O número de trabalhadores em risco de despedimento colectivo mais do que duplicou até Fevereiro deste ano, face ao período homólogo de 2011, com mais de 200 empresas a iniciar este tipo de processos em Portugal continental em 2012.
Não sei a razão, mas recordo-me de em 2009 ter lido uma afirmação de Francisco van Zeller, então presidente da Confederação da Indústria Portuguesa, em que este dizia que estava por comprovar (como tudo, afinal, em Portugal) que haja empresas a aproveitarem-se da actual conjuntura para encerrar.
À pergunta: “Há empresas com lucros elevados no ano passado e que este ano já anunciaram despedimentos por perspectivarem uma quebra dos resultados. Como comenta?”, Francisco van Zeller disse:
“É uma forma de gestão que sempre se usou e que se baseia no princípio de que os ajustes se devem fazer enquanto há dinheiro. Isso é a situação normal que sempre houve, porque em condições normais essas pessoas despedidas conseguiriam encontrar outro emprego. Na situação actual, parece-me um bocadinho mais vergonhoso. Mas as empresas têm uma grande capacidade de previsão e sabem se os contratos para daqui a seis meses já estão a falhar, podendo optar por começar já a dispensar pessoal para acertar as despesas. Tem de ser visto caso a caso e não se pode atirar pedras a empresas que estão muitas vezes a fazer o melhor que sabem e a tentar proteger os trabalhadores.”
Quando um grupo mistura no mesmo saco empresas que dão lucro com outras que não dão, certamente consegue um resultado favorável à tese do prejuízo, actual ou futuro. É fácil, barato e até dá milhões.
Engraçado foi ver o então presidente da CIP, no seu legítimo papel, dizer – e bem – que “não se pode atirar pedras a empresas que estão muitas vezes a fazer o melhor que sabem e a tentar proteger os trabalhadores”.
E é engraçado porque Francisco van Zeller sabia a sabe, melhor do que qualquer outro, que essas não são a regra, nem esse é o princípio basilar de muitas empresas que são geridas por quem só tem capacidade técnica, escolar, intelectual, para ser arrumador de carros.
Dito de outra forma, Francisco van Zeller sabia e sabe que basta ter dinheiro (com a origem do qual ninguém se preocupa) para ser empresário ou, pelo menos, para ser dono de uma empresa.
Francisco van Zeller também sabia e sabe que muitas empresas vão à falência embora, é claro, os seus donos continuem ainda mais ricos. Tal como sabia e sabe, embora não diga, que se tivesse de escolher, muitos dos seus “colegas” empresários não os queria nem mesmo para arrumar carros.
Segundo os dados publicados pela Direcção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT), em comparação com igual período do ano passado, o número de trabalhadores que as empresas tencionam despedir nos próximos meses ao abrigo de processos de despedimento colectivo disparou 116,9 por cento até Fevereiro para 2.037 pessoas.
Se a isso se juntar o facto de Portugal ter chegado ao final de Fevereiro com uma taxa de desemprego de 15%, uma subida de 0,2% face a Janeiro e a terceira mais elevada da União Europeia, então todos compreendem que é preciso que milhões de cidadãos passem fome para que alguns tenham os seus paraísos remuneratórios, chamem-se eles EDP, CGD ou TAP.
O número de empresas que apresentou junto do Ministério da Economia e Emprego um pedido inicial para realizar despedimentos colectivos disparou assim num ano, passando das 114 para as 207 até Fevereiro deste ano.
Só durante o mês de Fevereiro foram 93 as empresas que manifestaram esta intenção (contra as 44 de Fevereiro de 2011), e que colocam assim em risco 898 postos de trabalho (375 em Fevereiro do ano passado).
Por regiões, Lisboa e Vale do Tejo é a região com mais processos de despedimento colectivo abertos em Janeiro e Fevereiro (94), seguindo-se o Norte (78), o Algarve (17), o Centro (16) e Alentejo (2).
Por tipo de empresas, os processos foram maioritariamente abertos por micro (73) e pequenas empresas (91), mas também por médias (27) e grandes empresas (16).
De acordo ainda com os dados da DGERT, em Janeiro e Fevereiro o número de empresas que concluiu processos de despedimento coletivo também aumentou, face a igual período de 2011, passando de 102 para 159.
Num ano, o número de trabalhadores despedidos ao abrigo de processos de despedimento colectivo aumentou de 1.007 para 1.248 pessoas, mas as empresas, ainda assim, conseguiram "segurar" 77 postos de trabalho em relação aos 1.332 estimados no início dos respectivos processos de despedimento colectivo.
Em Fevereiro deste ano, face ao mesmo mês de 2011, foram concluídos processos de despedimento coletivo em mais empresas (passou de 46 para 51 empresas), mas foram despedidos ainda assim menos trabalhadores (377 contra os 413 de 2011).
No processo de despedimento colectivo, a empresa entra com um pedido inicial junto do Ministério da Economia e Emprego, manifestando a sua intenção e o número de trabalhadores abrangidos pela ação.
Segue-se uma fase de suposta negociação entre a empresa, os representantes dos trabalhadores e os serviços do Ministério, onde supostamente se tentam soluções, nomeadamente de reconversão, e negociações compensatórias.
Finalmente, a entidade empregadora comunica a decisão definitiva de despedimento e entrega um mapa final aos serviços do Ministério onde consta o número de trabalhadores efectivamente dispensados e o processo dá-se por concluído.
No conjunto do ano passado, recorreram ao despedimento colectivo um total de 641 empresas, tendo sido despedidos 6.526 trabalhadores.
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