A minha experiência profissional como jornalista (35 anos espalhados por vários tipos de jornais e rádios) leva-me obrigatoriamente a tentar perceber a razão pela qual os jornais portugueses estão quase todos em queda livre, mau grado, ou sobretudo por isso, o efeito dos balões de oxigénio que os brindes e similares protagonizam, ou as operações de cosmética em que só a embalagem muda, mantendo-se intacto o (mau) produto.
Se os exemplos não partem de cima, a responsabilização pelo que de mau se faz (e sobejam os exemplos) também não é assumida dessa forma. A cadeia descendente de Comando só existe para o que é bom...
Se os exemplos não partem de cima, a responsabilização pelo que de mau se faz (e sobejam os exemplos) também não é assumida dessa forma. A cadeia descendente de Comando só existe para o que é bom...
Embora admita que possa estar errado nesta interpretação, permito-me apresentar alguns argumentos de defesa que possam, eventualmente, ajudar a um veredicto que me seja favorável.
Se o chefe é o primeiro a chegar e o último a sair, os seus colaboradores ficam sem margem de manobra para chegarem mais tarde e saírem mais cedo.
Se o chefe dá o exemplo de capacidade de trabalho, os seus colaboradores têm (mesmo que isso lhes custe) de entrar na mesma onda.
Se o chefe premeia a competência e castiga a incompetência (porque não basta só a primeira ou só a segunda), os incompetentes ou «dão da perna» ou sujeitam-se a entrar para o «carro vassoura».
Se o chefe o for de forma natural, a sua posição é respeitada e incentivada pelos seus colaboradores. Se o chefe for imposto por decreto (leia-se: sem ser por critérios de competência), os seus colaboradores não passarão de voluntários devidamente amarrados, o que - inevitavelmente - terá (maus) reflexos no trabalho que produzem.
Um Chefe, penso, não é apenas o que comanda mas, sobretudo, o que dá o exemplo. Pensar-se que se é bom chefe só porque se usa gravata ou porque alguém lhes deu o título, é, mais ou menos, como eu pensar que sou pintor só porque conheço as cores do arco-íris, mesmo que sejam todas.
Entendo (ao contrário do que é prática corrente na Imprensa portuguesa) esta actividade da seguinte forma:
Estamos todos os dias em cima de um tapete rolante que anda para trás. Se nos limitarmos a caminhar, ficamos com a sensação de que avançamos mas, de facto, estamos sempre no mesmo sítio. Por isso, numa economia de mercado são estas as regras, temos de correr para ganhar diariamente alguns metros ou, no mínimo, para não perdermos terreno.
Infelizmente isso não acontece.
Não acontece e, muitas vezes, a metodologia adoptada ainda é muito pior. Por descuido (seria mais exacto dizer por incompetência), acontece que alguns «chefes» ao verem o tapete a andar para trás julgam que vão no direcção errada e começam a caminhar no sentido da rotação do tapete...
Reconheçamos (e isso só nos fica bem) que muitos de nós para esconder as meias rotas preferem não tirar os sapatos.
Enquanto uns entendem que a única forma de se valorizarem é aprenderem com quem sabe mais (e saber que nada sabemos é a melhor forma de sabermos alguma coisa), outros pensam que essa suposta valorização passa por amesquinhar quem sabe mesmo mais.
Enquanto uns perguntam o que não sabem, e só são ignorantes durante o tempo que leva a chegar a resposta, outros (receosos que se saiba que, afinal, não sabem tudo) preferem ficar ignorantes toda a vida.
De uma forma geral, as chefias desconhecem a realidade humana dos jornais que dirigem.
Está errado porque esse desconhecimento pode levar (leva muitas vezes) a que um especialista em matraquilhos seja seleccionado para a equipa de futebol e o futebolista integre a equipa de ténis.
De facto não é, caricaturalmente, exequível formar uma equipa de basquetebol com jogadores de futebol e treinada por um ex-ciclista. Com a agravante de o treinador não ter a coragem de assumir que não percebe nada de basquetebol e, por isso, resolver que os jogadores devem levar bicicletas para o campo.
