Como é natural nas ditaduras, o regime do MPLA (não confundir com Angola e muito menos com os angolanos) prefere ser assassinado pelo elogio do que salvo pela crítica.
Nessa perspectiva, a Embaixada de Angola em Lisboa convidou o analista político Belarmino Van-Dúnem (foto) para ir a Portugal falar do papel da paz na afirmação de Angola, palestra no quadro do Dia da Paz e Reconciliação Nacional.
Como esperado, o orador criticou a postura de alguns sectores da sociedade portuguesa, particularmente de certa imprensa que – diz ele - “continua a denegrir a imagem de Angola, pelo facto de desconhecer a realidade da nova Angola”.
Belarmino Van-Dúnem confunde a beira da estrada com a estrada da Beira. O que alguma (cada vez menos) imprensa faz não é denegrir a imagem de Angola, muito menos a dos angolanos, mas sim do regime que está no poder desde 1975 e cujo presidente está no poder há 32 anos sem nunca ter sido eleito.
A não ser que, na tese de Belarmino Van-Dúnem, Angola seja o MPLA e o MPLA seja Angola, as críticas feitas ao regime não são para denegrir nem revelam, pelo contrário, desconhecimento da realidade da nova Angola.
Belarmino Van-Dúnem lamentou que “apesar da solidariedade de Angola em ajudar, por exemplo, a que bancos portugueses não declarem falência, certa imprensa desse país não se cansa de criticar Angola”.
Pois é. Todos estão gratos pela solidariedade de Angola, mas criticam – legitimamente – o facto de a solidariedade não ser de Angola enquanto nação mas, isso sim, dos donos de Angola, das empresas do estado, que é o mesmo que dizer da família de Eduardo dos Santo.
Segundo o analista político, “a maior parte da equiparação dos padrões de vida que se faz para Angola não é justa, pois, grande parte das comparações é feita com países cuja história recente é totalmente diferente da de Angola”.
Por outras palavras, não se pode falar do facto de, ao contrário de Eduardo dos Santos, Cavaco Silva ter sido eleito e – curiosamente – não ser nem de perto nem de longe o homem mais rico de Portugal.
É claro que muitas coisas boas foram e são feitas em Angola e, ao contrário do que diz Belarmino Van-Dúnem, são noticiadas em Portugal. Convenientemente, é claro, esquece-se que só é notícia o homem que morde o cão, e não contrário. Mas isso é querer demais.
No campo da consolidação do que chama Estado de Direito, Belarmino Van-Dúnem citou como ganhos dos últimos 10 anos, a aprovação da actual Constituição da República, assim como as leis da probidade pública, património público, branqueamento de capitais ou o decreto presidencial do investimento público.
Esqueceu-se o orador que não são as leias que fazem os Estados de Direito, mas sim a sua prática diária. Não basta ter leis democráticas quando as práticas são ditatoriais.
Para haver democracia é preciso que o poder judicial seja independente, é preciso que o Povo saiba quem elege ou quem não elege.
Poder judicial independente nunca houve em Angola e o Povo apenas sabia, sabe, que vota em quem lhe dá um saco de fuba. Antes “votava” nos que lhe davam peixe podre, fuba podre, 30 angolares e porrada se refilares.
Pela nova “Constituição”, tão enaltecida por Belarmino Van-Dúnem , o Presidente da República é o “cabeça de lista” (ou seja o deputado colocado no primeiro lugar da lista), eleito pelo do circulo nacional nas eleições para a Assembleia Nacional.
Não é uma eleição indirecta, feita pelo parlamento (como acontece por exemplo na República da África do Sul), mas uma vigarice típica dos regimes a quem não basta ser totalitário.
Assim, o futuro presidente é o primeiro deputado da lista do partido mais votado, mesmo que esse partido tenha apenas 25% dos votos expressos.
Pela nova “Constituição”, tão enaltecida por Belarmino Van-Dúnem, o Presidente de Angola nomeia o Vice-Presidente, todos os juízes do Tribunal Constitucional, todos os juízes do Supremo Tribunal, todos os juízes do Tribunal de Contas, o Procurador-Geral da Republica, o Chefe de Estado Maior das Forças Armadas, os Chefes do Estado Maior dos diversos ramos destas.
Na verdade Eduardo dos Santos já fazia tudo isto, ilegalmente é verdade, como Bokassa, Idi Amin ou Mobutu. É claro que os amigos como Passos Coelho, Cavaco Silva ou Obama vão felicitá-lo por esta nova “democracia”. Vão, é claro. Mas se eles existissem hoje fariam o mesmo em relação a Idi Amin, Mobutu ou Bokassa.
Mau grado a vontade de Belarmino Van-Dúne, nunca conseguirá fazer esquecer que 70% dos angolanos vivem na miséria, que apenas um quarto da população angolana tem acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade, que 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos.
Nunca fará esquecer que 45% das crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos.
Nunca fará esquecer que a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos, que 80% do Produto Interno Bruto é produzido por estrangeiros, que mais de 90% da riqueza nacional privada é subtraída do erário público e está concentrada em menos de 0,5% de uma população, que 70% das exportações angolanas de petróleo tem origem na sua colónia de Cabinda.
Nunca fará esquecer que o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder.
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