A Comunidade de Países (mais ou menos) de Língua Portuguesa, CPLP, foi unânime em lamentar a morte de José Saramago, Nobel da Literatura em 1998, considerando – entre outras louvaminhas – que a língua portuguesa e a Lusofonia perderam um dos seus mais expressivos baluartes.
Comum tornou-se igualmente o reconhecimento de que José Saramago teve, ou terá tido, a coragem para denunciar aquilo que considerava injusto, fossem quais fossem as consequências.
Esta constatação leva-me a crer que Saramago tinha um muito selectivo conceito de injustiça, ou que pesava as consequências das suas análises.
Certamente que alguns, muitos talvez, se recordam que José Saramago clamou para quem o quis ouvir a injustiça de que foi vítima a activista Aminatou Haidar (na foto com Saramago), durante a sua greve de fome de 32 dias no aeroporto de Lanzarote, reclamando o direito legítimo a regressar à sua terra natal – El Aiun, no Sahara Ocidental ocupado, — depois de ter sido expulsa pelas autoridades marroquinas.
“Acredito que o planeta a todos pertence e todos temos o direito ao nosso espaço para poder viver em harmonia. Creio que os separatistas são todos aqueles que separam as pessoas da sua terra, as expulsam, que procuram desenraizá-las para que, tornando-se algo distinto do que são, eles possam alcançar mais poder e os que combatem percam a sua auto-estima e acabem por ser tragados pela irracionalidade. Marrocos em relação ao Sahara transgride tudo aquilo que são as normas de boa conduta”.
Quem assim falou foi José Saramago, o escritor hoje, tal como ontem e certamente como amanhã, idolatrado pelos líderes dos areópagos da macro-política lusófona.
Embora, ao contrário do que se passa no Sahara Ocidental, em Cabinda se fale, se ame, se escreva, se sofra em português, nunca José Saramago ergueu a sua voz para defender dos direitos de um povo que sofre as agruras de uma ocupação colonial por parte de Angola.
Certamente por falta de tempo, José Saramago nunca disse que Angola em relação a Cabinda “transgride tudo aquilo que são as normas de boa conduta”.
Terá sido mesmo por falta de tempo ou, pelo contrário, terá sido porque o regime angolano é, desde 1975, muito semelhante ao que Saramago defendia na época para Portugal?
Sem comentários:
Enviar um comentário