, também do PSD e do CDS, não são alheios – está evidentemente
ligado ao processo de privatização e de desmantelamento pretendido, pelo que
não se pode invocar tal valor nos termos invocados. Muito menos se pode
continuar a alimentar a ideia de que a RTP presta um serviço público caro. Pelo
contrário, é dos mais baratos da Europa.
8. No seu
afã de destruir os serviços públicos de rádio, televisão e agência noticiosa, o
ministro afirmou também que, no próximo Orçamento do Estado, serão ainda mais reduzidas
as transferências para a RTP e também para a Agência Lusa, continuando assim a
alimentar demagogicamente a ideia de que estes serviços estão a onerar
excessivamente o Estado e os portugueses.
9. Em
relação à agência Lusa, que é a única agência noticiosa nacional, responsável
pela cobertura de todo o território português – continental e insular – e com
especiais responsabilidades nos países de língua oficial portuguesa e das
comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, o ministro anunciou uma “redução
significativa” da transferência para a empresa ao abrigo do contrato de
prestação de serviço noticioso de interesse público.
10. O
Sindicato dos Jornalistas tem a noção do deplorável estado económico-financeiro
em que se encontra o país, aliás com comprovadas culpas dos sucessivos governos
e do actual, mas discorda da limitação orçamental da capacidade operacional de
empresas vitais à vida democrática, à cidadania e ao progresso económico,
social e cultural da sociedade – em primeira linha, as prestadoras de serviço
público de comunicação social, mas também as privadas.
11. O
Governo não pode ignorar que um recuo ainda maior na capacidade da Agência Lusa
de servir os seus clientes – os serviços de rádio e de televisão e as
publicações periódicas de informação geral, sejam nacionais, regionais ou
locais – pode comprometer gravemente não só a actividade e a sobrevivência
desses órgãos de informação, mas também o direito dos cidadãos à informação
sobre acontecimentos e factos nos mais variados locais, regiões e países que,
sem o serviço da agência, não seria possível fruir.
12. O
Sindicato dos Jornalistas salienta a importância estratégica da existência de
uma agência noticiosa pública que, sendo independente, difunde para todo o
mundo uma visão que é obviamente a portuguesa, e recorda que a generalidade dos
países possui agências nacionais ou subsidia-as fortemente.
13. Nestes
termos, o Sindicato dos Jornalistas apela ao Governo e ao Parlamento, para que
reflictam com seriedade e ponderem com muito rigor, profunda atenção às
consequências e em diálogo com as organizações do sector, as medidas
orçamentais que vão ser tomadas. E sobretudo que tenham em conta que a
comunicação social – pública ou parcialmente e indirectamente suportada pelo
Estado – não pode ser encarada como um problema da crise, mas sim como um
instrumento para ajudar a debelá-la.”
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