sábado, julho 14, 2012

Pare de gozar com os escravos portugueses!


Cavaco Silva deve ter um prazer especial em, sob a suas austera máscara de presidente, gozar com os portugueses. Comporta-se como se nada tivesse a ver com a institucionalização de um Estado esclavagista em Portugal.

Em entrevista a um jornal holandês, o presidente da República diz-se “muito preocupado” com os efeitos da crise na coesão social e defende "uma nova atitude da Europa".

Cavaco Silva diz que os portugueses foram “demasiado negligentes” e estão hoje a sofrer as consequências de “uma vida fácil”.  E ele é o quê? Alemão? Onde andou ele durante as últimas décadas?

Será que ele se esqueceu que foi primeiro-ministro  de 6 de Novembro de 1985 a 28 de Outubro de 1995, que venceu as eleições presidenciais de 22 de Janeiro de 2006 e foi reeleito a 23 de Janeiro de 2011?

Na entrevista, Cavaco Silva diz acreditar que Portugal vai ultrapassar a actual crise financeira, mas mostra-se “muito preocupado” quanto aos efeitos da austeridade na coesão social.

"A crise requererá muito tempo. Devemos romper o círculo vicioso. Temos uma recessão e o desemprego aumenta rapidamente. Ando muito preocupado com a coesão social, com o desemprego entre os jovens, com o perigo da exclusão social dos pobres. A nossa resistência vai ser muito posta à prova em 2012", defende o chefe de Estado, numa entrevista ao diário "Financieele Dagblad".

Foi pena que Cavaco Silva não tenha citado o seu próprio exemplo. Ou seja, que em termos vitalícios só tem direito a 4.152 euros do Banco de Portugal, a 2.328 euros da Universidade Nova de Lisboa e a 2.876 euros de primeiro-ministro.

Cavaco Silva considera que os portugueses tiveram “uma vida fácil” quando o país entrou na Zona Euro e que houve excessivo investimento em bens não transaccionáveis. Lamenta ainda a maneira como o país negou as consequências da impossibilidade de ter uma política de taxas de câmbio. "Fomos, portanto, demasiado negligentes."

O Presidente refere, por outro lado, que, apesar das duras medidas de austeridade que o Governo “pretende realmente implementar”, os portugueses têm demonstrado "grande responsabilidade patriótica".

Têm sim, senhor! Até já sabem, ou quase, viver sem comer e conseguem morrer sem ir ao médico. E tudo, como é óbvio, se que se possa apontar o dedo a Cavaco Silva primeiro-ministro durante dez anos, ou a Cavaco Silva presidente da República há seis anos.

Cavaco Silva continua a dizer sempre as mesmas coisas e a fazer sempre o mesmo, ou seja: nada. Vejamos, por exemplo, o que disse no dia 17 de Março, em Mirandela. Disse que a “confiança é palavra chave” no momento actual do país para “mobilizar os cidadãos e vencer as dificuldades”.

Como verdadeiro homem do leme, que nunca se engana e raramente tem dúvidas, continua a ser gratificante ver como Cavaco Silva comanda a nau catrineta que navega nas tumultuosas águas da banheira do Palácio de Belém.

“A confiança é a palavra verdadeiramente chave neste momento. Sem confiança os empresários não investem, os empresários não contratam mais pessoas, sem confiança é difícil atrair o investimento estrangeiro, sem confiança os capitais procuram outras paragens, sem confiança é difícil mobilizar os cidadãos para vencer as dificuldades”, afirmou.

Bem dito, embora tenha esquecido (como é habitual) a outra parte. Ou seja, sem confiança os portugueses não aprendem a viver sem comer, sem confiança não aprendem a morrer sem ir ao hospital, sem confiança não aprendem a não ter vergonha de andar com uma mão à frente e outra atrás, sem confiança não olham com orgulho paras os bolsos vazios, sem confiança  não se sentem felizes por António Mexia ter tido uma remuneração 1,04 milhões de euros no ano passado.

