De há muito
(e por isso estou na fase de aprender a viver sem comer) que considero que
qualquer um pode ser chefe, seja do que for. Tal como entendo que para ser
líder o processo é diferente.
É que pensar
que se é bom chefe só porque se usa gravata ou porque alguém (regra geral do
partido) lhe deu o título, é, mais ou menos, como pensar que se é pintor só
porque se conhecem as cores do arco-íris. Um chefe dá ordens, um líder dá o
exemplo.
Em
entrevista ao Público no dia 28 de Junho de 2010, Narciso Miranda dizia que “o
PS tem um chefe e não um líder”, acrescentando que “quando assumimos o poder,
houve uma prática de muita arrogância e autismo”, e que foi “a partir desse
momento que apareceram muitos cristãos-novos, que não conheciam bem, ou não tiveram
o cuidado de conhecer, o projecto ideológico do PS e estamos agora a pagar uma
factura pesada dessa arrogância...”
É por isso
que para mim é, hoje como ontem, confrangedor o culto ao chefe por parte dos
socialistas. Eu sei que já há muitos a dar sinais de que a todo o momento
(basta o chefe deixar de o ser) podem mudar de barricada. Mas, mesmo assim,
tenho alguma dificuldade em entender como é que socialistas inteligentes
continuam de cócoras e, parafraseando Renato Sampaio, tem “falta coragem para escreverem
o que pensam”.
É bem
verdade, no entanto, que mudam-se os tempos... mudam-se as vontades. Num artigo
de opinião do jornal Público há para aí cinco anos, intitulado "Contra o
medo", Manuel Alegre criticava "a confusão entre lealdade e
subserviência" que, segundo o socialista, se verificam no Governo de José
Sócrates. Recordam-se?
"Há um
clima propício a comportamentos com raízes profundas na nossa História, desde
os esbirros do Santo Ofício até aos bufos da PIDE", escreveu Manuel
Alegre, acusando então o Partido Socialista de "auto-amordaçar-se".
Recordam-se?
Mas a vida é
mesmo assim, sobretudo nas ocidentais praias lusitanas a norte, embora cada vez
mais a sul, de Marrocos. O presente (e se calhar o futuro) está para os que sabem
assinar apenas o que lhe mandam, para os que têm coluna vertebral amovível e
que quase sempre a deixam em casa, para os que pensam com a cabeça do chefe.
Estas são,
aliás, características que podem abrir a qualquer cidadão lugares bem
remunerados na Assembleia da República portuguesa, nos partidos, no governo,
nas empresas públicas etc..
Pelo
contrário, os que são daquela espécie profissional que acha que dizer a verdade
é a melhor qualidade, que pensa que deve dar voz a quem a não tem, o melhor é
ir pregar para outra freguesia ou deixar-se estar no desemprego.
Se, pelo
contrário, considera que a única verdade é a verdade do chefe, se para si o
importante é ajudar os poucos que têm milhões a ter mais uns milhões, pouco
importando os milhões que têm pouco ou nada, se não consegue assinar (porque
não sabe assinar) a ficha de candidatura, mas consegue pôr o dedo, ou já é ou
será um grande político, autarca, deputado, ministro, gestor, administrador, director
e por aí fora.
Durante anos
(muitos, é certo) Portugal parecia um país sério, mas não era. Agora não parece
nem é. São cada vez mais os exemplos (políticos, empresariais etc.) dos que se
julgam pianistas só porque compraram um piano. Aliás, continuam a ter em cima
do piano a foto em que aparecem a cumprimentar o chefe, seja ele qual for.
Por outras
palavras, se se medir o nível intelectual deste Portugal “made in” Largo do
Rato ou Rua de São Caetano pelo número de pianos, obras de arte etc. é certo
que o país está bem colocado.
Numa
sociedade onde o que importa é o que se aparenta, onde o relevante é o
deslumbrante “play-back” de Luciano Pavaroti quando se tem voz de Zé Cabra, são
cada vez mais os que estão na ribalta embrulhados em etiquetas sociais de
renome, talvez até importadas de Paris. O presente é, ou parece, ser deles. Se
o futuro também o for, então Portugal estará cada vez mais perto de Marrocos.
São como os
frutos de plástico que ornamentam as exposições de mobiliário. Lindos, gostosos
e sedutores quando vistos à distância… Pena é, contudo, que como a fome é
negra, qualquer prato de lentilhas chega para comprar consciências.
Não deixa,
contudo, de ser elucidativo ver como o acessório é mais relevante do que o
essencial, como o embrulho é mais importante do que o produto, como a capa é
mais vital do que o conteúdo, como o cargo é mais paradigmático do que tudo o
resto.
É uma
sociedade de faz de conta, onde o que importa é dizer-se que se tem um
stradivarius por que se sabe que ninguém vai querer saber que o instrumento é,
afinal, feito com latas de sardinha e foi comprado no Senhor de Matosinhos.
E assim os
portugueses não vão lá. Portugal precisa de uma estratégia (ou desígnio) que
valorize quem tem ideias e não quem diz que as tem. Que institua o primado da
competência independentemente da filiação partidária e das cunhas.
No entanto,
para os especialistas em “play-back” de competência, e no caso de ainda o não
terem feito, aconselho que garantam, antes que seja tarde, um tacho.
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