Com as últimas eleições em Portugal as moscas mudaram, democraticamente, de posição mas o resto manteve-se. O que pensarão hoje os partidos lusos (se é que pensam) sobre Angola?
No dia 10 de Março de 2009, PS, PSD, CDS-PP e PCP enalteceram os esforços do Presidente (não eleito e há 32 anos no cargo) angolano, José Eduardo dos Santos, na consolidação da democracia (que se calhar até gostariam de ver transplantada para Portugal), e congratularam-se com o aprofundamento das relações entre Portugal e Angola. Hoje diriam a mesma coisa.
As relações são mais e quase exclusivamente entre Portugal e o MPLA, entre Portugal e família dona de Angola (clã Eduardo dos Santos). Mas isso é, obviamente, irrelevante deste que ajude a atestar os bolsos dos políticos e empresários portugueses.
Democracia angolana, digo eu, deve ser aquela coisa a propósito da qual Ana Gomes, então membro da missão de observação eleitoral da União Europeia nas segundas eleições multipartidárias, disse:
“São legítimas as dúvidas que foram levantadas por partidos políticos e organizações da sociedade civil sobre a votação em Luanda”; “Posso apenas dizer que a desorganização foi bem organizada”; “À última da hora, foram credenciados 500 observadores por organizações que se sabe serem muito próximas do MPLA”; “Parece que alguém não quis que as eleições fossem observadas por pessoas independentes”; “As eleições em Luanda decorreram sem a presença de cadernos eleitorais nas assembleias de voto e isso não pode ser apenas desorganização...”
Nessa altura, o Bloco de Esquerda acabou por ficar isolado nas críticas à “falta de democracia” em Angola, com os restantes partidos a valorizarem os esforços do Presidente angolano para a paz e para a democracia, só faltando a indicação de que Eduardo dos Santos deveria ser proposto por Portugal (sê-lo-á um dia destes) para o Nobel da Paz.
Por alguma razão o Jornal de Angola (órgão oficial do regime) escrevia recentemente: “Os media portugueses pelo menos deviam reconhecer o que José Eduardo dos Santos tem feito para que os portugueses não vão ao fundo com a crise. Eles mais do que ninguém deviam propor o seu nome para Prémio Nobel da Paz”.
É natural. Percebo que (com excepção do BE) PSD, PS e até o CDS queiram ser donos da verdade e que, por isso, se identificam com todos aqueles que são donos, estejam onde estiverem.
Quanto ao PCP, continua igual a si mesmo, ou não fosse um dos pais do MPLA, ou não fosse o principal responsável pelo facto do MPLA estar no poder em Angola desde 1975.
Em relação ao CDS, já lá vai e está mais do que enterrado o partido que Freitas do Amaral, Adelino Amaro da Costa, Lucas Pires, Manuel Monteiro ou até mesmo Ribeiro e Castro ajudaram a singrar.
Em declarações aos jornalistas, o deputado do BE João Semedo criticou na altura a “perseguição política, violação dos direitos humanos e de liberdade de imprensa” em Angola, sublinhando que aquele país tem “o mesmo presidente da República há 30 anos”.
Mas tudo isto, e o muito mais que se vai sabendo, é claro, nada significa se comparado com os dólares da Sonangol. Tão simples quanto isso.
Quanto ao resto, enquanto a Sonangol, MPLA, José Eduardo dos Santos e os seus comparsas portugueses deixarem, o Alto Hama continuará a dizer que:
- No ranking da corrupção divulgado pela Transparência Internacional, Portugal aparecia o ano passado na 32ª posição, Cabo verde na 47ª, Brasil na 80ª, São Tomé e Príncipe na 121ª, Moçambique na 126ª, Timor-Leste na 145ª, Guiné-Bissau na 158ª tal como Angola.
- Em Angola, mais de 68% da população vive em pobreza extrema e a taxa estimada de analfabetismo é de 58%.
- Em Angola, a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens, ou seja, o cabritismo, é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos.
- Em Angola, o silêncio de muitos, ou omissão, deve-se à coação e às ameaças do partido que está no poder desde 1975.
- Em Angola, a corrupção política e económica é, hoje como ontem, utilizada contra todos os que querem ser livres.
- Em Angola, o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder.
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