sexta-feira, julho 06, 2012

No poder por tempo indeterminado




Durante a campanha eleitoral de 2008 em Angola, o partido de José Eduardo dos Santos (MPLA) prometeu a construção de um milhão de novas casas e a criação de milhões de novos empregos.

Os eleitores, vivos e mortos, deram ao MPLA mais de 80% dos votos. Quatro anos depois, os poucos que têm milhões passaram a ter mais milhões, e os milhões que tinham pouco passaram a ter ainda menos.

Com este cenário é previsível que a 31 de Agosto o MPLA se aproxime dos 100%. Há quatro anos ainda havia angolanos a pensar com a cabeça. Agora são cada vez mais os que pensam com a barriga.

Como poucos se recordam, como cada vez menos se recordam, como ainda menos estão interessados em recordar, o MPLA (no poder deste 1975) prometeu aos angolanos o fim da exclusão social, a consolidação da democracia e a restauração dos valores morais.

E assim, vários projectos habitacionais estão em curso, ou em vias disso, ou em vias de estar em vias, em todo o país, seja por iniciativa pública, seja privada (no caso de Angola não sei bem qual é a diferença).

O Governo do MPLA mantém que a construção de habitações sociais é uma das prioridades. Se calhar é por isso que a maior parte dos projectos habitacionais decorrem em Luanda onde, segundo revelou em tempo útil o Notícias Lusófonas citando o próprio ministro o Urbanismo e Construção, faltam 1,7 milhões de habitações.

Os projectos localizados nos municípios do Kilamba Kiaxi, Cacuaco, Viana (Zango) e quilómetro 44 são os mais conhecidos, diz o próprio “Jornal de Angola”, pormenorizando que o complexo habitacional do Kilamba Kiaxi vai beneficiar 160 mil habitantes.

No projecto do Quilómetro 44, diz o JA, estão a ser erguidas duas mil casas, cujos beneficiários, na sua maioria, serão os funcionários do futuro aeroporto de Luanda.

Continuando a citar o órgão oficial do Governo, o projecto do Cacuaco, construído em três fases, terá no final 30 mil apartamentos, em prédios de cinco a 11 andares.

Saindo da capital, no Huambo existe um projecto habitacional que contempla a construção de 130 moradias, num investimento de 500 milhões de dólares.

Na Huíla, 25 mil novas casas de renda económica serão construídas. Numa primeira fase vão ser edificadas na cidade do Lubango mais de duas mil habitações, e outras mil nos municípios da Matala e da Chibia.

A região Leste - províncias do Moxico, Lunda-Norte e Lunda-Sul -, vai beneficiar de 28 mil habitações sociais. O projecto compreende a construção de 20 mil casas na cidade do Dundo (Lunda-Norte), cinco mil em Saurimo (Lunda-Sul) e três mil no Luena (Moxico).

E enquanto esperam, sentados à porta da cubata, os angolanos ficam a pensar no facto de Angola figurar na lista dos países africanos que apresentaram uma grande taxa de crescimento económico, tendo como motor a extracção do petróleo. Ficam, também, a meditar na certeza de que os moradores em bairros de barracas são a maioria, mais de 80 por cento da população urbana.

Recordam-se, por mero acaso – é óbvio, que segundo revelou em 2009 a organização não-governamental Parceria África-Canadá (PAC), uma sociedade de generais angolanos ganhou perto de 120 milhões de dólares (83 milhões de euros), nos últimos dez anos, com uma participação “silenciosa” no negócio dos diamantes.

Na Revista Anual da Indústria dos Diamantes 2007 dedicada a Angola, a ONG afirmava que abundam por todas as regiões mineiras angolanas casos como o da “Lumanhe Extracção Mineira, Importação e Exportação”, em que empresas “aliadas do governo” impõem a sua presença em projectos de exploração, um negócio que deverá render vários milhares de milhões de dólares nas próximas décadas.

“Na corrida para conseguir uma parte da indústria angolana de diamantes, a Lumanhe demonstrou ser extremamente afortunada, captando uma participação de 15 por cento nos projectos aluviais de Chitotolo e Cuango, e uma participação de percentagem semelhante no projecto de exploração em Calonda”, afirmava o relatório.

A empresa tem como sócios António Emílio Faceira, Armando da Cruz Neto, Luís Pereira Faceira, Adriano Makevela McKenzie, João Baptista de Matos e Carlos Alberto Hendrick Vaal da Silva, cinco dos quais generais das Forças Armadas de Angola.

De acordo com a PAC, o rendimento anual da “empresa dos generais” passou de cinco milhões de dólares em 1997 para 22 milhões de dólares em 2006.

No total, o rendimento no período foi de 120 milhões de dólares, o equivalente a dois milhões de dólares por general, por ano.

“Os investidores estrangeiros que actuam em Angola parecem ter incluído essas transferências de dinheiro simplesmente como fazendo parte dos custos de negociação. Contudo, ao reivindicarem cinco a 25 por cento de cada projecto, essas empresas aliadas do governo não estão a tirar dinheiro ao governo ou aos investidores. É o povo angolano que paga o preço”, afirmava.

“A pergunta fundamental”, dizia a ONG, é “o que os angolanos poderiam ter feito com esse dinheiro”, que equivale ao necessário para construção de cem hospitais provinciais como o do Dondo, capital da Lunda Norte, no valor de 1,25 milhões de dólares.

“Os 120 milhões de dólares recebidos pelos generais dariam para construir 150 escolas e pagar a 800 professores um salário mais digno de 300 dólares todos os meses durante 25 anos, sobrando ainda dinheiro para giz, papel e canetas”, afirmava a PAC.

De acordo com a ONG, existem um pouco por todas as regiões produtoras de diamantes “projectos de mineração onde as empresas angolanas apoiantes do governo retiram a sua parte”.

Entre as recomendações da ONG ao governo angolano estava a realização de leilões ou licitações para atribuição das participações em sociedades mineiras, e que os ganhos destes sejam encaminhados para projectos sociais nas regiões diamantíferas.

“O governo angolano e a Endiama devem deixar de oferecer grandes percentagens dos projectos de sociedade conjunta às empresas angolanas apoiantes do governo. Todos os vínculos nominais que existem entre as áreas de concessão e as empresas angolanas deveriam ser cancelados”, defendia o relatório.

Além disso, adiantava, o executivo e a Endiama deve “trabalhar a questão da distribuição dos benefícios do sector diamantífero angolano», uma vez que os beneficiados actualmente resumem-se ao governo, empresas e aos amigos do governo, «e pouco é retribuído aos moradores das regiões que produzem diamantes”.

Conclusão? Nas próximas eleições o MPLA via ter bem mais do que 80% dos votos…

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