terça-feira, maio 08, 2012

Quem defenda os que têm fome é incendiário


O vice-presidente da bancada do PSD, António Rodrigues, considerou hoje que a proposta de ruptura do acordo com a 'troika', defendida pelo fundador do PS, Mário Soares, é "um exagero" e só serve para "incendiar a estabilidade" do país.

Ainda bem que a reacção do PSD não ficou a cargo de um outro vice, o experiente e catedrático (por parte do pai) Luís Menezes, que certamente denominaria a posição de Mário Soares como "chafurdice política".

"Os mercados precisam de calma, precisam de estabilidade, não precisam de quem agora apareça, por nenhuma razão justificável, a sustentar que se renuncie ao memorando com a 'troika'", disse à Lusa António Rodrigues.

Para o vice-presidente do PSD, a posição apontada por Mário Soares é "imprudente" e "manifestamente um exagero" e só vai servir para "incendiar ao nível político aquilo que é a instabilidade que existe em termos económicos".

O antigo presidente da República Mário Soares defendeu, recorde-se, em entrevista ao jornal i, que o caminho certo para o PS e para o socialismo europeu é cortar com o programa da 'troika' constituída pelo Banco Central Europeu, o FMI e a Comissão Europeia.

"Acho que é esse o caminho. A austeridade, tal como a definem, não tem sentido", afirma Mário Soares, considerando que a obrigação já foi assumida há um ano, mas que "chegou ao fim".

A proposta do antigo presidente não é, no entender de António Rodrigues, séria e constitui um excesso relativamente aquilo que se passa no país.

"Não há, em termos políticos, instabilidade que possa conduzir a uma afirmação dessas", concluiu o deputado social-democrata.

De facto, apesar de ter chovido no reino nos últimos dias, essa de querer incendiar o país não tem piada. Aliás, só teria cabimento se fosse ordenada pela troika. Aí sim!

Seja como for, a pobreza, essa coisa que escapa ao entendimento dos super-especialistas do governo português, continua a aumentar. Mas a solução é simples, segundo os chefe do António Rodrigues: vivam sem comer, morram sem ficar doentes.

O número de novos pedidos de ajuda que chegam às Instituições Particulares de Solidariedade Social, Misericórdias ou Cáritas continua a aumentar e a pobreza deixou de ser só entre os mais idosos: afecta também mais novos e empregados.

É claro que, como diz o PSD, a culpa é sempre dos outros. Crê-se até que a culpa – segunda a troika – é mesmo de D. Afonso Henriques.

Como diz o presidente da Câmara de Gaia, conselheiro de Estado, ex-presidente do PSD e putativo candidato à Câmara do Porto, o seu partido deve deixar-se de "pruridos" e lembrar aos portugueses que o esforço pedido é a "factura a pagar" pela "incompetência dos governos socialistas".

Houve tempo em que Luís Menezes (o pai) dizia que a culpa era dos “sulistas e elitistas”. Agora parece que o odioso é todo dos socialistas, mesmo que sejam nortistas e popularuchos.

Certo é que a culpa nunca é, nunca foi nem nunca será da malta do PSD. Só falta dizer que  Portugal se revê (e penso que Luís Menezes – filho – já pensou nisso) em Deus no céu e em Passos Coelho na terra.  É, aliás, muito mais fácil não assumir as responsabilidades, catapultando toda a culpa para uma qualquer pesada herança, socialista, salazarista ou comunista.

Mas voltemos ao mundo daqueles, que não é o mesmo dos  Menezes ou de Passos Coelho, que olham para os pratos vazios.

Os responsáveis da Cáritas, Confederação Nacional de Instituições de Solidariedade (CNIS) e União das Misericórdias concordam que não é possível quantificar os novos pedidos de ajuda que continuam a chegar, mas têm a certeza que são cada vez mais.

"O que sabemos é que continuam a aumentar os novos pedidos e há Cáritas que já estão com impossibilidade de atender em tempo útil a todos os casos que vão sendo registados", garantia – note-se – em Setembro do ano passado o presidente da instituição pertencente à Conferência Episcopal para a dinamização da acção social da igreja, Eugénio Fonseca.

Já o presidente da União das Misericórdias, Manuel Lemos,  garantia na mesma altura que os números quadruplicaram nos últimos dois anos: "À União das Misericórdias chegam por dia quatro a cinco pedidos de pessoas empregadas: ou estão com salários em atraso ou há um membro da família desempregado e não conseguem fazer face às despesas do agregado familiar".

"A razão de fundo é o desemprego, mas estão a aparecer pessoas que já estiveram nos atendimentos da Cáritas, passaram a beneficiar de algum subsídio do Estado, nomeadamente Rendimento Social de Inserção [RSI], e agora face aos cortes resultantes das medidas de austeridade, e nomeadamente à reformulação das regras do RSI, deixaram de ter direito a essa medida ou viram reduzidos os montantes", explicou o presidente da Cáritas.

Manuel Lemos acrescentou que a novidade está no facto de haver cada vez mais pedidos que vêm de pessoas empregadas: “Estamos a falar de pobreza com emprego, o que em termos absolutos não é uma novidade, mas é uma novidade em termos de expressão".

"O retrato da pobreza alterou-se porque agora temos bastante gente em idade activa, que se viu no desemprego ou com familiares no desemprego, com dívidas acumuladas e sem capacidade para as pagar. Vemos muita gente assim a ser atirada para a pobreza, que estava um bocado localizada nos mais idosos", apontou Lino Maia.

Se o desemprego é uma causa directa, Manuel Lemos também responsabiliza "algumas políticas públicas cegas", enquanto Eugénio Fonseca lembra que "está provado que se não fossem as transferências sociais, os abonos de família, o RSI, o complemento solidário para idosos, haveria cerca de 43% da população em risco de pobreza".

“Ninguém nos verá impor sacrifícios aos que mais precisam. Os que têm mais terão que ajudar os que têm menos. Queremos transferir parte dos sacrifícios que se exigem às famílias e às empresas para o Estado. Para salvaguardar a coesão social prefiro onerar escalões mais elevados de IRS de modo a desonerar a classe média e baixa”, dizia em Março de 2010 alguém que, nessa altura, se chamava Pedro Passos Coelho.

E esse mesmo alguém, acrescentava que, "se formos Governo, posso garantir que não será necessário despedir pessoas nem cortar mais salários para sanear o sistema português”, não se inibindo de afirmar: "Já ouvi o primeiro-ministro dizer que o PSD quer acabar com o 13º mês, mas nós nunca falámos disso e é um disparate."

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