O general
Pires Veloso, um dos protagonistas do 25 de Novembro de 1975 que ficou conhecido como
"vice-rei do Norte", defende um novo 25 de Abril, de raiz popular,
para acabar com "a mentira e o roubo institucionalizados".
Ora nem
mais. A última vez que estive com Pires Veloso foi (como o tempo passa!) no dia
25 de Maio de 2007, num evento que ele realizou, no Porto, conjuntamente com
Paulo Morais e Augusto Macedo Pinto e que assinalou o Dia de África.
O orador
principal foi o Rui Flores, então um dos quatro portugueses que exercia
funções na UNIOSIL (United Nations Integrated Office in Sierra Leone),
organismo que era dirigido pelo representante especial do Secretário-Geral da
ONU no país, o também português, Victor Ângelo.
"Vejo a
situação actual com muita apreensão e muita tristeza. Porque sinto que temos
uma mentira institucionalizada no país. Não há verdade. Fale-se verdade e o
país será diferente. Isto é gravíssimo", disse hoje o general em
entrevista à Lusa.
Para Pires
Veloso, que enquanto governador militar do Norte foi um dos principais
intervenientes no contra-golpe militar de 25 de Novembro que pôs fim ao
"Verão Quente" de 1975, "dá a impressão de que seria preciso
outro 25 de Abril em todos os termos, para corrigir e repor a verdade no
sistema e na sociedade".
Pires
Veloso, agora com 85 anos, puxa dos galões de oficial com provas dadas e considera
que não poderão ser as forças militares a promover um novo 25 de Abril. Porquê?
"Não me parece que se queiram meter nisto. Não estão com a força anímica
que tinham antigamente, aquela alma que reagia quando a pátria está em
perigo".
"Para
mim, o povo é que tem a força toda. Agora é uma questão de congregação, de
coordenação, e pode ser que alguém surja" a liderar o processo.
E agora que
"o povo já não aguenta mais e não tem mais paciência, é capaz de entrar
numa espiral de violência nas ruas, que é de acautelar", alertou,
esperando que caso isso aconteça não seja com uma revolução, mas sim com
"uma imposição moral que leve os políticos a terem juízo".
Esta
entrevista vai, creio, provocar alguns dissabores aos responsáveis editoriais da Lusa que, certamente por
descuido, não se dignaram pedir autorização a Miguel Relvas.
Continuemos.
Pires Veloso defende uma cultura de valores e de ética. "Há uma inversão
que não compreendo desses valores e dessa ética. Não aceito a actuação de
dirigentes como, por exemplo, o Presidente da República, que já há pelo menos
dois anos, como economista, tinha obrigação de saber em que estado estava o
país, as finanças e a economia. Tinha obrigação moral e não só de dizer ao país
em que estado estavam as coisas", defendeu o general com a coragem que se
lhe reconhece.
Pires Veloso
lamentou a existência de "um gangue que tomou conta do país. Tire-se o
gangue, tendo-se juízo, pensando no que pode acontecer. E ponha-se os mais
ricos a contribuir para acabar a crise. Porque neste momento não se vai aos
mais poderosos".
O general
deu como exemplo o salário do administrador executivo da Eletricidade de
Portugal (EDP) para sublinhar que "este Governo deve atender a privilégios
que determinadas classes têm".
"Não
compreendo como António Mexia recebe 600 mil euros e há gente na miséria sem
ter que dar de comer aos filhos. Bem pode vir Eduardo Catroga dizer que é legal
e que os accionistas é que querem, mas isto não pode ser assim. Há um
encobrimento de situação de favores aos mais poderosos que é intolerável. E se
o povo percebe isso reage de certeza", disse.
Para Pires
Veloso, "se as leis permitem um caso como o Mexia, então é preciso outro
25 de Abril para mudar as leis", considerando que isto contribui para
"a tal mentira institucionalizada que não deixa que as coisas tenham a
pureza que deviam ter".
Casos como
este, que envolvem salários que "são um insulto a um povo inteiro, que tem
os filhos com fome", fazem, na opinião do militar, com que em termos
sociais a situação seja hoje pior, mesmo, do que antes do 25 de Abril: "Na
altura havia um certo pudor nos gastos e agora não: gaste-se à vontade que o
dinheiro há de vir".
Quanto ao
povo, "assiste passivamente à mentira e ao roubo, por enquanto. Mas se as
coisas atingirem um limite que não tolere, é o cabo dos trabalhos e não há quem
o sustenha. Porque os cidadãos aguentam, têm paciência, mas quando é demais,
cuidado com eles".
"Quando
se deu o 25 de Abril de 1974, disseram que havia de haver justiça social, mais
igualdade e melhor repartição de bens. Estamos a ver uma inversão do que o 25
de Abril exigia", considerou Pires Veloso, para quem "o primeiro-ministro
tem de arrepiar caminho rapidamente".
Passos
Coelho "tem de fazer ver que tem de haver justiça, melhor repartição de
riqueza e que os poderosos é que têm que entrar com sacrifícios nesta
crise", defendeu, apontando a necessidade de rever rapidamente as
parcerias público-privadas.
"Julgo
que Passos Coelho quer a verdade e é esforçado, mas está num sistema do qual
está prisioneiro. O Governo mexe nos mais fracos, vai buscar dinheiro onde não
há. E, no entanto, na parte rica e nos poderosos ainda não mexeu. Falta-lhes
mais tempo? Não sei. Sei é que tem de mudar as coisas", disse Pires
Veloso.
1 comentário:
Aquela frase de PPC é legítima e muito verdadeira.
São os que mais podem, e são os pobres mais têm... a pobreza!
Kdd
EA
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