O ministro das Finanças de Portugal admitiu hoje, embora e mais uma vez em câmara lenta, "um lapso" ao ter dito em entrevista à RTP que a suspensão dos subsídios de férias e de Natal terminaria com o programa, que acabaria em 2013.
Já depois de Vítor Gaspar ter admitido este "lapso", o deputado comunista Honório Novo confrontou novamente a bancada do Governo, para perguntar a Miguel Relvas, ministro dos Assuntos Parlamentares e à secretária de Estado do Tesouro, Maria Luís Albuquerque, se queriam também admitir lapsos, já que teriam feito as mesmas afirmações a dizer que a suspensão dos subsídios vigoraria apenas durante dois anos.
Recordam-se que, terá sido lapso?, que Vítor Gaspar ficou ofendido por uma "afirmação insultuosa" de um deputado do PCP, que sugeriu que o zelo do governo no cumprimento do programa com a 'troika' é antipatriótico?
Não. Aí não foi lapso. Gaspar (não o gato de Honório Novo mas o ministro) tinha e tem toda a razão. Pôr a grande maioria dos portugueses a aprender a viver sem comer é, bem vistas as coisas, um acto patriótico e digno até de uma condecoração do mais alto nível.
"Este governo vai-se sempre mostrando bastante prestável [perante a 'troika'], mesmo que isso signifique o definhar da economia", disse Miguel Trigo, deputado do PCP.
"O deputado Manuel Tiago fez uma afirmação insultuosa sobre sacrificar os interesses do país para servir interesses estrangeiros", respondeu Vítor Gaspar, acrescentando do alto da sua cátedra de perito dos peritos que "essa afirmação só pode atribuída aos excessos retóricos que por vezes os debates parlamentares propiciam."
Sem alterar o tom de voz e a candura habituais, o ministro das Finanças declarou que "o programa de ajustamento é de Portugal", sendo interrompido por um aparte de Miguel Tiago: "Quem está a fazer dinheiro [com o programa] não é Portugal."
"Não é hábito dos portugueses atribuírem problemas a outros, não é hábito dos portugueses rejeitar compromissos, não é hábito dos portugueses pedir a outros que paguem as suas dívidas, não é hábito dos portugueses aceitar que sejam outros a resolver os seus problemas por eles", prosseguiu o ministro.
Esqueceu-se, a bem da nação, de que o seu primeiro-ministro afirmou – em campanha – que “ninguém nos verá impor sacrifícios aos que mais precisam. Os que têm mais terão que ajudar os que têm menos. Queremos transferir parte dos sacrifícios que se exigem às famílias e às empresas para o Estado”.
Não. Esta afirmação de Passos Coelho foi um claro lapso. O que ele queria dizer, como está a demonstrar na prática, era que ninguém verá o governo impor sacrifícios aos que mais têm.
Apesar de muito criticado, Vítor Gaspar descobriu a Pedra Filosofal. Não aquela que supostamente aproxima os homens de Deus, não o elixir de uma vida longa ou da imortalidade, mas aquela do António Gedeão que nos conta que “eles não sabem, nem sonham, que o sonho comanda a vida, que sempre que um homem sonha, o mundo pula e avança como bola colorida entre as mãos de uma criança”.
Se calhar, reconheço, Vítor Gaspar aproxima-se mais de Zeca Afonso quando este diz: “No céu cinzento, sob o astro mudo, batendo as asas, pela noite calada, vêm em bandos, com pés de veludo, chupar o sangue fresco da manada”.
Seja como for, a arma secreta de Vítor Gaspar só tem um nome: roubo. Não, não foi um lapso. É mesmo ladroagem. Todos os dias o o Governo põe os portugueses de pernas para o ar, sacudindo-os na ânsia insana de lhes roubar todos os cêntimos.
Não terão os portugueses, pelas mesmas razões (desde logo porque não foram eles que criaram os pântanos, os buracos colossais), legitimidade para sair às ruas e pelos meios possíveis correr com um governo que os está a espoliar?
Será que não estão criadas as condições para que os portugueses, espoliados e ultrajados, avancem com um processo judicial contra este e os anteriores governos por negligência grave durante os respectivos mandatos?
Em Setembro de 2010, o parlamento islandês decidiu processar por "negligência" o antigo chefe do Governo, Geeir Haarde, que liderava o país na altura em que o sistema financeiro islandês entrou em (co)lapso, em Outubro de 2008.
A caminho de ultrapassar 1.200 mil desempregados, com 20% dos cidadãos a viver na miséria e às escuras e outros tantos que começam a ter saudades de uma... refeição, Portugal poderia adoptar já igual procedimento em relação a Pedro Passos Coelho e todos os seus super-ministros, (quase) todos eles sublimes exemplos da impunidade reinante.
Pedro Passos Coelho, a não ser que pague direitos de autor, não poderá dizer que “está para nascer um primeiro-ministro que faça melhor do que eu". Mas pode, com certeza, adoptar uma que diga “está para nascer um primeiro-ministro que tão rapidamente tenha posto os portugueses a viver sem comer”.
Como matéria de facto para um eventual processo judicial contra o actual primeiro-ministro acrescente-se que, quando todos julgavam (também foi o meu caso, reconheço) que José Sócrates tinha levado o país a bater no fundo, aparece Pedro Passos Coelho e a sua super-equipa a provar que, afinal, ainda é possível afundar um pouco mais.
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