O enviado especial da União Africana para a Guiné-Bissau, João Miranda, apelou hoje aos candidatos às presidenciais de 28 de Junho e aos políticos guinnenses para fazerem da campanha eleitoral uma "grandiosa jornada de um exercício cívico de cidadania".
É sempre assim. Mudam-se as eleições, mudam-se os candidatos, matam-se políticos e militares e o discurso continua a ser o mesmo. Civismo e cidadania. É assim que está nos livros, mas a realidade nem sempre é a mesma.
"(...) Exorto todos os políticos, toda a massa de militantes dos partidos e todos os candidatos a fazerem desta campanha eleitoral uma grandiosa jornada de um exercício cívico de cidadania, visando a construção e a consolidação do Estado Democrático e de Direito", refere João Miranda via comunicado enviado à Imprensa.
Apelar à consolidação de um Estado Democrático e de Direito num país que, nesta altura, nem sequer é um Estado, parece-me algo macabro. Mas, é claro, politicamente correcto.
João Miranda, antigo ministro dos Negócios Estrangeiros de Angola, refere também que a "UA, e, por seu intermédio, toda a comunidade internacional, recebeu das Forças Armadas da Guiné-Bissau (...) toda a garantia (...) de que o processo eleitoral irá decorrer nas melhores condições de segurança".
Claro que sim. Se há alguma coisa em que os responsáveis (políticos e militares) da Guiné-Bissau são pródigos é nas garantias que dão e que nunca cumprem.
Segundo o enviado especial da UA, as garantias de segurança vão "permitir uma plena liberdade de consciência dos cidadãos na escolha do chefe de Estado". Pois. E logo a seguir veremos mais uns tantos, eleitos ou não, a serem assassinados.
João Miranda sublinha que a eleição de um novo Presidente para o país não é a solução de todos os problemas políticos, mas é "uma importante e incontornável etapa na caminhada para a solução dos problemas".
Pois não é. Aliás, nesta altura, se calhar em vez de ser uma solução para o problema poderá ser um problema para a solução. Não custa, é claro, tentar.
"A estabilidade política e social passa, necessariamente, pela observância por todos os actores políticos e por todos os cidadãos em geral, das leis pertinentes e dos princípios democráticos, nomeadamente a tolerância e o respeito pela diferença", reforçou João Miranda, acrescentando que "o povo da Guiné-Bissau já deu mostras de grande maturidade política, pelo que cabe agora aos dirigentes políticos corresponderem à lição de civismo que o povo vem dando".
Sim. De facto, para um povo que sofre desta forma, muito bem se tem comportado. Temo, contudo, que também a paciência dos guineenses tenha limites.
A Guiné-Bissau vai realizar eleições presidenciais antecipadas na sequência do assassínio, a 2 de Março, do Presidente "Nino" Vieira, horas depois do chefe das Forças Armadas, Tagmé Na Waié, ter sido morto num ataque à bomba.
Na sexta-feira, um comunicado da Direcção-Geral dos Serviços de Informação de Estado informou que as forças de segurança abortaram uma alegada tentativa de golpe de Estado, que provocou a morte a quatro pessoas.
Os antigos ministros Hélder Proença e Baciro Dabó, candidato às presidenciais de 28 de Junho, foram duas das pessoas mortas, porque, segundo o comunicado, resistiram à ordem de prisão.
Legenda: Também Tagmé Na Waié e “Nino” Vieira tinham prometido civismo, respeito, democracia e coisas similares.
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