sexta-feira, abril 02, 2010

Francisco Fadul queria, com razão, forças
da ONU durante dez anos na Guiné-Bissau

Há muitos, muitos mesmo, exemplos que revelam as razões pelas quais a Guiné-Bissau tende a ser um não-Estado. Ainda não há muito tempo, o até ontem Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas (CEMGFA), Zamora Induta, afirmava estar na posse de informações que indicavam a existência de tráfico de droga no arquipélago dos Bijagós.

Por sua vez o ex-chefe do Governo, Francisco Fadul, dizia que o Tribunal Penal Internacional devia julgar o actual primeiro-ministro e CEMGFA (Induta) por envolvimento num "golpe de Estado.

Resumindo, os guineenses merecem melhores politicos e militares do que aqueles que têm. Isso merecem. Mas o que é que isso importa? Do ponto de vista da comunidade internacional em geral, da CPLP e de Portugal em particular, ainda não morreram guineenses suficientes para soar o alarme.

"O Tribunal Penal Internacional deve agir, prendendo os suspeitos do golpe de estado e dessas barbaridades", afirmou Francisco Fadul na altura em que se encontrava em Lisboa em tratamento médico, na sequência do espancamento de que foi alvo, por homens fardados e armados, em sua casa, em Bissau, a 31 de Março do ano passado.

Elaborando a ideia de que o TPI (o tal tribunal que, segundo Muammar Kadhafi, representa “uma nova forma de terrorismo mundial”) deve julgar o actual primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, e o comandante Zamora Induta, Francisco Fadul considera que se trata de uma missão que não é difícil.

"São círculos muito restritos, muito confinados. Pessoas identificáveis muito facilmente", frisou.

A par desta medida e face ao que considerava ser o estado em que se encontrava a Guiné-Bissau, Francisco Fadul defendeu que as Nações Unidas deveriam assegurar a governação do país, instituindo um protectorado pelo período mínimo de 10 anos, "para que não haja recidivas, não haja retrocessos como aconteceu em Timor".

Uau! Admitindo por mera discussão académica que a ONU ia nisso, não se correria o risco de o protectorado ser invalidado (lembram-se de Cabinda e do Tratado de Simulambuco?) por outros superiores interesses petrolíferos da região?

"Seria no mínimo por 10 anos, promovendo eleições, depois de ter instilado os hábitos de boa governação, de fiscalização, de "accountability", fiscalização das contas públicas. Garantir o Estado, ao fim ao cabo", explicou Fadul como que esquecendo como está a o mundo, para já não falar da CPLP e de Portugal.

Como primeira medida, Fadul defendeu “o envio de uma força multinacional, de intervenção que garantisse a isenção e a exemplaridade das eleições e que, enfim, estivesse lá também para fazer vigilância daquilo que é protegido pela Carta da ONU, que é a democracia e os Direitos Humanos".

Se calhar, para além de ser um claro e inequívoco atestado de menoridade aos políticos e militares guineenses, a tese de Fadul é igualmente um atestado de criminosa passividade à CPLP e a Portugal.

Francisco Fadul justifica o envio de uma força militar com o "princípio do dever de intervenção e esquecendo o princípio caduco da não ingerência em assuntos internos, que cai perante os prejuízos à democracia e aos Direitos Humanos".

Cai? Só se for neste caso e por especial deferência. É que, como África é um bom exemplo, democracia e Direitos Humanos não são coisas que preocupem a ONU.

Recorde-se que Francisco Fadul acusou o primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior e Zamora Induta de terem feito "um conluio" para eliminar o Presidente "Nino" Vieira e o general Tagmé Na Waié.

E se Fadul dizia i que dizia, Kumba Ialá também afirmou que "o senhor primeiro-ministro vai ter de explicar ao povo da Guiné-Bissau quem matou Hélder Proença, Baciro Dabó, Tagmé Na Waié e o general João Bernardo Nino Vieira. Catorze pessoas que morreram durante o seu mandato".

A democracia exportada para África tem destas coisas. Ou se é favor de quem está no poder ou, é claro, vai-se para a choldra. Ou se é a favor ou choca-se com uma bala perdida.

Ao que parece, tanto os políticos guineenses como os donos do poder na comunidade internacional (CPLP, Portugal e similares) continuam pouco ou nada preocupados com o facto de os pobres guineenses (a esmagadora maioria) só conhecerem uma forma de deixarem de o ser. E essa forma é usar, não um enxada, uma colher de pedreiro ou um computador, mas antes uma AK-47. E enquanto assim for...

É que dois em cada três guineenses vivem na pobreza absoluta e uma em cada quatro crianças morre antes dos cinco anos de idade.

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