Por regra, o
que me parece uma qualidade, Belmiro de Azevedo tem o coração ao pé da boca. Diz
o que pensa, mesmo sabendo que essa é a melhor forma de arranjar inimigos. Mas
também é para esse lado que ele dorme melhor.
Hoje o “tio”
Belmiro considerou que Portugal perdeu uma geração "excelente" de
representantes do Estado e membros da Assembleia da República que tinham uma
vida "conhecida e apenas o desejo" de prestigiar os cargos.
E trocou por
miúdos, mesmo sem desconto em cartão: "Hoje a maioria da Assembleia da
República é outro tipo completamente diferente. As pessoas falam apenas para as
plateias".
Na opinião
de Belmiro de Azevedo, a primeira Assembleia da República "é irrepetível,
pois era composta por pessoas que tinham uma vida muito conhecida e que não
tinham outro desejo que não fosse o de prestigiar os cargos".
Dizem os
jornalistas que o ouviram, que o presidente da Sonae escusou-se a definir os actuais
representantes do Estado ou os membros da Assembleia da República. Nem era
preciso. Para essa definição, mesmo sem ser por via do “jornalismo interpretativo”,
basta levar em conta que os avoengos da espécie que hoje está no poder “não
tinham outro desejo que não fosse o de prestigiar os cargos”.
Entre muitas
outras coisas, recordo-me que Belmiro de Azevedo afirmou no dia 22 de Maio de
2009 que "estar empregado deve satisfazer praticamente toda a gente neste
momento" e garantiu que "não há emprego para quem quer estar a passar
os fins-de-semana com os pés na água".
Tinha e tem
completa razão. Tal como tinha quando afirmou que "um subalterno tem o
dever de questionar uma ordem do chefe e, se for o caso, dizer-lhe que não é
suficientemente competente".
Falando no
Porto à margem da cerimónia em que foi agraciado com o grau de doutor Honoris
Causa pela Universidade do Porto, Belmiro de Azevedo admitiu que os
trabalhadores não têm que "aceitar tudo", mas salientou que
"também não podem manter reivindicações quando não há nada para
reivindicar e ninguém para pagar".
"Se
fechar a empresa o que é que vão fazer? Deve haver uma mudança no
relacionamento entre sindicatos e empregadores. Há emprego onde for possível
estar empregado, não há emprego para quem quer estar a passar os fins-de-semana
com os pés na água", disse.
Segundo o
"patrão" da Sonae, "nos países que têm uma relação com os
trabalhadores muito mais transparente, agressiva e pró-desenvolvimento, as
pessoas mexem-se mais depressa e a economia começa a trabalhar mais
depressa".
Deve ser por
isso que a velocidade em Portugal é devagar, parado ou em marcha atrás.
"Nos
países como Portugal e os nórdicos, onde as pessoas têm um discurso muito
concentrado nos direitos adquiridos, qualquer dia estão agarradas a um caco
muito pequenino no meio do mar e vão ao fundo com o caco", alertou.
Para
Belmiro, "o direito ao emprego deve existir, mas é preciso ser empregado e
é preciso que o empregador exista também. Se o empregador desaparece o barco
vai ao fundo".
No que diz
respeito à Sonae, o empresário diz que não tem "praticamente" havido
despedimentos porque o grupo "cresceu muito", mas admitiu que,
"se acabar o crescimento ou reduzir a procura, o emprego tem que estar
ajustado à actividade económica".
"Mas em
Portugal ainda estamos a conseguir, mesmo quando há uma pequena empresa que
deixa de ser competitiva, recolocar essas pessoas noutras áreas da Sonae ou até
em nossos clientes", acrescentou.
Se calhar
foi graças a essa tese de que “um subalterno tem o dever de questionar uma
ordem do chefe e, se for o caso, dizer-lhe que não é suficientemente
competente”, que Belmiro construiu o seu império.
Belmiro
sabia que um chefe não é só o que manda - é sobretudo o que dá o exemplo. Sabia
que a crítica não significa desobediência. Sabia que tinha de se rodear de
massa crítica, pois para dizer sempre que “sim” bastava-lhe a própria sombra.
Ora, tal
como a Assembleia da República, o Governo português está cheio de “sombras”. E
está este como estão as associação empresariais, os sindicatos, o PS, o PSD, o
CDS/PP e os organismos (sobretudo fundações, institutos e similares) criados
para dar emprego a ex-políticos e candidatos a políticos.
“Sombras”
que vivem religiosamente à custa das bênçãos, das cunhas, e dos padrinhos que,
por regra, já chegaram a chefes do estado maior.
Com um país
assim, onde são (quase) sempre os mesmos a ter acesso ao poder, sendo todos os
outros relegados para fora de jogo, só há duas possibilidades: ter ideias e ser
marginalizado ou, agora, ser sombra e filiar-se no PSD (excepcionalmente também
no CSD/PP).
Mais dia
menos dia o tacho irá sorrir.
Legenda:
Mais uma foto histórica (na idade). Uma entrevista a Belmiro de Azevedo
publicada no extinto Jornal de Notícias (não confundir com a versão azul do
Correio da Manhã).
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