Se as chefias conhecessem o trajecto profissional dos seus redactores e as temáticas para as quais estão mais sensibilizados poderiam, creio, rentabilizar muito melhor todo o potencial de cada um, a bem do produto final.
Se assim não for, corre-se o risco (infelizmente generalizado) de pôr alguém a quem falte uma mão a jogar basquetebol, quando essa deficiência não seria importante se esse alguém estivesse a jogar futebol.
Como se dá mais (ou até exclusivo) valor à subserviência do que ao primado da competência, os jornais correm sérios riscos de perder a corrida, apesar de irem ganhando algumas etapas.
Enquanto eu entendo (eu e mais uma meia dúzia dos que têm memória e tarimba) que não preciso de ninguém à minha volta que esteja sempre de acordo comigo - para isso basta a minha sombra -, a filosofia reinante é antagónica.
Quanto mais vezes se estiver de acordo, mais possibilidades se tem de «êxito».
É claro que gosto muito da palavra «sim». Mas gosto igualmente, e pelo menos na mesma proporção, da palavra «não» o que é, reconheço, uma «chatice». «Chatice» agravada por uma hierarquia onde a regra é dizer ao mesmo tempo: sim, não, talvez (uma tripla que, seja qual for o resultado, não falha).
Creio que apesar da morte anunciada, a Imprensa portuguesa ainda vai a tempo de inverter a situação. Basta-lhe, desde logo, pôr o primado da competência acima, muito acima, sempre acima, do da subserviência. Se a isso somar algumas opções estratégicas, pode não só evitar bater no fundo como começar a recuperar.
Atendendo ao caudal de informação possível de se angariar (bem como de publicidade, reconheço como inevitável), considerando a enorme percentagem de portugueses que se sentem motivados a ler “coisas” sobre o que se passa na Lusofonia (recorde-se que em todo o Mundo são mais de 220 milhões os cidadãos que se entendem em português), creio ser viável e rentável a qualquer jornal uma secção que abordasse diariamente esta matéria. Ou seja, informação relativa a todos os países da CPLP e das próprias comunidades portuguesas espalhadas pelo Mundo.
Também seria viável criarem um gabinetes do leitor. Seria uma estrutura onde um jornalista atenderia os leitores que, pessoalmente, desejassem apresentar o que bem entendessem. Sabemos que muitos escrevem, mas muitos outros preferem o contacto pessoal, preferem saber que há um rosto que os atende.
Esse jornalista analisaria as queixas, sugestões, críticas etc. apresentadas pelo leitor e, quando fosse o caso, redigiria a informação para a secção onde o assunto tivesse cabimento. O leitor saberia, assim, que tinha um interlocutor válido e capaz de dar solução ao seu problema.
Neste Gabinete deveria igualmente funcionar um sistema de registo de mensagens telefónicas para que, fora das horas de expediente, os leitores deixassem as sua informações e contactos de modo a que, logo que possível, alguém desse sequência ao assunto.
Outra solução poderia a ser a da criação de Redacções móveis. Carros devidamente identificados partiriam diariamente sem destino à procura das reportagens, da notícia. Seria, grosso modo, levar o Gabinete do Leitor aos cantos do país. Com um jornalista e um repórter fotográfico poderia, de qualquer parte do país, enviar as notícias.
Sendo certo que os jornais portugueses têm pernas para levar a Carta a Garcia, resta-nos ter força de vontade para lutar contra os que todos os dias nos aconselham (sobretudo pelo mau exemplo que dão) a deitar essa carta na primeira valeta.
Mas será, no fim de contas, que tudo isto faz sentido?
Faz, com certeza. Os tempos são (mesmo) outros. Por isso é preciso abalar algumas coisas, antes que essas coisas nos abalem a nós.
Faz, com certeza. Os tempos são (mesmo) outros. Por isso é preciso abalar algumas coisas, antes que essas coisas nos abalem a nós.
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