No dia 3 de Maio Portugal vai juntar-se a outros países para comemorar o dia mundial de algo que, no reino lusitano, está em vias de extinção: a Liberdade de Imprensa.
Nem todos, como é óbvio assim pensam. Para além da minha débil experiência profissional (só ando nisto há 36 anos), faço contas aos jornalistas desempregados, aos que mudaram de profissão, aos que estando no activo estão na prateleira, aos que tendo emprego estão desempregados, aos que adoptaram uma coluna vertebral amovível, aos que se filiaram no partido para garantir o emprego, aos que em vez de erectos andam de cócoras, aos que por um prato de lentilhas dizem ámen a tudo.
"Se há coisa que não falta em Portugal é liberdade de expressão," garantiu João Marcelino, director do Diário de Notícias, na Comissão de Ética, Sociedade e Cultura na Assembleia da República.
Sim, é verdade. O que falta, e neste caso João Marcelino passou ao lado, é liberdade de Imprensa. São coisas diferentes mas, como mandam as regras da sobrevivência, dá sempre jeito confundir a obra-prima do Mestre com a prima do mestre de obras.
Quanto ao tão falado mas pouco aprofundado caso de um alegado plano do Governo para controlar a comunicação social, João Marcelino garantiu não ter conhecimento de nada. E considerou que se tal plano existisse "seria muito pouco inteligente numa democracia como a portuguesa" até porque "todas as tentativas acabam sempre a descoberto".
Não saber de nada é, aliás, uma regra de ouro na produção de conteúdos, que não no Jornalismo. No Jornalismo se um jornalista – aprendia-se – não procura saber o que se passa, é um imbecil. Se sabe o que se passa e se cala, é um criminoso. Sempre existiram, é verdade, imbecis e criminosos. Mas nunca, como agora, ser imbecil e criminoso é condição sine qua non para ser “jornalista” mas, sobretudo, para ser director.
Já relativamente a pressões do Governo sobre os órgãos de comunicação social, João Marcelino admitiu na mesma audição que as do Executivo de José Sócrates não são muito diferentes das de outros governos. "Mas se a pergunta é se alguma vez me senti pressionado, a resposta é não."
É óbvio que os directores dos jornais não são pressionados... pelos governos, até porque quem manda nos órgãos de comunicação social são os seus donos. O problema está em que os governos gostam de ser donos dos donos... dos jornais.
Assim sendo, assim é em muitos casos, a pressão é exerciada por múltiplas vias (directas, publicitárias, bancárias etc.) junto dos patrões e não dos mercenários que estes têm decorativamente nos cargos de direcção.
Como bem sabe João Marcelino e faz questão de o dizer, o primeiro-ministro não controla, nem quer controlar, nenhum órgão de comunicação social, não influencia matérias jornalísticas, gosta de todos os jornalistas e até incentiva aqueles que discordam das suas ideias...
Por alguma razão, quando em 2004 chegou à liderança do PS, José Sócrates jurou a pés juntos que a liberdade de imprensa era para si sagrada...
Segundo a organização internacional não-governamental Repórteres Sem Fronteiras (RSF), que claramente nada percebe da poda, a liberdade de imprensa em Portugal diminuiu, registando uma queda do 16º para o 30º lugar na lista dos países que mais respeitam o trabalho dos jornalistas.
Portugal (ainda) não está ao nível do Brasil (71º), Moçambique (83º), Guiné-Bissau (92º), Angola (119º) ou Timor-Leste (74º). Mas para lá caminha, mesmo quando os directores dos órgão de comunicação social dizem o contrário.
E dizem o contrário porque muitos deles não passam de mercenários que, para além de terem coluna vertebral amovível e de gostarem de estar de pé perante os seus súbditos e de joelhos perante o poder, não sabem ler nem escrever.
Por outras palavras, como diria o Mário Crespo, o poder quer que os jornalistas perguntem não o que o Estado/país/bordel pode fazer por eles, mas sim o que eles podem fazer pelo bordel/país/Estado.
E o que melhor podem fazer é aceitar que para serem um dia directores de um jornal têm de ser criados do poder. A bem da nação, está bem de ver.
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