Perante a
certeza de que há jovens a procurar emprego na Austrália (ou em qualquer outro país),
o Presidente da República disse hoje que
gostava que eles ficassem em Portugal.
Cavaco Silva
está a ver mal o problema. O melhor é eles partiram do reino. Miguel Relvas e
seus muchachos ficaram nas ocidentais praias lusitanas e o resultado está à
vista.
Aliás,
Cavaco Silva sabe que os jovens (e os outros também) só conseguem alguma coisa se se renderem ao preenchimento obrigatório do
requerimento FP e dos anexos MR ou PPC (ficha do partido, Miguel Relvas ou
Pedro Passos Coelho).
Cavaco Silva
sabe que os portugueses já tentaram dar a volta aos problemas utilizando todo o
tipo de receitas, velhas, novas, por inventar, futuristas, lunáticas e
similares. Chegam, contudo, sempre à mesma conclusão: qualquer semelhança de
Portugal com um Estado de Direito é mera coincidência.
Cavaco Silva
poderia dizer, citando Miguel Relvas, que não tem havido uma "relação de
transparência" entre o cidadão e o Estado e que isso precisa de mudar. Também,
aqui poderia fazer uma auto-citação, sabe que quando o cidadão esbarra com um
Estado opaco, apesar de ter à entrada a placa a dizer “transparente”, o melhor
que tem a fazer é mesmo zarpar aí para a Austrália ou até para o Burkina Faso.
Cavaco Silva
não pode, todavia, esquecer as divinas teses de Miguel Relvas quando dá conta
da necessidade de se procurarem "novos mundos", porque
"sempre" que Portugal viveu "só da Europa" teve
"dificuldades". Daí a opção estratégica de colocar o país sob
protectorado do regime de Angola.
Se calhar,
digo eu no meu “jornalismo interpretativo”, os portugueses até ficariam gratos
a Miguel Relvas se ele, que também relevou a existência de uma nova emigração
protagonizada por uma "juventude bem preparada", desse o exemplo e
fosse pregar para outras paragens, eventualmente para o Burkina Faso, país onde
goza – tal como as restantes autoridades políticas portugueses - de um enorme
prestígio.
É que no
Burkina Faso (se calhar na Austrália é diferente) existe, tal como em Portugal,
“uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não discriminando
já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que,
honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e
sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à
falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa
sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente
inverosímeis no Limoeiro”.
Tanto quanto
sei (e aqui não há “jornalismo interpretativo” que me valha), Cavaco Silva não
abordou a taxa de novas oportunidades em Portugal, designação utilizada pelo
primeiro-ministro para o desemprego, que atingiu os 14,9% da população
activa no primeiro trimestre de 2012.
Esta taxa
equivale a 819,3 mil trabalhadores no desemprego - mais 48,3 mil pessoas do que
no trimestre anterior, e mais 130,4 mil pessoas do que no primeiro trimestre de
2011.
Ora aí está.
Como disse o primeiro-ministro, também Cavaco Silva poderia falar (que tal uma
Presidência Aberta sobre este tema?) da necessidade de valorizar a
"cultura de risco", tanto mais que o desemprego não tem de ser
encarado como negativo e pode ser "uma oportunidade para mudar de
vida".
Então
pessoal? O milhão e duzentos mil desempregados apenas têm que seguir os
conselhos do sumo pontífice do governo, apostando na “cultura do risco” e
percebendo que têm uma soberana "oportunidade para mudar de vida".
E se não aproveitarem
a oportunidade ainda serão, um dia destes, acusados de esquizofrenia (doença de
que padece, segundo Miguel Relvas, a administração local). Vejam lá se não
obrigam o ainda ministro a ter de explicar, provavelmente em artigo a publicar
no Público, que os desempregados sofrem de “doença mental complexa,
caracterizada, por exemplo, pela incoerência mental, personalidade dissociada e
ruptura de contacto com o mundo exterior”.
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