O julgamento, que é apontado por observadores internacionais como mais uma farsa, de quatro dos seis activistas de direitos humanos de Cabinda, que estão detidos desde Janeiro, acusados de crime contra a segurança de Estado, vai ter início na quarta-feira na colónia angolana de Cabinda.
O início do julgamento do padre Raul Tati, do advogado Francisco Luemba, do economista Belchior Tati e do engenheiro Barnabé Paca Peso está marcado para as 9 horas da manhã, no Tribunal Colonial de Cabinda.
Na semana passada, André Zeferino Puati, antigo funcionário da petrolífera norte-americana Chevron, foi condenado a três anos de prisão efectiva, depois de detido cinco meses, também acusado de crime contra a segurança de Estado.
A detenção destes activistas ocorreu na sequência de um ataque armado contra a estrutura militar e policial de Angola que prestava segurança à selecção de futebol do Togo, em Janeiro deste ano, na colónia de Cabinda, onde ia disputar o Campeonato Africano das Nações de futebol.
Do ataque resultou a morte de duas pessoas tendo pelo facto as autoridades angolanas (depois de uma primeira fase em que desmentiram o ataque) detido vários suspeitos de envolvimento, usando para isso uma verdadeira caça ao homem, consubstanciada pela prisão das principais figuras que defendem os direitos humanos em Cabinda.
Por ir a julgamento ficam o economista António Panzo e um ex-polícia, José Benjamin Fuca.
Martinho Nomba, advogado do activista António Panzo, disse que o seu cliente, que se encontra detido desde 11 de Abril, não foi ainda acusado, tendo já sido feita reclamação, mas sem resposta até ao momento.
A Rádio Eclesia, emissora católica angolana, noticiou na semana passada que o bispo de Cabinda, D. Filomeno Vieira Dias, enviou uma carta ao Procurador-Geral da República, João Maria de Sousa, para mostrar preocupação em relação ao excesso de prisão preventiva de activistas e deplorar o adiamento indefinido do julgamento dos acusados.
O Tribunal que o regime angolano instalou na sua colónia de Cabinda condenou o activista de direitos humanos André Zeferino Puati, dizendo as autoridades do Estado ocupante que ficou provado que Puati cometeu um crime contra a segurança de Estado por, repare-se, ter sido encontrado em sua posse documentos “com conteúdos políticos” com o intuito de serem espalhados na via pública de Cabinda.
Na altura, em declarações à Agência Lusa, Martinho Nomba considerou injusta a sentença, afirmando que a justiça em Cabinda está a “caminhar para o abismo”.
Martinho Nomba classificou de “medonho” o ambiente vivido em Cabinda, onde urge a necessidade de “desprendimento” da justiça do poder político.
Se de uma forma geral Angola está longe de ser uma democracia e um Estado de Direito, em Cabinda essa realidade é ainda mais evidente. Nesta colónia angolana, até prova em contrário todos são culpados. Do ponto de vista do Direito, o regime decreta primeiro a sentaça e só depois faz o julgamento.
André Zeferino Puati foi julgado por alegadamente terem sido encontrados em sua posse documentos retirados da internet com informações sobre os movimentos da sociedade civil na colónia de Cabinda.
Segundo Martinho Nomba, o acórdão referia que os documentos encontrados na posse de André Puati foram submetidos para análise a peritos, que confirmaram a intenção política dos mesmos.
Ou seja, os peritos conseguem descobrir que a Declaração Universal dos Direitos Humanos é um instrumento contra a segurança do Estado desde que, obviamente, esteja nas mãos de quem o regime considera inimigo.
“André Puati é um intelectual, formado em relações internacionais e tinha em seu arquivo pessoal vários documentos retirados da internet sobre Nzita Tiago, sobre estratégias apresentadas numa reunião do bureau político do MPLA, com mais de 10 anos, para o caso de Cabinda, não sei qual é o crime cometido com isso”, questionou Martinho Nomba.
De facto, apoiadas no silêncio internacional, as autoridades coloniais angolanas não estão com meias medidas e, na colónia de Cabinda, prendem e até matam todos os que pensam de forma diferente do poder instituído em Luanda pelo MPLA.
A propósito de uma recente marcha em defesa dos direitos humanos, um fortíssimo dispositivo repressor (militares e polícias) de Angola cercou e invadiu as casas dos principais activistas dos direitos humanos, procurando provas que sustentem a sentença há muito tomada pelo regime de José Eduardo dos Santos.
Até os locais de culto foram cercados. Muitas das pessoas que apenas se limitaram a sair à rua para ver o que se passava foram detidas. A razão da força do MPLA volta a valer mais do que a força da razão dos que lutam pelos direitos humanos.
A manifestação visava, recorde-se, contestar a “detenção arbitrária” de activistas dos direitos humanos. Detenção arbitrária à luz de qualquer Estado de Direito o que, convenhamos, não se aplica a Angola e muitos menos à sua colónia de Cabinda.
Recorde-se que o padre Jorge Casimiro Congo foi ao Parlamento Europeu (Bruxelas), a convite da eurodeputada socialista Ana Gomes, e partiu a loiça sobre Cabinda.
Dizendo o que aprendeu com o falecido bispo do Porto (Portugal), D. António (“diante de Deus, de joelhos; diante dos homens, de pé”) o padre Jorge Casimiro Congo lamentou a posição do Governo português.
“Portugal é que é o culpado do que acontece em Cabinda. Não nos aceitou, traiu-nos”, disse o padre Congo, referindo-se ao processo de descolonização de Angola que deu de mão beijada e de cócoras o poder ao MPLA e, como se isso não fosse suficiente, rasgou os acordos que tinha asumido com o povo de Cabinda.
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