Para mim é
novidade. José Eduardo dos Santos é o “escolhido de Deus”? E eu a pensar que
ele próprio era o Deus…
Segundo o
Jornal de Angola (JA), órgão oficial do regime do “querido líder”, nome herdado
do velho amigo e aliado Kim Jong-il, José Eduardo dos Santos foi a figura
africana do ano de 2011.
Segundo o
Alto Hama, José Eduardo dos Santos é a figura mundial do ano de 2012. Se ele
foi “escolhido por Deus”, não serei eu que como simples mortal vai dizer o
contrário.
Para um
regime que tem nas suas estruturas militares um Chefe do Estado Maior General
Adjunto, general Egídio Sousa Santos, cujo pelouro é a Educação Patriótica das
Forças Armadas Angolanas, não está nada
mal ser o “escolhido por Deus”. De facto nem Kim Jong-il fez melhor. Não passou
de “querido líder”.
Diz o JA que
a distinção do presidente, não eleito e há 33 anos no poder, se deve ao facto
de ele ter sido “o líder de um ambicioso programa de Reconstrução Nacional”, de
a “sua acção ter conduzido à destruição do regime de “apartheid”, de ter “um
papel de primeiro plano na SADC e na CDEAO”, de “a sua influência na região do
Golfo da Guiné ter permitido equilíbrios políticos, tal como permitiu avanços
significativos na crise de Madagáscar”.
Creio que
tanta bajulação, ainda por cima acéfala, até envergonhou o próprio dono de
Angola. Mas se o regime é assim, se Eduardo dos Santos é o MPLA, se o MPLA é
Eduardo dos Santos, se Angola é o MPLA e o MPLA é Angola, estava quase tudo dito. Quase porque faltava - o que é uma falha grave do JA – dizer o que
agora é reconhecido e promulgado pela comunidade religiosa.
Ainda não há
muito tempo que o mesmo JA escrevia que “Angola já foi um país ocupado por
forças estrangeiras”, acrescentando que, “se por hipótese hoje Angola fosse a
Líbia, o país estava novamente a atravessar um período de grande instabilidade
e perturbação. Mas como o tempo não recua, Luanda é uma cidade livre”.
Tem, mais
uma vez, toda a razão. Como Angola não é a Líbia, embora José Eduardo dos
Santos seja uma cópia de Muammar Kadafi, de quem aliás era íntimo amigo, ainda
falta algum tempo até que o Povo derrote o ditador. Veremos os sinais que vão
sair das urnas no dia 31 de Agosto.
“Se Angola
fosse a Líbia (e não é graças ao “querido líder”, ao “escolhido de Deus”)
estava a ser cercada militarmente e bombardeada por uma aliança militar e
submetida a todos os outros membros dessa organização bélica, que tinham escolhido
para presidente de um qualquer CNT um “rapper” com nome de oxigénio,
devidamente ajudado por outro com apelido de marechal”, diz o JA do alto da sua
cátedra de correia de transmissão de um regime que colocou o país no topo do
mais corruptos do mundo (Deus saberá disso?).
Mas é bom
registar e relembrar as afirmações do JA. Desde logo porque, como sempre
acontece nas ditaduras, ainda vamos ver os mesmos protagonistas embandeirar em
arco quando Eduardo dos Santos passar de bestial a besta.
“Se Angola
fosse a Líbia (e não é graças ao “querido líder”, ao “escolhido de Deus”),
continua o JA, a esta hora as grandes petrolíferas estrangeiras estavam a
roubar milhões de barris de petróleo por dia de Angola, antes que a resistência
dos angolanos os impedisse de continuar o roubo. E os aviões da aliança, com a
carta branca da Organização das Nações Unidas, estavam a despejar bombas sobre
as nossas cidades, para proteger os civis do CNT”.
O pasquim,
dirigido por José Eduardo dos Santos através dos autómatos José Ribeiro e
Filomeno Manaças, esquece-se que Angola rouba milhões de barris de petróleo por
dia ao povo da sua colónia de Cabinda. Mas lá chegará a altura em que os
angolanos os vão ver fora do pedestal.
“Se Angola
fosse a Líbia (e não é graças ao “querido líder”, ao “escolhido de Deus”) não
havia partidos políticos nem liberdade de imprensa e muito menos eleições
democráticas. A bela Constituição da República de Angola era rasgada na Praça
da Independência, donde já tinham tirado o monumento a Agostinho Neto, aos
gritos e com raiva para as câmaras de televisão mundiais repetirem de hora a
hora de maneira interminável”, escreve o órgão do MPLA na senda do seu irmão
Pravda, que foi o principal jornal da União Soviética e um órgão oficial do
Comité Central do Partido Comunista da União Soviética entre 1918 e 1991.
Falar de
democracia num país que têm 68 por cento de gente a viver na miséria, e que
trata os jornalistas não afectos ao regime como inimigos, é o mesmo que dizer
que os rios nascem no mar. E se o “escolhido de Deus” assim quiser, um dia isso
vai acontecer.
“Se Angola
fosse a Líbia (e não é graças ao “querido líder”, ao “escolhido de Deus”) este
jornal não circulava e os seus jornalistas não se atreveriam a escrever estas
verdades porque eram logo massacrados como estão a massacrar os negros em
Tripoli e outras cidades líbias “libertadas” pela aliança militar”, considera o
Pravda de Luanda.
