O Presidente
de Angola e do MPLA, José Eduardo dos Santos, defendeu no dia 20 de Agosto de
2009, em Luanda a realização das eleições “presidenciais” angolanas num sistema
parecido com o da África do Sul, que definiu como uma eleição "indirecta
atípica".
Agora que
essas eleições estão à porta, se entretanto o regime não descobrir qualquer
motivo para as adiar, importa continuar a dizer que, de facto, se trata de uma
votação à medida e por medida para que ele continue no poder.
Não importa
o que seja eleição "indirecta atípica". O que importa é que José
Eduardo dos Santos continue no poder, se possível durante toda a vida. Não
seria o primeiro nem certamente o último.
"O que
estamos a advogar agora é a eleição presidencial por sufrágio universal, mas
num sistema que seja parecido com o da África do Sul", declarou Eduardo
dos Santos, defendendo a realização de um escrutínio directo e universal em que
o Presidente é cabeça de lista do partido que o apoia, devendo a escolha popular
ser depois ratificada pelo Parlamento, mas que não é uma eleição indirecta
típica.
Ou seja:
para além de as eleições se realizarem apenas e quando Eduardo dos Santos
quiser, e se quiser, é preciso que tudo se faça de modo a garantir que tudo
ficará na mesma, como aliás acontece desde 1975.
O dono do
país, que respondia a perguntas de jornalistas, adiantou, no entanto, que a
modalidade de realização das presidenciais dependeria da vontade da maioria.
E quem é
essa maioria? É o MPLA. Aliás, como noutros tempos, dir-se-ia que o MPLA é o
povo e o povo é o MPLA. E se assim é, se calhar nem valeria a pena haver
eleições. Com elas ou sem elas, o povo continua a passar fome e o petróleo
continua a chegar aos donos do mundo. Portanto...
"Evidentemente
que sou presidente de um partido, sou presidente do MPLA", frisou Eduardo
dos Santos. E frisou bem, não fosse alguém esquecer-se.
Eduardo dos
Santos lembrou, por outro lado, que as eleições presidenciais em Angola dependia
do processo de elaboração da futura Constituição, em curso e numa fase
"muito" adiantada.
A Constituição,
como de resto tudo em Angola, foi também feita à medida e por medida e, é claro, aprovada
pela tal maioria.
"O
Estado deverá criar as condições para a realização de eleições gerais em 2012,
ano que finda o mandado resultante das eleições legislativas de Setembro de
2008", declarou José Eduardo dos Santos, numa mensagem ao país, após a
cerimónia de promulgação da nova Constituição.
É claro que
se o Estado não criar as condições... não haverá eleições. Mas, afinal, quem é
o Estado? O Estado é o regime, o regime é o MPLA, o MPLA é José Eduardo dos
Santos e José Eduardo dos Santos é o dono de Angola. Tão simples quanto isso.
No meio de
um discurso sisudo, Eduardo dos Santo não resistiu (ainda bem!) a contar uma
anedota que, apesar de velhinha, continua a fazer-nos rir. Afirmou que "o
Estado vai continuar a criar condições para que a imprensa seja cada vez mais
forte, plural e isenta, responsável e independente".
Como a
audiência parecia não ter percebido o alcance da anedota, o chefe de Estado, do
MPLA, do Governo, do país, pormenorizou: É preciso dar "expressão à
realidade multicultural do país e contribuindo para a unidade da Nação e
incentivando o surgimento e desenvolvimento da iniciativa privada nacional nos
diferentes domínios da comunicação social".
Regressado à
sisudez soviética (atenuada em alguns pontos pela mão dos amigalhaços
portugueses e brasileiros) onde aprendeu tudo o que sabe, Eduardo dos Santos
disse que "hoje, neste acto histórico e solene, o povo angolano vai
conquistar pela primeira vez uma Constituição genuinamente nacional que
assinala o fim do período de transição em que vivíamos (desde 1991, com a
abertura ao multipartidarismo) e instaura definitivamente um Estado democrático
e de direito".
Para os
leitores menos habituados a esta linguagem figurativa do dono de Angola,
importa fazer a tradução. “Constituição genuinamente nacional” significa que
foi exclusivamente feita pelos angolanos de primeira e para os angolanos de
primeira, ou seja os do MPLA.
“Estado
democrático e de direito”, quer dizer um reino onde o clã Eduardo dos Santos dá
total liberdade aos súbditos para seguiram o MPLA, bem como para perceberam a
filosofia democrática do regime: “quero, posso e mando”.
Respondendo
a críticas, com destaque para a UNITA, o maior partido da oposição que
abandonou o Parlamento nos momentos de votação, Eduardo dos Santos disse que a
Constituição "é fruto de um prolongado debate aberto, livre e democrático
com todas as forças vivas da Nação".
Tem razão. O
debate foi aberto, livre e democrático. Todos puderam falar do assunto, propor
alternativas e contestar. Todos aqueles que ainda não tinham percebido que esse
debate era folclore e que a Constituição seria aprovada segundo as regras e
interesses do regime...
O presidente
lembrou ainda que esta Constituição "reafirma e consagra" entre os
seus princípios estruturantes a democracia pluralista e representativa, o
carácter unitário do Estado, a valorização do trabalho e o respeito pela
dignidade da pessoa humana, a livre iniciativa económica e empresarial, a
justiça social, a participação dos cidadãos e o primado da lei.
Esta foi
aquela parte tirada de outras leis fundamentais que ficam sempre bem, mas que
não são para cumprir.
Se a
existência de partidos é, só por si, sinónimo da de democracia, se calhar o
regime de Salazar também era democrático. Para haver democracia, julgam alguns
peregrinos das causas humanas, é preciso que o poder não esteja na mão de uma
só pessoa, é preciso que o poder legislativo seja eleito, que o poder executivo
seja eleito, ou que emane do poder legislativo eleito, que o poder judicial
seja independente, que o Povo saiba quem elege ou quem não elege. Nada disto é
verdade em Angola.
Assim, o
presidente da República é o “cabeça de lista” do partido mais votado, mesmo que
só consiga – por exemplo – 25% dos votos (não será o caso do MPLA que é bem
capaz de passar os 100%).
Além disso,
o presidente nomeia o Vice-Presidente, todos os juízes do Tribunal
Constitucional, todos os juízes do Supremo Tribunal, todos os juízes do
Tribunal de Contas, o Procurador-Geral da Republica, o Chefe de Estado Maior
das Forças Armadas, os Chefes do Estado Maior dos seus diversos ramos destas.
Melhor do
que isto não conheço. Nem mesmo Jean-Bédel Bokassa, também conhecido como
Imperador Bokassa I e Salah Edddine Ahmed Bokassa, Idi Amin Dada ou Mobutu Sese
Seko fizerem algo de semelhante.
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