quinta-feira, abril 08, 2010

A hipocrisia portuguesa no caso da Guiné

Os deputados portugueses aprovaram por unanimidade dois votos de condenação do atentado à ordem constitucional na Guiné-Bissau. Pronto. Está cumprida a tarefa do reino lusitano e todos podem dormir descansado e, é claro, ter pelo menos três refeições por dia.

Portugal, tal como outros, continua, é certo, a mandar toneladas de peixe para a Guiné-Bisau. No entanto, o que os guineenses precisam é de quem os ensine a pescar.

Portugal continua, é certo, a mandar montes de antibióticos para a Guiné-Bissau. Esquece-se, sobretudo porque tem a barriga cheia, que esses medicamentos só devem ser tomados depois de uma coisa essencial que os guineenses não têm: refeições.

Os deputados portugueses bem podem exigir, como fez Ribeiro e Castro do CDS/PP, a "reposição completa da normalidade constitucional", porque "nenhum povo escolhe ser um Estado falhado”.

Pena é que não estejam interessados, nem os deputados nem o governo, em acabar com a tentativa de ensinar os guineenses a viver sem comer. É que um dias destes vão constatar que quando eles estavam quase, quase mesmo, a saber viver sem comer... morreram.


Portugal, já que a CPLP é uma miragem flutuante nos luxuosos areópagos da política de língua portuguesa, deveria dar força à única tese viável e que há muito foi defendida por Francisco Fadul e que aponta, enquanto é tempo, para “o envio de uma força multinacional, de intervenção que garantisse aquilo que é protegido pela Carta da ONU, que é a democracia e os Direitos Humanos".

Ao que parece, tanto os políticos guineenses como os donos do poder na comunidade internacional (CPLP, Portugal e similares) continuam pouco ou nada preocupados com o facto de os pobres guineenses (a esmagadora maioria) só conhecerem uma forma de deixarem de o ser.

E essa forma é usar, não um enxada, uma colher de pedreiro ou um computador, mas antes uma AK-47. E enquanto assim for...

É que dois em cada três guineenses vivem na pobreza absoluta e uma em cada quatro crianças morre antes dos cinco anos de idade.

Mas o que é que isso importa? Nada, como é óbvio. Aliás, depois da aprovação por unanimidade dos dois votos de condenação do atentado à ordem constitucional na Guiné-Bissau, os deputados portugueses devem ter ido para um fausto repasto num qualquer bom restaurante de Lisboa. A bem da Nação, é claro!

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