Importa
dizer, desde logo porque nem todas fomos
(pelo menos por enquanto) comprados pelo regime, que o JA não tem
jornalistas ao seu serviço. Tem, apenas isso, funcionários do partido que
escrevem o que lhes mandam e que, em muitos casos, não assinam os textos porque
ficaria mal em vez do nome colocar a impressão digital.
“Se Angola
fosse a Líbia (e não é graças ao “querido líder”, ao “escolhido de Deus”),
estávamos de novo a sofrer as investidas militares de regimes estrangeiros
aliados a uma frente de oportunistas e intriguistas que procuram ignorar quem
combateu e deu tudo pela concórdia e harmonia entre os angolanos”, afirma o
órgão de propaganda do regime.
Por regra, o
JA sentia um orgasmo especial em atacar os poucos jornalistas portugueses que
ainda não foram comprados pelo regime angolano. Mas até isso acabou… está em
vias de acabar.
Tem,
obviamente, todo o direito de o fazer. Para o pasquim do MPLA, “os órgãos de
comunicação social portugueses, salvo raras excepções, em vez de reflectirem a
realidade portuguesa e europeia, andam entretidos a intrometer-se na política
angolana”. Pois é, mas até esses arrepiaram caminho em direcção aos dólares da
Sonangol.
Ainda bem
que, pelo sim e pelo não, o JA esclarece o âmbito em que devem actuar os media
portugueses. Ficam assim a saber que podem falar de Angela Merkel mas que, pelo
contrário, não devem ousar escrever sobre o mais lídimo e sublime representante
de Deus na terra, de seu nome José Eduardo dos Santos.
Diz o JA,
reflectindo aliás a velha cartilha dos tempos (mesmo hoje a diferença é pouca)
do partido único, que “os mentores desses exercícios de colonialismo retardado
têm a mesma origem de sempre mas deixam de fora o rabo de quem lhes paga os
disparates sem sentido.”
Neste
aspecto, reconheço, o JA tem toda a razão. Não fala do colonialismo angolano
praticado em Cabinda porque, presumo, considera que Cabinda não pertence a
Angola. Quanto ao rabo, é verdade que no caso do Jornal de Angola tal não se
aplica… embora ainda se notem as marcas.
Diz o órgão
oficial do MPLA: “Se um jornal angolano escrevesse um editorial a sugerir que o
presidente Cavaco Silva não se candidatasse ao segundo mandato porque foi dez
anos Primeiro-Ministro e fez mais cinco na Presidência, o alarido em Lisboa era
tal que até a Ponte 25 de Abril vinha abaixo, como já caiu fragorosamente a
revolução dos capitães”.
Brilhante.
Esquece-se o JA que, ao contrário do reino do seu mentor, Cavaco Silva - seja
como primeiro-ministro ou presidente – sempre foi eleito. Eu sei que a
democracia “made in MPLA” não implica, antes pelo contrário, que seja
necessário haver eleições. Aliás, não faria sentido eleger quem é o “escolhido
de Deus”.
“Se em
Angola algum órgão de informação ousasse escrever que Alberto João Jardim não
deve concorrer a um novo mandato de presidente do Governo Regional da Madeira,
o alarido em Lisboa era tal que o edifício da Caixa Geral de Depósitos ruía,
como está em ruínas o sistema financeiro europeu e a Zona Euro ameaça
derrocada”, diz e muito bem o boletim oficial do regime.
Esquece-se,
mais uma vez, que também Alberto João Jardim foi eleito, ao contrário do sumo
pontífice do MPLA, que está no poder há
33 anos sem nunca ter sido eleito.
“O
Presidente José Eduardo dos Santos não governa há 33 anos. Ele é o líder de um
povo que teve de enfrentar de armas na mão a invasão de exércitos estrangeiros
e os seus aliados internos”, escreve o JA, repescando as regras dos áureos
tempos em que se impunha que o povo é o MPLA, o MPLA é o povo.
“José
Eduardo dos Santos foi o líder militar que derrubou o regime de “apartheid”, o
mesmo que tinha Nelson Mandela aprisionado. José Eduardo dos Santos só aceitou
depor as armas quando a Namíbia e a África do Sul foram livres e os seus
líderes puderam construir regimes livres e democráticos”, recorda com a sua
habitual perspicácia o JA.
Penso que,
neste aspecto, bem poderia ser menos modesto. É que foi graças a José Eduardo
dos Santos que Portugal adoptou a democracia, que a escravatura foi abolida,
que D. Afonso Henriques escorraçou os mouros, que Barack Obama foi eleito e que
os rios passaram a correr para o mar…
“Os media
portugueses pelo menos deviam reconhecer o que José Eduardo dos Santos tem
feito para que os portugueses não vão ao fundo com a crise. Eles mais do que
ninguém deviam propor o seu nome para Prémio Nobel da Paz”, salienta com raro
sentido de oportunidade o Jornal de Angola.
Tem, mais
uma vez, razão. A Oferta Pública de Aquisição lançada pelo regime angolano (que
é o mesmo que dizer MPLA ou José Eduardo dos Santos) sobre Portugal está a ter
êxito, calculando-se por isso que o reino lusitano não tarde a ser mais uma das
províncias de Angola.
Também
concordo que Eduardo dos Santos merece o Prémio Nobel da Paz. E, já agora, o
Jornal de Angola merece – no mínimo – o Prémio Pulitzer.
1 comentário:
Não sabes mesmo nada. Então o "Escolhido de Deus" não é o próprio feito homem?. essa longas férias estão já a fazerem-te mal...
Kdd
EA
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