Nos tempos difíceis que o país atravessa, o “desafio mais sério” para o presidente da República  “é o combate ao desemprego” e “a confiança é uma chave que pode abrir a janela de esperança no futuro para os nosso jovens”.

Cavaco Silva, que certamente tem a máquina de calcular avariada,  lembrou um milhão e duzentos mil portugueses desempregados e os cerca de 150 mil jovens que não têm emprego. Não falou, mas esteve quase, das suas parcas reformas que não vão chegar para pagar as despesas.

“É preciso mobilizar toda a comunidade portuguesa para conseguir inverter a tendência para a queda da produção económica e a queda do emprego”, referiu Cavaco Silva, defendendo que “o futuro do nosso país vai depender muito da capacidade, como comunidade, para criar um ambiente favorável ao investimento empresarial, à produção de bens que concorrem com a produção estrangeira, que podem ser exportados ou substituir produtos que neste momento são importados”.

Ou seja, o presidente da República limitou-se a dizer o óbvio e continuar a caminhar como se nada tivesse a ver com o assunto. O que vai dizendo assemelha-se à verdade que um dia destes vai dizer sobre os portugueses: antes de morrerem estavam vivos.

Cavaco Silva ressalvou, no entanto, que “ao mesmo tempo” é preciso manter “a coesão social” e, para isso, considera necessário “mobilizar todas as forças, todas as iniciativas, todas as regiões do país”, com destaque para o papel das autarquias.

Coesão social? Sim, com certeza. Tirando aquela parte da sociedade – também coesa – onde mamam os mexias do reino, a outra parte está igualmente coesa, cimentada na fome, na miséria, no ultraje, na escravidão.

“As autarquias são hoje verdadeiros agentes do desenvolvimento económico e social do nosso país, elas mobilizam as sinergias locais, impulsionam o empreendedorismo local, difundem uma cultura de inovação, apoiam as pequenas empresas, dão visibilidade aos produtos locais, apostam na sua valorização”, considerou.

Bom. Então é isso. O Ovo de Colombo está nas autarquias mesmo que três em cada quatro estejam sem dinheiro para pagar dívidas, mesmo que um quinto dos municípios estejam em falência técnica.

“E temos que ser capazes de reconhecer publicamente os talentos e os méritos daqueles que são os melhores”, acrescentou Cavaco Silva, para sublinhar que “não há país que atinja um elevado nível de rendimento, de bem estar dos seus cidadãos, se não for capaz de reconhecer o talento e o mérito daqueles que são os melhores sociedade”.

Se calhar será por isso que o número de licenciados desempregados que anulou a inscrição nos centros de emprego para emigrar subiu 49,5% entre 2009 e 2011.

Cavaco Silva insiste que o país não pode permitir que os seus jovens “vão para fora, só porque pensam que na sua terra a sua vontade de subir na vida, a sua vontade de ganhar mais, a sua vontade de servir melhor o país, não é reconhecida”.

Conheço pessoas de alto nível cultural e de um enorme talento que são motoristas de táxi, repositores de produtos em supermercado, fazedores de embrulhos em lojas e, é claro, desempregados. Também conheço políticos e similares (ministros, deputados, autarcas, assessores, administradores de empresas públicas, institutos etc.) que deveriam ser motoristas de táxi, repositores de produtos em supermercado, fazedores de embrulhos em lojas e, é claro, desempregados.

A diferença entre eles não está na origem do “dr.” (mesmo que comprado na Lusófona) mas nas ligações partidárias que, a par ou não da competência, são muito mais do que meio caminho andado para se ter um bom tacho.

“Ninguém pode ser deixado para trás, ninguém pode ser deixado de lado”, principalmente os mais fracos, os mais frágeis, apontando “os idosos, os doentes, os deficientes”, disse Cavaco Silva.

Embora saiba que o Governo é cada vez mais forte… com os que são cada vez mais fracos, Cavaco Silva continua a fazer dos portugueses uns matumbos a quem basta peixe podre e fuba podre.

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