quarta-feira, maio 02, 2012

100 mil inspecções fiscais!


O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de Portugal revelou hoje o objectivo do Governo realizar 100 mil inspecções fiscais até ao final do ano nos vários sectores de actividade.

"Este é um número ambicioso que o Governo está determinado a cumprir, com vista a dar um sinal aos operadores económicos e à sociedade em geral que o combate à fraude e evasão fiscal é uma das principais prioridades fiscais" deste Executivo, afirmou Paulo Núncio.

O que é que isso quer dizer? Bem, provavelmente que o pilha-galinhas estará lixado mas que, por outro lado, o dono do aviário estará safo.

Por outras palavras, o “zé dos anzóis” vai sentir o efeito das inspecções  fiscais, mas os (im)polutos cidadãos do tipo Cavaco Silva, Joaquim Pina Moura, Jorge Coelho, Armando Vara, Manuel Dias Loureiro, Fernando Gomes, António Vitorino, Luís Parreirão, José Penedos, Luís Mira Amaral, António Castro Guerra, Joaquim Ferreira do Amaral, Filipe Baptista, Ascenso Simões, Faria de Oliveira ou Eduardo Catroga vão continuar a rir-se à grande na chipala dos portugueses.

Para além disso, garante o sipaio do governo, este trabalho, a par do aperto da malha legal de combate à fraude e evasão fiscal, está já a dar resultados. O secretário de Estados dos Assuntos Fiscais diz que os dados de que o Governo dispõe já demonstram que "a cobrança coerciva está a aumentar em Portugal".

O Zé Povinho que se cuide. Ainda vai ser acusado de fraude e de evasão fiscal por estar a aprender a viver sem comer, estratégia que reduz a entrada de dinheiro nos cofres da matilha. Portanto, vejam lá se não comem, mas se pagam impostos como se comessem. Ok?

O governante, neologismo para a mais adequada definição de sipaio, sublinhou que o Plano Estratégico de Combate à Fraude e Evasão Fiscal para 2012 a 2014, aprovado em Outubro e que resulta do compromisso assumido entre Portugal e a 'troika', conta já com uma execução de 65% das 127 medidas previstas.

O meu merceeiro da esquina, que aliás ainda mantém o velho sistema do livro dos fiados, está seriamente preocupado. Como se já não bastasse ter a curta distância um Pingo Doce, sente que os fiscais o vão atacar como mabecos famintos, ou não fosse ele um empresário de elevado gabarito que até tem os lucros num paraíso fiscal que dá pelo nome colchão.

Em vez de taxar a Banca e a Finança, os bens de luxo e as empresas e negócios offshore, o Governo agrava os impostos – o IRS, as taxas moderadoras e o IVA –, penalizando os que menos ganham e a própria classe média. Mas, note-se, diz que vai realizar 100 mil inspecções fiscais.

O Governo rouba (toma posse) os subsídios de férias e de Natal dos trabalhadores e pensionistas. Já cortou nos salários dos trabalhadores da Função Pública e do Sector Empresarial do Estado em 2011 e vai cortar nos subsídios de férias e Natal de 2012,  2013, 2014  por aí fora. Mas, note-se, diz que vai realizar 100 mil inspecções fiscais.

Os trabalhadores já pagam uma factura pesada: em 3,8 milhões de empregados por conta de outrem, 2,3 milhões ganham menos de 900 euros por mês; o salário mínimo é o mais baixo da Zona Euro; trabalham mais horas do que os trabalhadores na União Europeia a 15; a precariedade atinge mais de um milhão de trabalhadores. Mas, note-se, o Governo diz que vai realizar 100 mil inspecções fiscais.

Apesar da enorme desregulação que campeia nas empresas, o Governo agrava-a através de um banco de horas, fulminando o direito ao descanso e entregando às empresas a gestão do tempo de trabalho e prejudicando a vida familiar. Mas, note-se, diz que vai realizar 100 mil inspecções fiscais.

Com um desemprego galopante e cada vez mais prolongado, o Governo desprotege ainda mais os trabalhadores, fazendo aprovar leis que tornam os despedimentos ainda mais fáceis e mais baratos e reduzindo o valor e a duração dos subsídios de desemprego. Mas, note-se, diz que vai realizar 100 mil inspecções fiscais.

As alterações ao Código do Trabalho já concretizadas e outras anunciadas já estão a permitir intensificar a exploração dos trabalhadores, aumentando a precariedade e agravando as condições de trabalho e de vida, ao mesmo tempo que servem já de chantagem para forçar inúmeros trabalhadores a aceitar rescisões ditas “amigáveis”. Mas, note-se, diz que vai realizar 100 mil inspecções fiscais.

Com a situação social a agravar-se, o Governo piora as condições dos idosos, cortando 1.880 milhões de euros no Orçamento de Estado para as pensões e reformas; e corta mais de dois mil milhões de euros para prestações sociais como pensões mínimas do regime geral, subsídio social de desemprego e abono de família, que será eliminado para muitas famílias. Mas, note-se, diz que vai realizar 100 mil inspecções fiscais.

Com medidas de austeridade socialmente gravosas e diminuindo drasticamente o poder de compra dos salários, das pensões e de outras prestações sociais, a retracção e a recessão afundarão ainda mais a economia, empobrecendo os portugueses e empurrando o país para o desastre. Mas, note-se, o Governo diz que vai realizar 100 mil inspecções fiscais.

Com a obsessiva cruzada pela “ideologia do Estado mínimo”, como bem a caracterizou a organização Comissão Justiça e Paz, o Governo impõe cortes brutais nas funções sociais do Estado, nas áreas da Saúde e da Educação, quer privatizar ainda mais empresas e sectores estratégicos, dos transportes à comunicação social, das águas à energia. Mas, note-se, diz que vai realizar 100 mil inspecções fiscais.

É necessário – é urgente – combater as injustiças, a exploração e o empobrecimento dos trabalhadores e do país; dinamizar a produção nacional na agricultura, nas pescas e na indústria; promover o crescimento económico e distribuir a riqueza de forma mais justa e sustentada, criando mais e melhor emprego, combatendo o desemprego e a precariedade; defender a negociação colectiva, aumentar os salários e as pensões. O Governo olha para o lado e diz que vai realizar 100 mil inspecções fiscais.

É também urgente barrar a agiotagem da Banca, renegociar a dívida com condições justas quanto aos montantes, juros e prazos, no respeito pela soberania nacional, no interesse do povo e pelas gerações futuras. Mas o que é urgente para os portugueses não o é para o Governo que, contudo, diz que vai realizar 100 mil inspecções fiscais.

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